Jair Bolsonaro alegou “certa paranoia” e “alucinação” antes da tentar abrir a tornozeleira eletrônica afixada em sua perna  com um ferro de solda por acreditar na existência de uma “escuta” colocada dentro do equipamento – afixado na perna do ex-presidente desde agosto para monitorar seus passos e evitar fugas. Ouvido em audiência de custódia neste domingo, 23, foi a primeira vez que ele falou em juízo desde que foi preso preventivamente pela Polícia Federal, um dia antes, por ordem do ministro Alexandre de Moraes do STF (Supremo Tribunal Federal).

Na sede da Superintendência da Polícia Federal no Distrito Federal, o ex-presidente negou a tentativa de fuga investigada pela PF. Disse ter sofrido um “surto” decorrente do uso de remédios pesados e de noites de sono mal dormidas que o teriam levado a buscar uma suposta escuta no equipamento

O quadro paranoico relatado pelo ex-presidente seria decorrência do uso de remédios para tratamento psiquiátrico contra ansiedade e depressão. “Começou a tomar um dos remédios há cerca de quatro dias”, registra a ata da audiência de custódia, presidida pela juíza auxiliar do gabinete de Moraes Luciana Yuki Sorrentino. “Depoente afirmou que estava com ‘alucinação’ de que tinha alguma escuta na tornozeleira, tentando então abrir a tampa”, consta no documento.

Depois de passar a primeira noite preso na cela especial montada na superintendência da PF, o ex-presidente foi ouvido por cerca de 40 minutos. “Bolsonaro fica preso por tempo indeterminado”, decidiu a juíza ao manter a detenção preventiva.

Uso de medicamentos
A audiência de custódia – criada em 2015 – é realizada logo após as prisões para dar ao detido o direito de apontar excessos, ilegalidades e outros problemas na ação de prisão executada pela polícia. O motivo que levou à prisão, álibis, motivações e argumentos – como os apresentados pelo ex-presidente de falta de responsabilidade por seus atos – não é analisado nessa primeira oportunidade de reverter a detenção.

Os argumentos apresentados por Bolsonaro sobre “surto”, “certa paranoia” e “alucinação”, decorrentes do uso de medicamentos e por problemas com as “noites mal dormidas”, podem até servir para sua defesa formal tentar reduzir sua pena, mas tem pouco peso na análise da prisão executada no último sábado pela PF.

Segundo disse o ex-presidente na audiência de custódia, por volta da 0h do sábado, 22, ele “caiu na razão” e interrompeu a tentativa de abrir a tornozeleira. Bolsonaro disse que “não se lembra de ter um surto dessa natureza em outra ocasião”.

As razões apresentadas à juíza se enquadram em um caso de tese de réu inimputável – aquele que não pode ser responsabilizado por seus atos. Esse tipo de argumento, no entanto, não tem validade para a audiência de custódia, mas serve de teste de aderência no STF para a defesa. Nesta segunda-feira, 24, a ordem de prisão de Bolsonaro dada por Moraes será analisada na Primeira Turma do STF. Os ministros votarão e decidirão se referendam a decisão do relator dos processos golpistas, em sessão virtual que começa às 8 horas e encerra às 20 horas.

Resposta da defesa
A defesa de Bolsonaro respondeu neste domingo, 23, ao pedido de explicação de Moraes sobre a violação da tornozeleira eletrônica. “Inexiste risco de fuga”, informou a defesa. O documento repete o depoimento de Bolsonaro na audiência de custódia, sobre “confusão mental”, gerada pelo uso de medicamentos, e pede avaliação por médicos para que a ordem de prisão seja revertida.

Os advogados pedem Celso Vilardi, Paulo Bueno e Daniel Tesser, representantes de Bolsonaro, pediram que Moraes analise a petição feita anteriormente, que “requereu prisão domiciliar humanitária”.

Ex-primeira-dama
No fim da tarde deste domingo, autorizada por Moraes, a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro visitou o marido preso. Ela chegou por volta das 15 horas e saiu poucos minutos antes das 17 horas, final do horário das visitas. Ela chegou e saiu sem falar com a imprensa.