Em meio aos casos de intoxicação por metanol em bebidas destiladas, a Receita Federal afirmou nesta semana que o Sistema de Controle de Produção de Bebidas (Sicobe), desativado desde 2016, era voltado a cervejas, refrigerantes e águas. Não haveria, assim, relação entre sua desativação a atual crise. A Receita também destacou que o sistema tinha finalidade apenas tributária, não de qualidade.
No entanto, atos declaratórios da própria Receita, de 2012, mostram que o controle pelo Sicobe também foi aplicado a destilados industrializados. Os atos trataram da Companhia Müller, fabricante da cachaça 51, e a Ypióca, que produz marcas de destilados como Bacardi e Smirnoff.
A medida foi adotada à época a pedido de associações do setor, que preferiram substituir os selos físicos pelo sistema digital, já que o custo era equivalente (R$ 0,03 por garrafa) e o Sicobe garantia rastreamento em tempo real. Na prática, a Receita passou a acompanhar eletronicamente a produção de parte dos destilados.
Esse arranjo, porém, ruiu em 2016, quando o sistema foi suspenso. Como efeito imediato, os destilados perderam tanto o Sicobe quanto o selo de controle. A solução encontrada foi uma instrução normativa que obrigava apenas o envio de planilhas de produção — sem qualquer verificação direta em campo.
A coluna questionou a Receita sobre os atos que incluíam destilados sob a vigilância do Sicobe. O órgão, no entanto, não respondeu ao ponto e reafirmou a nota oficial segundo a qual não há relação entre as intoxicações por metanol e a desativação do sistema.
Fontes ligadas à Receita que participaram da criação do sistema dizem, contudo, que a suspensão abriu uma “zona cinzenta” e enfraqueceu a fiscalização. “Deixamos de ter instrumentos de impacto”, resume um ex-dirigente da área de riscos.
O Sicobe foi desligado em 2016 sob o argumento de inviabilidade técnica e jurídica. Desde então, o TCU já determinou duas vezes a reativação, mas as ordens foram suspensas pelo STF.