A Câmara aprovou nesta terça-feira, 18, por 370 votos a 110, o texto-base do PL Antifacção, que teve seis versões do relator Guilherme Derrite (PP-SP) antes de chegar ao plenário. A proposta, enviada originalmente pelo governo Lula para atualizar a legislação sobre crime organizado, ganhou contornos próprios durante a tramitação e acabou transformada em um marco autônomo para punir facções, milícias e grupos paramilitares. O texto cria novos tipos penais, entre eles o Domínio Social Estruturado, com pena de 20 a 40 anos, ampliável a 66 em casos de liderança, e reorganiza instrumentos de confisco e destinação de bens apreendidos.
A mudança de rota desagradou ao Planalto, que passou a orientar voto contrário ao relatório. Para o governo, a iniciativa deixou de ser uma atualização legislativa e se converteu em um sistema paralelo ao da lei atual, com risco de sobreposição e conflito com normas já existentes. A manutenção da divisão dos recursos oriundos de bens confiscados entre fundos estaduais e a Polícia Federal também foi alvo de críticas, pois reduz o potencial de financiamento da PF. Governistas também apontam que as atribuições ampliadas das polícias civis e o escopo da nova lei podem alterar o equilíbrio entre as forças de segurança.
Do lado da oposição, a disputa se concentrou na tentativa do PL, por meio de um destaque, de equiparar crimes de facções ao terrorismo, movimento barrado por Hugo Motta (Republicanos-PB) sob o argumento de que o tema não tinha relação direta com o projeto. O debate sobre o enquadramento das facções acompanhou praticamente toda a tramitação e marcou as primeiras versões de Derrite, que chegaram a promover ajustes na Lei Antiterrorismo. O relator recuou após a resistência da base governista e da área econômica, que alertaram para riscos diplomáticos e impactos na percepção de investidores.
Mesmo com esses recuos, Derrite manteve a estrutura desenhada ao longo das versões anteriores. O texto consolida penas mais duras, cria um banco nacional e bancos estaduais de dados sobre organizações criminosas, detalha a realização de audiências de custódia por videoconferência e redefine procedimentos para o perdimento extraordinário de bens. Ajustes pontuais pedidos pela PF, pela Receita e pelo Ministério da Justiça foram incorporados na reta final, mas sem alterar a espinha dorsal da proposta.
Com a derrota no plenário, integrantes do governo afirmam que vão concentrar esforços no Senado para revisar trechos considerados problemáticos. A relatoria ficará com Alessandro Vieira (MDB-SE), que já sinalizou a intenção de discutir ajustes. Ao anunciar o resultado, Motta afirmou que a aprovação representa uma resposta institucional ao crime organizado: “A função do Parlamento não é carimbar projetos. É entregar a melhor versão possível para enfrentar um problema que não escolhe lado político”, declarou.
Discurso inflamado e exaltação de aliados
Depois da aprovação, Derrite adotou um discurso político para defender o parecer. Ele acusou o governo Lula de tentar “enfraquecer” o projeto e de não ter buscado diálogo ao longo da tramitação, além de afirmar que o texto original do Executivo era “fraco” no enfrentamento às facções. O relator exaltou o endurecimento penal aprovado pela Câmara e disse que críticas sobre perda de poderes da Polícia Federal foram “narrativas mentirosas”.
No fim da fala, Derrite agradeceu nominalmente aliados e citou o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), e o ex-presidente Jair Bolsonaro, vinculando sua atuação e trajetória política aos dois. Ele afirmou que o projeto marca o fim da “farra” do crime organizado e declarou que “o tempo da impunidade acabou”, em discurso celebrado pela ala bolsonarista da Câmara.
