A nota do governo brasileiro sobre o telefonema do presidente russo, Vladimir Putin, a Lula foi suscinta, como costumam ser esses comunicados oficiais de conversas entre presidentes. Nos bastidores, a ligação foi recebida no Palácio do Planalto como um reconhecimento da legitimidade e relevância do Brasil nas negociações sobre o conflito entre a Rússia e a Ucrânia. Essa conotação foi ainda mais valorizada diante do cenário atual, com o Brasil transformado em alvo da política protecionista e ideológica de Donald Trump.
Putin se reuniu com o presidente americano no Alasca na sexta-feira, 15, dois dias antes do contato telefônico com o petista. Lula tem resistido a conversas com Trump e buscado, por meio do Brics (grupo originalmente formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), formular uma resposta conjunta à política de sobretaxas dos Estados Unidos sobre exportações de vários países. O Brasil é um dos mais prejudicados, com um tarifaço de 50%, e Trump apontou a integração dos países do Brics como um dos motivos para a sanção.
A ligação também indica, para o governo brasileiro, que o laço construído por meio do bloco de países está sólido. “Putin teve o cuidado de sinalizar que o Brasil se mantém como ator legítimo nesse processo. Se achasse que o Brasil fosse irrelevante ou ilegítimo, não se daria ao trabalho de telefonar. Foi politicamente importante”, disse uma fonte do Palácio do Planalto ao PlatôBR.
Em julho, Putin não veio ao Brasil para participar da Cúpula dos Brics, no Rio de Janeiro, devido à condenação por crime contra a humanidade pelo TPI (Tribunal Penal Internacional). O presidente russo participou da reunião por videoconferência.
Na ligação desta segunda-feira, 18, de cerca de 30 minutos, Putin compartilhou informações sobre a reunião com Trump, avaliando-a como positiva. Segundo o Planalto, entre os diversos temas abordados com o americano, Putin reconheceu o envolvimento do Brasil com o Grupo de Amigos da Paz, iniciativa conjunta com a China. Lula reafirmou, segundo o governo, o apoio do Brasil “aos esforços que conduzam a uma solução pacífica para o conflito” entre Rússia e Ucrânia.
Os dois presidentes conversaram durante 40 minutos, também por telefone, dez dias antes, no sábado, 9, antes do encontro de Putin com Trump no Alasca.
Em mais uma movimento sobre essa pauta, nesta segunda-feira, 18, Trump recebeu em Washington o presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, e líderes de países europeus. Depois do encontro, ele informou que ligou para Putin para tratar de uma futura reunião com o ucraniano. Seria uma conversa trilateral, com participação do próprio presidente americano.
Amigos da Paz
O grupo Amigos da paz reúne 12 nações do chamado Sul Global e foi criado em setembro do ano passado. China e Brasil lançaram, em maio de 2024, o documento “Entendimentos Comuns entre a China e o Brasil sobre a Solução Política da Crise na Ucrânia” com o propósito de criar um grupo para promover entendimentos para a conquista de uma “paz duradoura” entre russos e ucranianos.
O texto contou com a adesão da Argélia, Bolívia, Colômbia, Egito, Indonésia, Cazaquistão, Quênia, África do Sul, Turquia e Zâmbia. O México apoiou o comunicado, mas com ressalvas. Representantes da França, Suíça e Hungria participaram do encontro como observadores, a pedido de seus respectivos governos.