O ministro Luiz Fux deu sinais nos últimos dias de que iria adotar posição contrária à do relator, Alexandre de Moraes, no julgamento de Jair Bolsonaro e dos demais réus do núcleo principal da trama golpista. Terceiro integrante da Primeira Turma a se manifestar, ele votou nesta quarta-feira, 10, e surpreendeu o mundo jurídico com a contundência de seu voto contrário às denúncias da PGR (Procuradoria Geral da República).

O voto divergente animou as defesas dos réus e os aliados de Bolsonaro. A manifestação do ministro, prevista para ser dada até o meio-dia, acabou atravessando a tarde e entrou na noite.

Fux votou contra imputar a Bolsonaro crimes pelo 8 de Janeiro, por alegada falta de provas, e disse que ataques à sedes dos três poderes não foi “golpe”, sob o ponto de vista da lei. “É desarrazoado equiparar palavras com atos de violência”, afirmou.

O ministro desqualificou a denúncia da PGR e as provas. Disse também que “não configuram crimes eventuais acampamentos, manifestações, faixas e aglomerações que consistem em manifestações políticas com propósitos sociais, assim entendidos, com o desejo sincero de participar do autogoverno democrático”.

Abaixo, pontos relevantes do voto de Fux:

Nulidades
O voto do ministro aceitou os pedidos das defesas de falhas processuais no processo e apontou nulidade dos autos por falta de competência do STF e da Primeira Turma para julgar o caso. Na prática, como ele é voto vencido e a maioria deve afastar esses pedidos, nada acontece na ação.

Associação criminosa
Fux recusou a acusação por crime de associação criminosa, por entender que as provas não preenchem os requisitos para caracterizar esse tipo de crime. No voto ele declarou “inexistência de elementos suficientes que demonstrem a formação” de uma associação criminosa. “Não se deve punir bravatas.”

Dano ao patrimônio
Votou para absolver Bolsonaro e os demais réus dos crimes de dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado no processo da trama golpista. Segundo ele, “a imputação do crime de dano em razão de omissão não pode ser generalizada”. Fux destacou que não há provas de que os réus tenham ordenado a destruição dos prédios dos três poderes.

Golpe de Estado
O ministro eliminou o atentado violento ao estado democrático de Direito da lista de cinco crimes da denúncia e garantiu que “não existiu golpe de Estado”. Segundo ele, o crime de golpe de Estado “absorve” o de atentado à democracia, ambos partes do mesmo tipo penal.

Mauro Cid
O ministro manteve a delação de Mauro Cid, frustrando a tentativa das defesas de Jair Bolsonaro e aliados de anulá-la. Ele destacou que o ex-ajudante de ordens trouxe informações confirmadas por outras provas, que a anulação seria desproporcional e que eventuais contradições só devem ser consideradas na dosimetria das penas, sem comprometer a utilidade do pacto na investigação da tentativa de golpe.

8 de Janeiro
No voto, o ministro Luiz Fux afirmou que os atos do 8 de Janeiro não configuram golpe de Estado, comparando-os às manifestações de junho de 2013 e da Copa de 2014. Para ele, “turbas desordenadas” e “iniciativas esparsas” não se enquadram no tipo penal, e criminalizar ações desarticuladas violaria o princípio da lesividade, que protege o direito penal apenas para condutas que representem perigo real à estabilidade do Estado.

Críticas
Fux criticou também a postura de o juízes que não mantém o “distanciamento” das investigações. “A independência do juiz criminal” deve ser mantida e suas decisões devem ser tomadas sem contaminação “do clamor social e político”.