A reunião no apartamento do ex-presidente Michel Temer em São Paulo juntou personagens da nova e da velha geração do Centrão. Enquanto Temer, ex-chefe de Alexandre de Moraes e responsável por sua indicação ao STF (Supremo Tribunal Federal), era visto como o único capaz de convencer o ministro a não se ofender com os movimentos pela redução de penas dos condenados pela trama golpista, o deputado Paulinho da Força (Solidariedade-SP), relator do projeto na Câmara, já se ocupava de engrossar o apoio político para a proposta, que já tem a urgência aprovada, mas está ainda sem um texto pronto e acabado.

Paulinho sinalizou sua disposição de salvar o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), da obrigação de recuar após os arranhões de imagem que acabou ganhando por ter chamado Moraes de “tirano” em plena Paulista no 7 de Setembro. Tarcísio, segundo Paulinho, ainda não sinalizou o que acha da proposta de substituir a anistia ampla e irrestrita pela redução das penas, mas a iniciativa é vista por aliados do governador como uma saída também para ele. Ao fim e ao cabo, a proposta pode lhe servir como um caminho alternativo àquele adotado no feriado, com gestos mais explícitos para o bolsonarismo radical e que gerou frustração no eleitorado moderado.

Encontro marcado
De todo modo, Tarcísio se verá muito em breve diante da obrigação de tomar uma decisão. Para o final deste mês, ele tem um encontro marcado com Jair Bolsonaro, em Brasília, onde o ex-presidente está em prisão domiciliar. A visita já está autorizada por Moraes para o próximo dia 29. Se a estratégia eleitoral do governador era conquistar os votos bolsonaristas, não passando como traidor de seu ex-chefe, a adesão à tese da dosimetria defendida por Paulinho da Força e por uma parte grande do Centrão pode significar um abandono desse caminho e, em consequência, dos votos dos apoiadores mais fiéis ao ex-presidente. É um dilema que Tarcísio terá de enfrentar.

A carga de ser chamado de traidor pelo eleitorado de Bolsonaro já recaiu sobre o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), que nomeou Paulinho da Força como relator da proposta, com a orientação de elaborar um novo texto, sem o casuísmo de livrar Bolsonaro e o núcleo-duro do golpe. Motta também esteve no encontro na casa de Temer. É um risco que Tarcísio também passará a correr se avalizar a tese da dosimetria, ainda que por outro lado ele possa ganhar terreno entre os eleitores de centro.

A reunião com Temer teve ainda a presença do deputado Aécio Neves (PSDB-MG), que no ano passado tentou levar o PSDB para uma federação com o Republicanos de Tarcísio e resgatar parte da relevância do partido no campo da centro-direita. Os ministros Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes também participaram da conversa, de forma remota.

A proposta da dosimetria, que na prática buscará reduzir as penas dos condenados por participação na trama golpista, rivaliza com o governo e com o próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que já avisou a Motta ser contrário a qualquer tipo de anistia. Lula ainda não se posicionou em relação a alterar a dosimetria, mas a ordem no Planalto é tratar a iniciativa de aliviar as penas como “invenção da direita”.