A presidente do STM, Maria Elizabeth Guimarães Teixeira Rocha, protagonizou neste fim de semana mais uma ato que demonstra os novos tempos dentro da corte militar. A ministra pediu desculpas em nome do Superior Tribunal de Justiça Militar para familiares dos “que sofreram com as torturas, as mortes, os desaparecimentos forçados e o exílio” no período da ditadura militar (1964-1985).  

“Estou presente neste ato ecumênico de 2025 para, na qualidade de presidente da Justiça Militar da União, pedir perdão a todos que tombaram, que sofreram, lutando pela liberdade do Brasil”, disse Maria Elizabeth, em pronunciamento neste sábado, 25, na Catedral da Sé, em São Paulo, no ato de 50 anos da morte do jornalista Vladimir Herzog. “Eu peço, enfim, perdão à sociedade brasileira, e à história do país pelos equívocos judiciários cometidos pela justiça militar federal em detrimento à democracia e favoráveis ao regime autoritário”, completou.

O pronunciamento teve destaque no noticiário do final de semana pelo ineditismo da autocrítica da presidente do STM sobre os crimes cometidos durante a ditadura. A atitude de Maria Elizabeth também ganha relevância por reforçar uma tendência de mudança de ares nos tribunais superiores. No próprio STM, a posse no final de setembro da ministra Verônica Sterman, segunda mulher a quebrar a barreira invisível de gênero no bicentenário colegiado, também representou um passo na direção dessa modernização.

O sinais de renovação são visíveis na cúpula do Judiciário. Sob o comando dos presidentes do STF, Edson Fachin, do TST (Tribunal Superior Eleitoral), Luiz Philippe Viera de Mello Filho, e com Maria Elizabeth à frente do STM, as três cortes superiores afinaram os discursos e adotaram bandeiras comuns, indicativo de uma “oxigenação” de perfis institucionais, vista como necessária e positiva no meio jurídico. 

Repaginados
Fachin, Vieira de Mello e Maria Elizabeth colocaram no centro de suas agendas temas como defesa dos direitos humanos e da democracia e manifestações por um Judiciário politicamente mais contido e com gestão austera de gastos. No Supremo, o presidente encabeça o movimento de inflexão nas cortes superiores.

Desde os primeiros dias na nova função, Fachin tenta manter o tribunal alheio a embates políticos e partidários e tem priorizado, na pauta de processos levados a julgamento, temas de interesse social e popular.

Fachin tem mantido rotina de reunir os presidentes dos tribunais e consultá-los sobre temas do Judiciário. Na primeira semana no cargo, ele recebeu (foto acima) Vieira de Mello, Maria Elizabeth, e o presidente STJ (Superior Tribunal de Justiça), Hermann Benjamin. Essas ações integradas e coordenadas entre as cortes superiores devem ser a regra em sua gestão.

Vieira de Mello é um dos que tem defendido gestão alinhada às diretrizes do chefe do STF, em especial, sobre austeridade dos gastos. Em sintonia com Fachin, ele declarou na sua posse “solidariedade e o apoio irrestrito ao Supremo”. “Num quadro tão delicado, teve coragem e independência e demonstrou a força do Poder Judiciário na defesa da nossa democracia e da soberania do nosso país. Ninguém calará o Judiciário, o Supremo Tribunal Federal e a Justiça do nosso país”, disse o presidente do TST.

TST contra regalias
No TST, Vieira de Mello assumiu em setembro com críticas aos salários altos e os “penduricalhos” – termo usado para adicionais e gratificações incorporados aos vencimentos – da magistratura. Além de cobrar a atuação mais comedida dos colegas de toga, o ministro defendeu ainda a “democracia”, “a modernização do Judiciário” e o STF.

“Somos servidores e precisamos ter cautela. O salário de juiz deve estar previsto em lei. É claro que deve ser digno, mas quem, de fato, está mal remunerado?”, questionou o ministro na posse. Foi uma resposta às críticas crescentes aos supersalários do Judiciário. O TST também virou notícia este ano ao anunciar uma “sala VIP no aeroporto de Brasília”, com gasto de R$ 1,5 milhão. Na semana em que assumiu, Mello Filho cancelou o contrato e alegou “ausência de necessidade de uso do espaço”.

Os traços comuns e os discursos afinados identificados nos comandos das três cortes não são fruto do acaso. Em um momento de riscos à democracia, conflitos sem precedentes entre os poderes e atentados às instituições, os novos ares decorrem, em parte, do perfil de Fachin, mas também de estratégia calculada e costurada por Lula para modernizar e flexibilizar as cortes superiores (constitucional, trabalhista e militar). Foi o petista que nomeou os Mello Filho para o TST em 2006, Maria Elizabeth para STM, em 2007, e Verônica Sterman, também para a corte militar, neste ano.

STM

STM oxigenado, a corte militar bicentenária
No STM, Maria Elizabeth destacou o “momento histórico” da posse de Sterman. “Quis o destino que fosse eu a empossá-la, ao lado do presidente da República que nos nomeou, em um gesto que reafirmou o compromisso democrático de privilegiar vivências distintas em prol do processo civilizatório nacional”, declarou.

A nomeação da segunda ministra mulher foi considerada um “momento singular da história”, como definiu o ministro Artur Vidigal de Oliveira: “Sua chegada marca uma nova página que se vira em nossa trajetória”. Segundo ele, a entrada da ministra celebra a capacidade do STM “de se renovar, de se oxigenar”.