A fisionomia aparentemente tranquila do ministro Fernando Haddad (Fazenda) nos últimos dias, bem como o tom de voz que busca transparecer normalidade, são inversamente proporcionais às cicatrizes que ainda sangram diante da maior crise política da Fazenda com o Congresso na gestão Lula-3. O combinado internamente no governo é que o ministro se posicione sem declarar guerra especificamente ao presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), deixando a porta aberta para uma reaproximação. Mas a postura de que tudo está bem de Haddad esconde uma irritação profunda e ele acaba se traindo em algumas declarações. E a recíproca é verdadeira em relação a Motta.
Na manhã desta terça-feira, 1, a fala da Haddad na portaria do ministério de que aguarda o retorno de uma ligação do presidente da Câmara desde a semana passada, bem com a de que o governo vai manter o diálogo com o Parlamento para entender o que levou o presidente da Câmara a pautar a votação da derrubada do decreto que aumentava o IOF (Imposto sobre Operações Financeiras), foram interpretadas no Congresso como sinal “da arrogância e da soberba” atribuídas ao ministro.
Para o entorno do deputado Hugo Motta, “ele é presidente de um poder e não tem que ligar e dar satisfações ao ministro Haddad”. Ao contrário, “é Haddad quem deve prestar esclarecimentos ao Congresso”. Além disso, pessoas próximas ao presidente da Câmara insistem que em nenhum momento Motta teria se comprometido em aprovar o mérito das medidas apresentadas na reunião com as lideranças partidárias, de onde Haddad, Motta e o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP) saíram comemorando como “um encontro histórico”.
Agora, aquela celebração é admitida como “um erro” e que, desde então, o ministro da Fazenda teria tentado criar uma narrativa própria, que nunca teria sido combinada: a de que o Congresso aprovaria as medidas como foram colocadas pela equipe econômica.
Estratégias
Acuado e na defensiva, diante da reação do Congresso que impôs ao governo uma derrota, também, histórica, Haddad foi acolhido pelos seus pares. E o governo se uniu em torno de uma reação para tentar reverter o desgaste causado não só ao ministro da Fazenda, mas ao presidente Lula e a toda sua gestão. Motta, por sua vez, desencadeou nos últimos dias uma estratégia de pedir para as lideranças no Congresso também se manifestarem sobre o assunto. E partiu para um evento oficial em Portugal.
Na avaliação de pessoas próximas, será um momento para “dar um tempo na relação” com o governo já que, agora, “não há espaço para conversas”. Haddad, de acordo com pessoas próximas, sabe da necessidade de tentar se reaproximar do Congresso, por mais que ache isso difícil no curto prazo. Ele foi um dos que mais incentivaram a judicialização do embate em torno do IOF. Na volta do recesso legislativo de julho, a equipe econômica terá que negociar com os parlamentares a redução de benefícios tributários, para recompor a arrecadação.
A ideia inicial apresentada aos líderes do Congresso, segundo o ministro, era encaminhar uma PEC (Proposta de Emenda Constitucional). “Houve pedido para preservar benefícios constitucionais”, disse o ministro, ressaltando que os técnicos do ministério estão avaliando como “atender os parlamentares sem ferir a suscetibilidade” de ninguém.