A menos de um ano e meio das próxima eleições, partidos e candidatos preparam o repertório de temas que serão explorados em programas de governo e, também, nos ataques contra os adversários. Em muitos aspectos, ainda é cedo para se especular como será a próxima corrida presidencial. Não se tem certeza, por exemplo, se Lula (PT) será candidato à reeleição nem se Tarcísio de Freitas (Republicanos) deixará o governo de São Paulo para disputar o Palácio do Planalto. Mas alguns temas, inevitavelmente, estarão no centro dos debates.

Hoje, a segurança pública e a inflação dos alimentos aparecem com destaque nos debates relacionados à corrida presidencial de 2026. Pela importância que representam para a população, pode-se antecipar que os dois assuntos estarão entre os mais valorizados pela oposição para desgastar o Palácio do Planalto nas próximas eleições.

Esse assunto certamente será ser explorado por candidatos cotados para concorrer ao Planalto pelo campo conservador, como Tarcísio e outros dois governadores, Ronaldo Caiado (União Brasil), de Goiás, e Ratinho Junior (PSD), do Paraná, caso consigam viabilizar seus nomes.

Caiado teve 86% de aprovação ao seu governo, segundo a pesquisa Quaest de fevereiro. Ele defende a linha dura na área de segurança e diz que, em Goiás, “o bandido muda de profissão ou muda de estado”. Tarcísio, aliado de Jair Bolsonaro, tem no comando de sua Secretaria de Segurança o deputado licenciado Guilherme Derrite (PP), ex-capitão da Rota (Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar), uma tropa de elite da polícia paulista.

Segurança é um assunto que o PT sempre teve dificuldade para lidar, avalia o cientista político Guilherme Casarões, professor de Ciências Políticas e Relações Internacionais da Escola de Administração de Empresas da Fundação Getúlio Vargas (FGV) de São Paulo. "Nessa área, a esquerda certamente é menos eficiente do ponto de vista das respostas dadas aos eleitores”, afirma o estudioso.

O peso da inflação
A inflação foi o grande tema das eleições americanas no ano passado, apesar dos bons números gerais da economia no governo do democrata Joe Biden. Fenômeno parecido pode ocorrer no Brasil, no entender de Casarões. O aumento dos preços, principalmente dos alimentos, também causa grande preocupação no Brasil. Para o cidadão médio, a percepção é que os preços estão altos e que a precarização do trabalho se espalha. As expectativas são de que o candidato do Planalto terá muita dificuldade para se contrapor aos efeitos dessa inflação.

“Se o governo não conseguir controlar o preço de alimentos e fazer o preço cair até mais ou menos o início do calendário eleitoral, o tema estará na agenda, com certeza, porque é o que mais corrói o poder de compra, sobretudo da chamada classe C, que foi a base de sustentação eleitoral do Lula”, analisa outro cientista político, Marco Antonio Carvalho Teixeira, especialista em Gestão Pública, também da FGV.

A oposição também vai explorar as dificuldades do governo em obter o equilíbrio fiscal. A Lei das Diretrizes Orçamentárias, enviada por Lula ao Congresso no último dia 15, indica 2027 como um "ano desafiador", com crescimento das despesas obrigatórias e riscos para a execução das políticas públicas. A escassez de dinheiro pode atrapalhar as entregas previstas e provocar prejuízos para o governo junto ao eleitorado.

Apesar do peso negativo da inflação e das incertezas fiscais, o Planalto aposta nos números favoráveis da economia para atrair os eleitores em 2026. Os discursos indicam que o candidato governista vai ressaltar aspectos positivos do terceiro mandato de Lula, como o crescimento do PIB acima de 3% ao ano, a queda no desemprego e o aumento real do salário mínimo. Todos esses dados, porém, ficam a partir de agora dependentes do cenário externo, abalado principalmente pelo retorno de Donald Trump à Casa Branca.

A importância da política externa
A política externa, inevitavelmente, ganha relevância na corrida presidencial. A forma como Lula lida com os tarifaços impostos pelo governo Donald Trump e o desempenho da economia brasileira em um cenário de turbulência global estarão em julgamento nas urnas. Nesse caso, ainda não é possível prever como os candidatos tratarão esse assunto nas campanhas, vai depender dos desdobramentos das medidas adotadas pelos Estados Unidos e de como o comércio mundial se adapta aos novos tempos.

Mas, pode-se adiantar, os governistas vão atacar o alinhamento de Jair Bolsonaro com Trump. O fato de o ex-presidente ter batido continência para a bandeira dos Estados Unidos, por exemplo, servirá para o nome do Planalto na disputa eleitoral levantar a bandeira do nacionalismo. No mesmo sentido, Lula e seus aliados lembrarão aos eleitores que Tarcísio colocou na cabeça o boné com o slogan "Make America Great Again", usado pelo republicano em sua campanha vitoriosa contra Biden.

Ainda na política externa, a oposição ganhou um trunfo inesperado na semana passada: a concessão pelo Brasil de asilo diplomático à ex-primeira-dama do Peru, Nadine Alarcón, mulher do ex-presidente Ollanta Humala, condenada, junto com o marido, por lavagem de dinheiro recebido da empreiteira Odebrecht. Esse episódio permite aos adversários de Lula resgatar as denúncias enfraquecidas pelo esvaziamento da Lava Jato. Do ponto de vista eleitoral, o petista só tem a perder com o gesto feito em favor da ex-primeira-dama.

Com esses fatos, as relações internacionais devem manter a tendência de ocupar mais espaço nas campanhas eleitorais. Nas campanhas presidenciais de 2018 e 2022, assuntos ligados a Israel e a Venezuela, por exemplo, apareceram frequentemente nos embates entre os candidatos. “Questões ligadas à relação do Brasil com os vizinhos do Mercosul, com a China ou os próprios Estados Unidos, vão aparecer de maneira bastante central na discussão. São temas nos quais as pessoas estão olhando cada vez mais e com preocupação”, diz o cientista político.

A defesa da democracia
Em 2026, o candidato do governo deve repetir a estratégia de 2022 de usar a defesa da democracia como um do carros-chefes da campanha contra o campo direitista. Esse mote se torna mais evidente com a tentativa de golpe na última transição presidencial e com os julgamentos no STF do ex-presidente Jair Bolsonaro e dos demais envolvidos nos ataques às instituições e ao resultado das urnas.

Caso se confirmem as previsões de condenação de Bolsonaro, já tornado inelegível pelo Tribunal Superior Eleitoral, e dos demais réus desse processo, os governistas terão mais argumentos para desgastar os adversários. A oposição tentará rebater com críticas ao que seus integrantes classificam de falta de liberdade de expressão de expressão no país. Não se sabe, porém, o quanto os eleitores levarão em conta esse debate na hora de escolher em quem votar no ano que vem.

Ainda do lado do Palácio do Planalto, deve-se esperar um reforço na propaganda dos benefícios proporcionados pelas políticas públicas federais, como o Farmácia Popular e o Minha Casa, Minha Vida. Em solenidades e entrevistas, o presidente da República e seus ministros com frequência repetem números que ressaltam os feitos da administração atual. Nesse sentido, os governistas devem intensificar as comparações com a gestão Bolsonaro, cada vez mais presentes nos discursos, por exemplo, do ministro Fernando Haddad (Fazenda).