Há três décadas a professora brasileira Sônia Silva, 60 anos, mora em Nova York, onde deu aulas de biologia até se aposentar. Em fevereiro deste ano, quando viu o deputado estadual democrata Zohran Mamdani se credenciar para disputar a prefeitura da cidade, Sônia logo se engajou na campanha. Passou a ser uma “field leader”, como os americanos chamam os voluntários que fazem às vezes dos cabos eleitorais que conhecemos aqui no Brasil.
A brasileira lembrava de Mamdani da época em que ele, ainda se preparando para disputar uma cadeira de deputado estadual, apoiou o senador Bernie Sanders na disputa com Hillary Clinton pelo posto de candidato democrata à presidência dos Estados Unidos. Mamdani se identificava com Sanders. Ambos se apresentam como socialistas. Hillary venceu as primárias democratas, mas perdeu as eleições depois para o republicano Donald Trump.
Nascido 1991 em Kampala, capital da Uganda, aos 7 anos Mamdani se mudou para Nova York com os pais, de origem indiana. A mãe é a cineasta Mira Nair e o pai é Mahmood Mamdani, professor de antropologia na Universidade Columbia. Ele assumiu a vaga de deputado estadual pelo Queens em 2018, mesmo ano em que se tornou cidadão americano. Na campanha pela prefeitura, Mamdani sofreu oposição cerrada do presidente Donald Trump, que o chamou de “lunático comunista”.
Crise financeira
A brasileira Sônia seguiu a onda do novo fenômeno democrata quando ele ainda era um personagem lateral. Filiada ao PT desde 2022, ela tem o costume de participar de manifestações em Nova York relacionadas à política brasileira. Foi assim, por exemplo, nos protestos contra o impeachment de Dilma Rousseff e na campanha “Lula Livre”, pela libertação do hoje presidente da República à época em que ele estava preso em razão da Operação Lava Jato.
Sônia diz que, ao participar ativamente da campanha de Mamdani, percebeu mudanças na cabeça dos eleitores mais jovens, de até 35 anos, faixa de idade que aderiu mais fortemente ao candidato e que foi decisiva para sua vitória, nesta terça-feira, 4.
“Os jovens, de uma maneira geral, não estão vivendo a segurança que os pais viviam. A crise financeira está afetando a capacidade deles de assumir a autonomia financeira”, diz ela. “Esses jovens passaram a não comprar mais o discurso de medo, a ideia de que o socialismo vai acabar com direitos e valores”, segue ela, lembrando de experiências que ouviu durante as visitas de porta em porta para pedir votos para Mamdani no Queens.
Visões sobre Gaza
Sônia ainda descreveu a decepção de jovens judeus com a guerra em Gaza como fator de convencimento. Mamdani é muçulmano – o primeiro a assumir a prefeitura da mais rica metrópole do mundo – e, desde o início, se posicionou firmemente contra Israel e o apoio dos Estados Unidos à ofensiva militar na Palestina. A postura ajudou a conquistar o apoio de jovens judeus não-sionistas.
“Há uma nova visão política em Nova York”, comemora Sônia, satisfeita com o resultado da eleição com o qual, do seu jeito e dentro das suas possibilidades, ajudou a construir.
