O “ativismo judicial” colocou, mais uma vez, ministros em rota de colisão sobre o papel do STF diante de problemas nacionais, que desaguam em forma de litígio – muitas vezes insolúveis – na corte máxima do judiciário brasileiro. Nesta terça-feira, 18, os ministros Flávio Dino e Alexandre de Moraes rebateram, sem citar nomes, as criticas generalizadas sobre “excessos” do Supremo Tribunal Federal, durante o julgamento do “núcleo 3” da trama golpista na Primeira Turma.

A manifestações foram feitas um dia depois que o ministro André Mendonça defendeu a autocontenção institucional do Supremo e criticou o “ativismo judicial” durante palestra para empresários em São Paulo. “É quase como se fossem palavras mágicas: eu não tenho bem o que dizer e digo ‘isso é culpa do ativismo judicial'”, afirmou Dino ao desqualificar o uso do termo.

Atual presidente da Primeira Turma, ele fez uma espécie de “aparte” para uma “defesa institucional” do tribunal e dos colegas, antes de votar em processo contra os militares da trama golpista. Foi uma lavagem de roupa suja. Segundo Dino, as críticas têm o objetivo de “descredenciar” o STF e “têm tanta consistência quanto as espumas das ondas que quebram na praia”.

O ministro lembrou ainda que a expressão “ativismo judicial” foi “trazida dos Estados Unidos” e tem outro contexto no Brasil. Para Dino, o uso do termo se tornou “um lugar comum de baixíssima qualidade doutrinária e técnica” usado para “ornar pronunciamentos destituídos de consistência”. “Às vezes, ministro Alexandre, isso é usado quando se refere a inquéritos que nunca acabam, ativismo judicial para obter aplausos fáceis em certas plateias.”  

Espuma no mar
Dino citou os processos contra golpistas como exemplo de trabalho do STF feito dentro da lei, defendeu o relator Alexandre de Moraes e citou os “inquéritos que nunca acabam” – como ele se referiu às investigações abertas e concentradas no gabinete de Moraes contra bolsonaristas. “Supostamente haveria no Supremo Tribunal Federal um intento, um intuito, uma sanha de fazer com que inquéritos, sobretudo os [que estão] sob a condução do ministro Alexandre se eternizassem”, disse Dino.

Integrante da Segunda Turma, Mendonça não estava presente no momento da fala de Dino. Na palestra em São Paulo, ele afirmou nesta segunda-feira, 17, que o Brasil está “doente” e vive um quadro crítico, citando a “insegurança jurídica” e o “enfraquecimento institucional” como exemplos de reflexos negativos do “ativismo judicial”. Segundo ele, o Supremo tem excedido seu papel de Poder Judiciário ao estabelecer regras legais e depois julgá-las. “Criamos restrições sem lei. Isso se chama ativismo judicial. Não defendo porque a Constituição não me dá esse direito”, disse o ministro.  

Mendonça voltou a citar o julgamento do Marco Civil da Internet, de junho, em que a corte estipulou normas para as plataformas digitais atuarem no Brasil. Voto divergente no processo, que ampliou as responsabilidades das plataformas pela moderação de conteúdo pelo estado. Para ele, o STF “criou restrições sem lei” e gerou um problema: “O tribunal não pode dar a primeira e a última palavras”. Mendonça disse que o caso configura “ativismo judicial, que muitos colegas defendem”.

Para Moraes, interesses econômicos e ideológicos confundem o debate. “O ativismo comercial precisa que se fale do ativismo judicial. Então é isso: levantar algo que não existe”, afirmou o relator dos processos da trama golpista, que em outras ocasiões destacou que as críticas “surgem quando há discordância em relação à decisão” do Judiciário.