O STF (Supremo Tribunal Federal) encerrou nesta segunda-feira, 28, a fase de instrução dos processos contra Jair Bolsonaro e aliados com os interrogatórios de três militares das Forças Especiais do Exército denunciados como executores do capítulo mais violento da trama golpista – o plano de atentado contra Alexandre de Moraes, ministro do próprio Supremo e então presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral).
A PGR (Procuradoria-Geral da República) considera haver provas concretas da ação dos kids pretos, como são chamados os integrantes da tropa de elite do Exército. Planos apreendidos com os investigados viraram provas nos processos. O material sustenta a acusação de planejamento coordenado dos crimes, com envolvimento de membros do governo, militares e uso da estrutura do Estado.
A missão para “neutralizar” autoridades buscava impedir a reação institucional do Estado ao golpe, que seria efetivado juridicamente com um decreto de intervenção no TSE, segundo a PGR. As mortes de Moraes e até de Lula e do então vice eleito, Geraldo Alckmin, foram consideradas “dano colateral” no plano que segundo a acusação seria posto em prática no dia 15 de dezembro de 2022, mas acabou abortado durante a execução.
Seis militares foram identificados pela Polícia Federal como participantes do plano – todos amigos do tenente-coronel Mauro Cid, delator e ex-ajudante de ordem de Bolsonaro no Planalto. A PF usou os mapas de localização de celulares usados, produzidos com cruzamento de sinais de antenas de telefonia dos aparelhos, analise de mensagens apreendidas e quebras de sigilos para reconstituir os passos desses militares na execução da missão.
O planejamento descoberto no documento “Plano Punhal Verde e Amarelo”, que o general Mario Fernandes imprimiu na Secretaria-Geral da Presidência e tinha como objetivo impedir a posse de Lula e as reações à operação, que chegou a ser posta em prática sob o nome de “Copa 2022”.
Foram ouvidos pelo STF o major Rafael Oliveira (que usaria os codinomes Japão, Alemanha e rafaelbast), o tenente-coronel Helio Ferreira Lima (codinome Gana) e o major Rodrigo Bezerra Azevedo (codinome Brasil). Os interrogatórios do trio eram os mais aguardados desta segunda-feira, entre os dez previstos.
‘Fantasmas’
Ser um “kid preto” para um militar é como ser titular do Barcelona para um jogador de futebol. O grupo de elite das Forças Armadas é formado por especialistas em inteligência, ações de espionagem, sabotagem, infiltração, monitoramento, técnicas para evitar rastreamento de seus passos. O sigilo é uma das principais premissas para ser parte desse grupo, cujos integrantes também são chamados, internamente, de “fantasmas”.
Presos preventivamente desde novembro de 2024, os kids pretos negaram os crimes ao falar ao juiz auxiliar do gabinete de Moraes. Dois deles são da ativa e alegaram que a PF interpretou de modo equivocado os dados levantados, como mapeamento das localizações. Também refutaram o uso de celulares frios, de táticas de anonimização (que impedem rastreamento), de codinomes, de armas e da estrutura do Estado para cometer os crimes denunciados.
Os denunciados foram acusados por cinco tipos de crimes: tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, tentativa de golpe de Estado, organização criminosa, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado.
PGR vê acusação fortalecida
Para a PGR, os réus confirmaram pontos importantes da acusação, que tiram a trama do plano do crime tentado, apesar de não terem confessado a culpa.
O tenente-coronel Rodrigo Bezerra de Azevedo, por exemplo, confirmou ter usado telefone das Forças Especiais do Exército na operação clandestina de 2022. Hélio Ferreira reafirmou que produziu dentro de uma unidade do setor de inteligência da corporação, no Rio Grande do Sul, um documento que previa a prisão de autoridades caso fossem constatadas fraudes nas urnas. Ele disse que o plano era apenas uma análise de cenário – ou um “desenho operacional”.
Os réus reclamaram. “Sou vítima de um julgamento político. Sou um preso político de guerra”, protestou Oliveira. “Não sou o Brasil. Estou sendo acusado injustamente”, disse Azevedo.
A audiência desta segunda foi a última e encerra a fase de instrução dos quatro processos do STF, contra a trama golpista, sob relatoria de Moraes. Bolsonaro é um dos 34 réus. A PGR pediu pena pena de quase 50 anos de prisão para ele. A PGR dividiu os acusados em quatro núcleos os acusados – e cada um deles virou alvo de uma ação penal no STF. Os kids pretos são do núcleo 3. O julgamento dos réus está previsto para o segundo semestre deste ano, na Primeira Turma da corte.