Os 90 dias de trégua na guerra tarifária com a maior parte do mundo acabaram se virando contra os próprios Estados Unidos. Desde que anunciou o prazo para focar na queda de braço com a China, o presidente Donald Trump entrou numa rota de desgaste econômico e político que abriu espaço para diferentes estratégias negociais.

No bloco dos mais poderosos dessa guerra comercial, China e União Europeia sinalizam, com a postura adotada até agora, que quanto mais enfraquecido estiver Trump, melhor. No grupo dos países com a menor sobretaxa, o Brasil segue o ritmo da diplomacia: abriu um canal de conversa com Washington e, com paciência, trabalha estrategicamente cada passo.

“Estamos negociando normalmente, desde o anúncio da taxação do aço e do alumínio. Isso toma tempo e a gente sabe”, afirma um importante interlocutor do governo brasileiro envolvido nas negociações. “Mas não estamos marcando o calendário por conta desses 90 dias”, completa.

Para analistas políticos internacionais, os países que fecharem acordos agora estarão fazendo o pior negócio. Se todos segurarem, Trump terá que ceder, avaliam. Isso porque o tarifaço já apresenta seus primeiros efeitos econômicos, que não são nada positivos - aumento do custo da dívida pública, desvalorização do dólar, questionamentos jurídicos e a pressão empresarial.

Ritmos diferentes
O ritmo da reação do governo brasileiro, porém, desagrada o mundo empresarial, que espera por soluções mais rápidas.

Por definição, argumenta o empresário Eduardo Eugênio Gouvêa Vieira, vice-presidente da CNI (Confederação Nacional da Indústria) e presidente do conselho da Firjan (Federação das Indústrias do Rio de Janeiro), “os governos são mais lentos do que as empresas”. Ele alerta que o setor privado “está sangrando” e diz que “a diplomacia faz bem o seu papel, mas as angústias das empresas são mais emergentes”.

Segundo Gouvêa Vieira, os bancos, que financiam o setor privado, estão de olho nos números das empresas. “Evidente que quem fechar um acordo agora pode ser pior, mas será que Trump vai cumprir esses 90 dias? Será que muitas empresas aguentam esperar tanto?”, questiona, destacando que empregos estão em jogo.

A inquietação no mundo empresarial é maior em setores de base. Gouvêa Vieira cita as indústrias do aço e do alumínio, petroquímica e pneumática como as mais problemáticas, já que, mesmo antes do tarifaço de Trump, elas já estavam sofrendo com a concorrência com os produtos chineses.

A expectativa é que, com a sobretaxa de 145% anunciada pelos Estados Unidos para as importações da China, o excedente chinês irá procurar outros mercados e o Brasil é um dos maiores parceiros comerciais do gigante asiático.

Na avaliação de integrantes do governo, a confusão gerada no planeta diante da ruptura comercial deflagrada pela política de Trump não será solucionada “com uma bala de prata e nem rapidamente". "Ainda há muita água para passar embaixo da ponte”, diz.