Defensor da escola alemã e dos mandatos de doze anos para membros do Supremo, Luís Roberto Barroso deixa o STF (Supremo Tribunal Federal) oito anos antes do prazo estipulado para a aposentadoria compulsória, com um legado ímpar. Comandante da corte máxima da Justiça na fase mais atribulada de sua história, o ministro construiu uma sólida imagem de defensor da Constituição e da democracia.
“Esta é a última sessão plenária de que participo”, avisou Barroso no final da tarde desta quinta-feira, 9. Aos jornalistas, disse ainda não ter definido o futuro fora da corte. Sabe que se dedicará à vida acadêmica fora do Brasil, o primeiro destino será a Alemanha, em novembro, e depois segue, em janeiro, para a França para dar aula em um curso na Sorbonne. Em suas palavras, pensa em “viver um pouco da vida”, sem a exposição pública, as obrigações e as exigências do cargo.
Indicado em 2013 pela então presidente, Dilma Rousseff, na vaga do ministro aposentado Carlos Ayres Britto, Barroso teve uma passagem marcante pelo STF. Antes de assumir a presidência da corte, ele se levantou na defesa da Constituição e da democracia contra as pressões de Jair Bolsonaro, da família e de seus aliados. Essa atuação se tornou mais intensa a partir dos ataques do 8 de Janeiro e de sua posse no comando do tribunal, em junho de 2023, em substituição à ministra Rosa Weber.
Barroso teve destaque durante a pandemia de covid-19, no combate à desinformação e ao negacionismo. Ele desempenhou papel importante no período em que presidiu o TSE (Tribunal Superior Eleitoral), entre 2020 e 2022.
Ele também esteve à frente de temas como pesquisa em células-tronco, união homoafetiva, limitação do foro privilegiado e descriminalização do porte de maconha para uso pessoal. Teve destaque na discussão sobre o direito ao aborto em caso de feto anencéfalo, processo que ainda vai ser finalizado.
No universo das redes sociais, Barroso bombou com a fala “perdeu, mané, não amola”. Foi uma resposta atravessada que ele deu em 2022 a um provocador que o seguiu na rua em Nova Iorque depois da derrota de Jair Bolsonaro na tentativa de reeleição ao Planalto.
Briga com Gilmar
Um 2018 Barroso protagonizou um bate-boca no plenário com o ministro Gilmar Mendes, em uma discussão sobre regras eleitorais, que o persegue até os dias atuais, pelo vocabulário usado para fustigar o colega de toga: “Me deixa de fora desse seu mau sentimento, você é uma pessoa horrível, uma mistura do mal com atraso e pitadas de psicopatia”. Anos depois, os dois fizeram as pazes. No discurso de despedida nesta quinta, Barroso agradeceu a parceria de Gilmar, decano do STF, que retribuiu. No final, emocionados, os dois se abraçaram.
Nascido em Vassouras (RJ), Barroso deixa o STF aos 67 anos. Professor de Direito Constitucional e doutor pela Uerj (Universidade do Estado do Rio de Janeiro), ele tem mestrado na Universidade de Yale e pós-doutorado na Universidade de Harvard, ambas nos Estados Unidos.
Ao se despedir nesta quinta, ele fez uma breve reflexão sobre seu tempo no STF. “Todos nós julgamos causas difíceis, complexas, com interesses múltiplos. E cada um procura fazer o melhor. De minha parte, ao longo desses anos, diante das questões mais delicadas, eu as estudei, refleti e me convenci de qual era a coisa certa a fazer. E fiz”, afirmou. “Estou saindo do Supremo mas não abandonando o Brasil.”