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Sucessão na Câmara: Planalto vê cenário indefinido e quer opção ‘palatável’

Governo Lula está entre Hugo Motta e Antonio Brito, mas a ideia é esperar a reta final da disputa para declarar qual é seu preferido

Foto: Republicanos
Foto: Republicanos

Prego que fica muito à vista leva martelada. É o que dizem, reservadamente, auxiliares do presidente Luiz Inácio Lula da Silva sobre os nomes cogitados desde o início do ano para disputar a sucessão de Arthur Lira, do PP de Alagoas, na presidência da Câmara dos Deputados. A eleição está marcada para fevereiro de 2025 e, no momento, há três candidatos: o paraibano Hugo Motta, líder do Republicanos, e os baianos Antonio Brito, líder do PSD, e Elmar Nascimento, líder do União Brasil.

Outros nomes já ficaram pelo caminho. Marcos Pereira, presidente do Republicanos e atualmente vice-presidente da Câmara, retirou-se da disputa recentemente em favor de Hugo Motta, apontado como o predileto de Arthur Lira. Brito e Elmar, mesmo diante do anunciado apoio de Lira a Motta, seguem na disputa e até fizeram um pacto para que um apoie o outro na reta final, a depender de quem estiver em melhor posição às vésperas da votação.

Tanto Antonio Brito quanto Hugo Motta são vistos com simpatia pelo Palácio do Planalto e por figuras de expressão na base governista, ainda que o presidente Lula afirme não ter candidato. Elmar, que já chegou a ser dado como o preferido de Arthur Lira, era, de todos, o que tinha maior rejeição de Lula e do governo – sob reserva, há no Planalto quem diga tratar-se de uma opção pouco confiável.

Em busca da ‘terceira via’

Insatisfeito com a opção Elmar durante todo o período em que ele era tido como o favorito em razão do suposto apoio de Lira a seu nome – o que acabou não acontecendo –, o governo sempre buscou uma terceira opção. Auxiliares de Lula apostavam, com certa razão, que os nomes lançados prematuramente sofreriam desgastes e acabariam sendo descartados.

Mesmo Hugo Motta, que surgiu mais recentemente no páreo, não é considerado ainda como uma opção consolidada e definitiva – a avaliação é que, faltando ainda mais de três meses para a eleição, o cenário pode mudar.

O sonho do governo é que surja uma opção que, ao mesmo tempo, tenha chances reais de vitória e não seja uma espécie de longa manus dos chefes do chamado Centrão e, especialmente, de Lira, um personagem visto desde sempre com desconfiança por Lula e seu entorno.

Vidas reviradas

Lançar-se com antecedência significa ficar exposto a ataques de toda sorte – ou a marteladas, para usar a metáfora do prego, empregada por assessores presidenciais. Não por outra razão, alguns dos candidatos já tiveram sua vida pregressa, ou parte dela, revolvida nesta primeira etapa da corrida.

Hugo Motta, por exemplo, já passou por isso. Houve quem lembrasse que ele foi citado em investigações da Polícia Federal por ter enviado R$ 4,78 milhões em emendas parlamentares para obras de restauração de uma avenida em Patos, na Paraíba, cidade cujo prefeito é seu pai, Nabor Wanderlei, do Republicanos, que acaba de ser reeleito.

Elmar Nascimento, por sua vez, viu adversários espalharem que a pequena Campo Formoso, no Centro-Norte da Bahia, se refestelou com emendas parlamentares enviadas por ele. A cidade, que faz parte do reduto eleitoral de Nascimento, recebeu R$ 31 milhões até junho deste ano. É mais do que todo o valor destinado à capital baiana, Salvador. Campo Formoso é administrada por Elmo Nascimento, irmão de Elmar, também filiado ao União Brasil e outro que foi reeleito no último dia 6 de outubro.

Elmar Nascimento também foi acusado de usar dinheiro público para abastecer o helicóptero que usou durante as férias parlamentares para ir a um show, a um resort e a eventos da campanha eleitoral. Entre junho de 2023 e agosto de 2024, as despesas somaram R$ 47,6 mil. Dinheiro da Câmara dos Deputados.

Só dá Centrão

Os perfis dos três candidatos ora colocados na disputa têm diferenças marcantes. O jovem Hugo Motta, de 35 anos, é um típico representante do Centrão, muito próximo a Arthur Lira. Circula bem entre os colegas da base governista, mas sua lealdade ao atual presidente da Câmara gera desconfianças.

Elmar, embora seja também um produto do grupo liderado por Lira, já é tido como um político menos jeitoso no trato. Adversário tradicional do PT na Bahia, na tentativa de diminuir a rejeição a sua candidatura à presidência da Câmara ele buscou se reconciliar com o rival Rui Costa, ex-governador baiano e chefe da Casa Civil de Lula.

Antônio Brito, outro representante do Centrão, circula bem tanto entre governistas como bolsonaristas. É visto com mais benevolência pelo Planalto, que o considera um político não ideológico. Filiado ao PSD de Gilberto Kassab, é tido como um apoiador do governo. Na Bahia, apoia o governador petista Jerônimo Rodrigues.

À diferença dos tempos em que, estando no governo, lançou candidatos fortes ao comando da Câmara, desta vez o PT nem passa perto disso. E tanto o partido quanto o governo têm de se mover com cuidado para não melindrar aliados nem comprar brigas de antemão com quem tem chances de vencer a disputa.

Em meados de setembro, o líder do partido, Odair Cunha (MG), criou um certo mal-estar ao avançar o sinal e anunciar que a bancada petista iria decidir sobre o apoio à candidatura de Hugo Motta. Após o anúncio, a presidente do PT, Gleisi Hoffmann, e o ministro Rui Costa entraram em ação para tentar amenizar o descontentamento do União Brasil de Elmar, que é da base do governo e, claro, não gostou da declaração.

Na sequência, Elmar teve reunião com o ministro Costa no Planalto e almoçou com Gleisi.

Como o governo não tem maioria na Câmara, a decisão sobre quem sairá vitorioso não passa necessariamente pelo palácio, muito embora alguns fatores que têm o Poder Executivo no centro do debate devam ser essenciais para o resultado.

É o caso da crise das emendas, que pôs o Planalto e o Congresso em rota de colisão. O governo reclama que uma parte significativa do orçamento está nas mãos dos parlamentares, o que inviabiliza em parte a execução dos seus projetos.

Partindo de decisões monocráticas do ministro Flávio Dino, até recentemente integrante do primeiro escalão de Lula, o STF suspendeu o modelo que vinha prevalecendo, o que agradou ao Planalto. Para evitar maiores rusgas, foi preciso fazer um acordo com o Congresso para ficar numa espécie de meio-termo, mas o resultado prático desse acordo ainda é incerto e pode pesar na disputa de fevereiro.

Outros fatores que devem influenciar na decisão são os resultados das eleições municipais deste ano, que vão reconfigurar a escala de grandeza dos partidos, e as tratativas para a sucessão no Senado – a eleição do amapaense Davi Alcolumbre, do União Brasil, é dada como certa. Há um certo consenso, tanto no governo quanto entre os parlamentares, em torno da ideia de que, para evitar concentração excessiva de poder, um mesmo partido não pode levar a presidência da Câmara e a do Senado. O jogo, porém, ainda está em aberto.

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