A disputa para saber quem bajula mais e se curva diante do ex-presidente Jair Bolsonaro está acirrada, e em alguns casos, sem nenhum pudor ou constrangimento. De momento, as cenas explícitas de submissão do governador Tarcísio de Freitas e as alopradas decisões do vaidoso filho Eduardo ajudam a montar um cenário com atores que só enxergam o próprio umbigo, e ignoram solenemente a avaliação da opinião pública do país sobre eles. O pano de fundo de toda essa troca de farpas e atropelos estampados nas redes sociais ganhou luz e holofotes após a mensagem do presidente americano Donald Trump anunciando juros elevados nas importações brasileiras para aquele País.

Tarcísio, que não é Narciso, mas adora um espelho, demonstrou todo o seu amadorismo político ao se posicionar com insegurança entre os caciques da Avenida Faria Lima e a vontade dos direitistas grudados em Bolsonaro, sabidamente um carregador de pasta de Trump no Brasil. Traição dói de toda forma. Traição política dói mais, e gera consequências. De tabela, também feriu de morte o filho do chefe, que se diz desrespeitado, uma vez que sua atuação em território americano, desde o começo do ano, tem como objetivo azeitar uma maliciosa relação cujos interesses agradam apenas a seus amigos e parentes.

Essa visível disputa de egos e demonstração de desprezo e desconsideração aos reais interesses do povo brasileiro nos coloca diante de uma triste e real constatação. De um lado, uma sociedade que há anos luta para que a nossa eterna imagem de vira-latas se acabe de vez, e que o mundo reconheça nossa integridade, grandeza cultural, econômica e política. E, de outro, personagens episódicos que, ao menor movimento que projete benesses e agrados pessoais, se entregam a atitudes nada republicanas.

O debate parece coisa antiga, mas os personagens envolvidos elevam o nível de tensão. Ao considerar injustas as penalidades jurídicas que recaem sobre Bolsonaro, o presidente americano transformou seu anúncio em uma declarada provocação ao governo Lula, inclusive insinuando ser capaz de interferência nas ações internas do nosso país.

Nada mais agressivo, resvalando numa indisfarçável atitude anti-diplomática, rasteira sob todos os aspectos. As medidas de taxação abusiva estão programadas para entrar em vigor a partir do primeiro dia de agosto, mas o clima ruim e malcheiroso já domina o país de ponta a ponta, com destaque e justa relevância recaindo sobre São Paulo, o maior e mais importante estado da federação.

Trazendo de vez essa medida antipática dos americanos para o nosso debate político do dia a dia, impossível não colocar o nome do governador Tarcísio de Freitas no centro das atenções. Seu nome estará com certeza no cenário eleitoral do ano que vem, ou como candidato à reeleição, ou na tentativa de se eleger presidente da República.

Sem muito se preocupar com a ética política, e sinalizando, com ironia, que ainda terá seu nome em outro patamar em disputas eleitorais, Eduardo Bolsonaro manda recados grosseiros a Alexandre de Moraes e ao Supremo Tribunal Federal, anunciando permanência nos Estados Unidos sem data para voltar. Seu prazo legal de continuar em solo americano termina no final deste mês.

Juntando as peças desse jogo desengonçado e sem credibilidade alguma, chega-se à conclusão de que o grau de responsabilidade e compromisso entre esses personagens e o cidadão equivale a zero. Com Bolsonaro com a corda no pescoço, à espera de execução, e seus seguidores se agarrando a argumentos desacreditados e vazios, é difícil imaginar que possa surgir de alguma dessas fontes água que não esteja contaminada.

O cidadão minimamente alfabetizado, consciente de seus deveres e de posse de seu juízo normal, dificilmente entenderá o que de fato se passa na cabeça de personagens tão desapetrechados de tudo que se pareça com bom senso, equilíbrio emocional e defesa do bem comum. O que estamos presenciando é uma disputa que mais parece o roteiro de um filme de péssima qualidade, cujo elenco abriga atores e coadjuvantes desprovidos de qualquer talento que mereça aplauso de uma platéia incrédula. Página infeliz da nossa história. Será que vai passar?

José Natal é jornalista com passagem por grandes veículos de comunicação como Correio Braziliense, TV Brasília e TV Globo, onde foi diretor de redação, em Brasília, por quase 30 anos. Especializado em política, atuou como assessor de imprensa de parlamentares e ministros de Estado e, ainda, em campanhas eleitorais