Preso na madrugada desta terça-feira, 30, na CPI Mista do INSS no final de seu depoimento como testemunha, o presidente da Conafer (Confederação Nacional de Agricultores Familiares e Empreendedores Familiares Rurais), Carlos Roberto Lopes, foi solto horas depois, após pagar fiança. Uma semana antes, o empresário Rubens Costa ouviu voz de prisão na comissão depois de depor, saiu detido do Congresso e conseguiu ser libertado no mesmo dia.
O principal alvo das investigações, Antônio Carlos Camilo Antunes, conhecido como “Careca do INSS”, obteve com o ministro do STF André Mendonça o direito de não responder as perguntas da comissão. Diante de senadores e deputados na semana passada, só disse o que quis – quase nada.
Os sucessivos reveses enfrentados pela CPI nas duas últimas semanas decorrem de pedidos da PGR (Procuradoria Geral da República) e de decisões tomadas pelo Supremo com base nos direitos dos investigados de não produzirem provas contra eles mesmos nos depoimentos.
As dificuldades enfrentadas com as testemunhas podem virar um novo foco de atritos entre o Congresso e o STF. O presidente da CPI, senador Carlos Viana (Podemos-MG), e outros integrantes do colegiado elevarem o tom das reclamações sobre “interferência” nos trabalhos do Parlamento. “O problema é que hoje, no país, temos uma zona cinzenta entre o Judiciário e o Legislativo, temos que resolver. O Judiciário dá as decisões e nós temos que respeitar, porque é uma questão de equilíbrio”, disse Viana no início desta semana.
“Precisamos voltar o mais rápido possível com o conceito que a Constituição de 88 criou, que é o de freios e contrapesos”, acrescentou o senador. Para ele, o Congresso precisa “reequilibrar os poderes no país”. “Não é desrespeitar o Judiciário”, explicou. “Nós também temos que ser respeitados”, concluiu Viana. No início da sessão de segunda-feira, 29, e depois na madrugada do dia seguinte, ele falou em redefinição de “limites entre os poderes”.
Os arquivamentos pedidos pela PGR contra as prisões em flagrante foram o ponto de virada que irritou membros da comissão e fez Viana ir para o ataque. O órgão alertou a “polícia do Legislativo a tomar cuidado com prisões abusivas”, contou. “Infelizmente o que a gente vê é um Supremo Tribunal Federal e agora uma Procuradoria da República que se posicionam com muita clareza em completo desrespeito às decisões desse parlamento.”
As críticas feitas no mesmo dia da posse do ministro Edson Fachin na presidência do Supremo, com discursos sobre a independência e a harmonia entre os poderes, mostram a relevância desse debate nos altos escalões da República. Os conflitos em torno dos depoimentos de testemunhas se somam, assim, a outras controvérsias entre o STF e o Congresso, como as investigações relacionadas a emendas parlamentares e os processos sobre a tentativa de golpe que levaram à condenação do ex-presidente Jair Bolsonaro.
Preso
A Conafer é a principal entidade no esquema de desvios de aposentadorias do INSS sob investigação. Ouvido como testemunha, Lopes negou envolvimento com os crimes e disse desconhecer as fraudes e os principais personagens citados, como Antunes, preso desde o dia 12 pela Polícia Federal.
Depois de depor por horas aos parlamentares em sessão iniciada na tarde de segunda-feira, 29, Lopes recebeu voz de prisão do presidente da CPI na madrugada desta terça. Viana acusou o depoente de mentir à comissão e cometer crime de falsidade ideológica. “Ele mentiu à CPI desde o início da fala, escondeu informações”, afirmou o presidente da comissão.
Relator dos inquéritos, o ministro André Mendonça negou as prisões preventivas de outros investigados pedidas pelo colegiado e concedeu aos detidos o direito de permanecerem calados nos depoimentos. O problema, segundo a PGR, é que a comissão tem convocado pessoas “investigadas no STF como testemunhas”, o que as obriga a dizer a verdade. Por isso, a CPI prendeu dois deles nas últimas semanas. O procurador-geral da República, Paulo Gonet, explicou que os interrogados devem ser convocados como investigados – dando a eles o direito ao silêncio, previsto em lei.
O relator, deputado Alfredo Gaspar (União-AL), destacou que os trabalhos continuam e novas prisões serão feitas, se forem necessárias. Segundo Viana, “uma nova legislação” pode encerrar a discórdia. “Ou a CPMI tem que deixar de existir, ou então a Procuradoria da República, o próprio Supremo Tribunal Federal tem que começar a entender que aqui há um poder que tem capacidade de se administrar sozinho.” Para ele, o Congresso deve dar uma resposta: “mudar a legislação” ou, com certo exagero, “deixar de fazer CPMI”.