A maré positiva ao governo Lula, que engloba a grave crise do bolsonarismo, atingiu definitivamente os humores da Faria Lima. Se nos últimos meses o favoritismo de Lula à reeleição vinha sendo a tônica de conversas e análises entre banqueiros e investidores, as avaliações agora vão além: já tem gente falando até em chances de o presidente ganhar o quarto mandato no primeiro turno.
A leitura da Faria Lima sobre o bom momento de Lula passa pelo que se entende como acertos políticos, sobretudo diante da crise com os Estados Unidos. O presidente, afinal, encontrou no discurso da soberania um fator de reaglutinação de um governo até então apagado e pobre de ideias e marcas, claudicante nas pesquisas de avaliação e popularidade.
Para além do discurso, que tirou da direita a retórica do patriotismo e de defesa do Brasil, desdobramentos políticos da posição de Lula lhe foram amplamente favoráveis em dois palcos: a ONU e a Casa Branca. No primeiro, Donald Trump falou da “química excelente” com o presidente. Eles conversaram ao telefone semanas depois e alinharam um encontro de chanceleres. No segundo, o secretário de Estado americano, Marco Rubio, recebeu e conversou civilizadamente com Mauro Vieira em Washington.
Os efeitos práticos do recuo de Trump, figura instável e inconfiável, ainda não foram vistos. As tarifas americanas seguem em vigor, embora com diversos setores de fora das sanções desde o início, e Alexandre de Moraes segue arbitrariamente enquadrado pela Lei Magnitsky. Diante do que se anunciava como um cenário absolutamente conflagrado, no entanto, Lula avançou algumas casas na pacificação das relações — agora com os olhares de Trump também voltados à vizinha Venezuela.
Outro ponto notado na Faria Lima como favorável ao presidente — nos mesmos moldes que a relação com Donald Trump, ou seja, avanços lentos e graduais — é uma aproximação dele com lideranças evangélicas. Lula, ao que tudo indica, indicará um ministro evangélico para o STF, Jorge Messias. Confirmada a escolha do ministro da AGU, estará quebrada a “exclusividade” de Jair Bolsonaro nesse quesito na corte.
Nesse contexto, Lula recebeu líderes da bancada evangélica na semana passada e se deixou fotografar em oração ao lado deles e de Messias (imagem acima). Não são novas as intenções do petismo em se aproximar das igrejas neopentecostais, território onde o bolsonarismo segue sendo mais forte. O prestígio de uma cadeira no STF e o simbolismo da foto orando no gabinete presidencial indicam passos concretos na reconstrução do diálogo — assim como com Trump.
Tudo o que Lula capitalizou politicamente, além do mais, não representou só ganhos diretos a ele, mas também derrotas debitadas diretamente da conta da direita. As sanções que ressuscitaram o governo e lhe deram um norte, afinal, foram urdidas por Eduardo Bolsonaro e anunciadas em nome de Jair Bolsonaro, agora condenado e em vias de ser preso. Refém da inegável força política do ex-presidente, a direita segue fragmentada. Tarcísio de Freitas tem se mostrado desanimado com a corrida presidencial e Ratinho Júnior surge como alternativa ao Centrão, enquanto Eduardo ataca todos os aliados do pai que buscam o caminho da centro-direita.
Se Tarcísio passou a incluir em suas contas políticas o cenário amplamente favorável a Lula, o mesmo vale para a Faria Lima, até outro dia entusiasmadíssima com a candidatura presidencial do governador.