A expansão das regras de transparência e rastreabilidade das emendas parlamentares federais para estados, municípios e para o Distrito Federal a partir de janeiro, determinada nesta quinta-feira, 23, pelo ministro do STF Flávio Dino, tem potencial para invadir e esquentar as eleições 2026. Sensível para senadores e deputados federais, esse assunto se tornou uma das frentes de desentendimentos entre o Judiciário e o Congresso nos últimos anos.
A exigência, pelo STF, de um rigor maior dos gastos locais deve espraiar novas investigações sobre desvios e ainda virar munição eleitoral contra adversários. A decisão do Supremo determina que a partir de janeiro, o modelo de controle das emendas criado em parceria com o Ministério Público, estados e municípios revele os dados sobre origem e destino de recursos, projetos e gastos. O ministro destacou na decisão que, das 27 unidades da federação, apenas três adotam práticas amplas de transparência e controle compatíveis com as regras federais.
Dino e representantes do STF, da PGR (Procuradoria Geral da República) e outras entidades e partes envolvidas apresentaram e debateram em audiência pública nesta quinta os trabalhos realizados e o avanço para uma nova etapa no processo. Relator do caso sobre novas regras para as emendas e uso dos recursos, o ministro criticou a reprodução em âmbito local dos desvios e da falta de controle combatidos na esfera federal.
Com a decisão de Dino, o mesmo procedimento do Congresso deve ser aplicado para deputados estaduais e vereadores para liberação das emendas. “A reprodução de condutas espúrias nos entes federados corrói as bases do pacto federativo”, disse Dino. Segundo ele, “ainda persiste a cultura de apropriação privada do orçamento público”.
A notícia repercutiu e as entidades, como a Transparência Internacional – Brasil, comemoram a decisão inédita, que torna uniforme no país a regra. Levantamento feito pelas organizações – elas são parte interessada no processo – apontam que R$ 12 bilhões por ano são movimentados em emendas estaduais, distritais e municipais.
Sob investigação
O STF e o grupo que atua na ação devem analisar cerca de 35 mil emendas parlamentares até junho de 2026 – às vésperas do início da campanha eleitoral. No total, vão examinar R$ 20 bilhões em gastos. Dino afirmou ser “dever” do Judiciário e de órgãos de controle apurar os eventuais desvios de recursos.
A advogada-geral do Senado, Gabrielle Pereira, explicou que as regras adotadas desde 2022 aumentaram a transparência e a rastreabilidade do dinheiro usado. “Temos hoje planos prévios de trabalho aprovados antes da liberação de qualquer recurso, temos atas para indicação de execução publicizadas, tanto de bancada quanto de comissão, e aprovadas”, afirmou ela na audiência no Supremo.
O ministro determinou aos órgãos de controle, em especial, um olhar com lupa nos municípios e estados nos envios de dinheiro para mutirões de cirurgias, eventos e shows de artistas famosos. De 2000 a 2024, mais de R$ 17 bilhões da União foram enviados a estados e municípios via emendas “com pouca ou sem transparência”. “Temos que melhorar a eficiência do gasto”, disse o ministro.
Dino ordenou ainda ao governo Lula a realização de campanhas publicitárias, de dezembro a fevereiro, sobre a transparência e o rastreio de valores de emendas, com destaque para os canais abertos de consulta disponíveis pela internet. Os primeiros impactos das medidas do STF serão avaliados em reunião em março, quando o ministro recebe representantes dos tribunais de contas dos estados para um balanço.
