O deputado federal Otoni de Paula (MDB-RJ) detalhou em entrevista ao PlatôBR o rompimento com o bolsonarismo. Ele criticou o radicalismo entre apoiadores do ex-presidente e também comentou expectativas para as eleições de 2026.
Otoni diz ter respeito às ideias de Jair Bolsonaro, mas se afastou de setores mais radicais do movimento, que chegaram a considerá-lo traidor. O parlamentar entende que é possível ser conservador sem aderir ao extremismo bolsonarista.
O deputado também abordou o futuro político dos evangélicos. Em sua opinião, o segmento deve repetir o apoio majoritário a candidatos de direita que representem o conservadorismo, como nas últimas eleições. Ele ainda reafirmou seu apoio a Eduardo Paes (PSD) no Rio de Janeiro. Confira os principais trechos da entrevista:
O senhor rompeu com Jair Bolsonaro e com o bolsonarismo. Isso teve alguma consequência na sua vida política?
Na verdade, eu tenho um profundo respeito pelo presidente Bolsonaro e sempre fui aliado das suas ideias. Minha história com ele começou quando eu era vereador no Rio e surgiu esse deputado federal querendo ser presidente.
Em 2017, a imprensa batia em Bolsonaro, e subi na tribuna para defendê-lo, sem nunca tê-lo visto pessoalmente. Carlos Bolsonaro ligava para o pai falando: “Só tem aqui um vereador defendendo você.” Um dia, Bolsonaro me ligou, agradeceu e pediu para colocar meus vídeos na rede social dele, já que só o Magno Malta fazia isso. Isso me agregou muito ao eleitor de Bolsonaro, especialmente os da igreja à qual pertenço.
Sou pastor há 30 anos pelas Assembleias de Deus, e ele encontrou apoio no pentecostalismo, diferente das igrejas mais históricas. Fiz meio mandato de vereador e vim deputado federal, nunca pelo partido dele, mas como aliado das ideias. Sempre fui um aliado questionador, pontuando ao presidente coisas que achava erradas.
Nunca tive cargo no governo porque preferi ter a confiança de Bolsonaro. Na reeleição dele, fui sozinho para o Nordeste tentar reverter o resultado. Quando percebemos que perdemos a eleição, voltei e encontrei Bolsonaro abatido. Eu disse: “Presidente, perdemos a eleição, agora somos oposição.” Ele respondeu que “oposição não vamos ter, eles vão prender a gente.” O afastamento começou quando tive a coragem de dizer ao povo na porta dos quartéis: saiam, vocês serão presos e não haverá ninguém que os defenda.
E como o senhor é tratado hoje pela ala bolsonarista?
Eu sempre tive desconfiança da ala bolsonarista, não dos deputados — porque político sabe como aquilo funciona —, mas dos mais radicais, aqueles que ficam nas redes sociais, porque eles não entendem que você possa discordar de Bolsonaro.
O bolsonarismo tem o poder de justificar até mesmo os erros do presidente Bolsonaro. E, quando falo erros, falo com muito respeito. A ala radical que se alimenta do ódio e do “nós contra eles” considera o Otoni um traidor. Mas eu tenho paz, porque não sou traidor da minha consciência, nem do conservadorismo. Sim, é possível ser de direita sem ser bolsonarista. O bolsonarismo é um fenômeno sociopolítico. Eu sempre fui de direita, conservador, evangélico. Não me separei da ideia de Bolsonaro, apenas do radicalismo que não permite discussão de ideias.
O senhor não acha que Jair Bolsonaro é o principal incentivador desse movimento radical?
Um dia, eu estava no Palácio. Ele me recebeu, contrariado, olhando para o celular, após o primeiro e o segundo 7 de Setembro. Disse: “Rapaz, esses caras são muito radicais.” Percebi que ele falava do próprio bolsonarismo, não da esquerda. Então, sim, Bolsonaro alimentou esse movimento mais raivoso. Mas, pessoalmente, conheço alguém mais bem intencionado que ele? Não. Ele queria consertar o país, mas talvez tenha faltado inteligência emocional para agir na hora certa.
Na semana passada houve busca e apreensão contra o pastor Silas Malafaia, que passou a integrar o inquérito que investiga a tentativa de golpe. Ele fala em perseguição religiosa. Como o senhor vê essas declarações?
Eu sou movido pela verdade. Não há perseguição religiosa. Tenho o maior respeito pelo pastor Silas, mas isso é perseguição política contra o político, não contra a igreja. O Silas se comporta como ativista político, não como pastor atuando religiosamente. A igreja não deve ser arrastada para essas guerras políticas. O Evangelho está acima das pautas ideológicas. A igreja está aberta a todos: quem vota em Lula, no PT, ou é do movimento LGBT, porque Cristo jamais se reduz a debates políticos
Pensando nas Eleições de 2026, como é que o senhor enxerga Bolsonaro? E como o senhor imagina que será o comportamento eleitoral dos evangélicos?
Se eu tivesse acesso a Bolsonaro hoje, eu diria: “Decida se quer a reeleição de Lula, ou a vitória da direita e do conservadorismo, porque as duas coisas não vão dar.” Se o presidente for preso e lançar alguém da família, ele entregará a presidência a Lula novamente. Nenhum dos filhos representa Bolsonaro à altura do que o povo quer. Ele precisa mostrar grandeza e sinalizar antes que isso aconteça. Sobre os evangélicos, não haverá o mesmo movimento de antes. Sem Bolsonaro, acredito que a igreja caminhará com um candidato da direita que represente o conservadorismo. Parte da igreja já vota em Lula, e isso se deve ao impacto dos programas sociais do governo. A igreja trabalha na periferia e deve reconhecer o que foi feito para o povo, mesmo sendo oposição.
Como o senhor vai se posicionar em 2026 no Rio de Janeiro? Estará ao lado de Eduardo Paes?
O meu estado está sofrendo há anos com a relação entre poder político e violência. Hoje, o povo fluminense está cansado e decepcionado. Eu apoio Eduardo Paes porque ele é um grande administrador e sabe dividir poder sem dividir autoridade. Se houvesse outro candidato melhor, eu apoiaria. Perguntam: “Mas se Paes apoiar Lula?” Eu apoio Paes. Não há culpa em ter gostos coincidentes com adversários.