Depois de 15 dias de crise com Davi Alcolumbre, o governo fez dois gestos nesta quarta-feira, 3, para tentar melhorar o clima com o Senado. O fato que permitiu os acenos do Planalto foi a decisão de Gilmar Mendes que restringiu ao procurador-geral da República a competência para pedir impeachment de ministros do STF. Nos dois movimentos, o governo se aliou ao Senado contra o Supremo.

O primeiro aceno foi dado pelo líder do governo no Senado, Randolfe Rodrigues (PT-AP), que fez uma autocrítica para se posicionar ao lado do Centrão e da oposição nas críticas ao despacho de Gilmar. Em discurso no plenário, Randolfe relembrou a votação da PEC (Proposta de Emenda à Constituição) 8/2021, do senador Oriovisto Guimarães (Podemos-PR), que limita as decisões monocráticas do STF e de outros tribunais. “Estou fazendo uma autocrítica e procurando me redimir”, afirmou o líder do governo. “Se hoje a PEC fosse votada novamente, eu não só subscreveria, como votaria favoravelmente”, disse.

Aprovada pelo Senado em dezembro de 2023, a PEC continua em tramitação na Câmara. Na época da votação, os senadores governistas foram voto vencido, pois o Planalto se posicionou ao lado do STF,  alvo de constantes ataques dos bolsonaristas. 

A decisão de Gilmar Mendes desta quarta-feira funcionou como um divisor de águas no momento da crise na relação entre o governo e Alcolumbre em torno da indicação de Jorge Messias para a vaga deixada por Luís Roberto Barroso no Supremo. Em consequência da atitude do ministro do STF, oposição, centro e governistas ficaram do mesmo lado, em defesa das prerrogativas dos parlamentares.

O líder do governo argumentou que, se a lei prevê que um processo de impeachment contra o presidente da República pode ser aberto a partir do pedido de qualquer cidadão, por que o mesmo não pode acontecer com ministros do STF? Na opinião de Randolfe, a diferença de tratamento não é “republicana” nem “constitucional”.

A manifestação da AGU
O segundo gesto do governo foi feito à noite. Em campanha pela aprovação de seu nome para a vaga do STF, Messias se manifestou contrariamente à decisão de Gilmar. O parecer foi escrito por Messias na condição de advogado-geral da União, mas se tornou um fato político pelo contexto da relação entre o Planalto e Alcolumbre.

No documento enviado ao STF, Messias pede que Gilmar reconsidere a decisão de derrubar o dispositivo da lei que prevê que qualquer cidadão pode apresentar pedidos de impeachment. Caso tivesse adotado a linha oposta, esse assunto tinha potencial para dificultar ainda mais a indicação do advogado-geral da União para o Supremo.

Mas Messias assumiu a defesa das prerrogativas dos parlamentares e considerou inconstitucional a decisão de Gilmar. O parecer usou argumentos semelhantes aos que foram expostos no plenário por Randolfe.

Messias pediu reconsideração pelo STF em relação à suspensão de dispositivos da Lei do Impeachment por entender que ela atenta contra a “legitimidade popular” para denúncias contra ministros do STF. O parecer sustenta também que a decisão confronta com o princípio da separação dos poderes. “O acolhimento de tal pedido implicaria atuação dessa Suprema Corte como uma espécie de legislador substitutivo, tutela que não se admite no ordenamento pátrio, sob pena de vulneração ao postulado da separação dos Poderes”, diz o documento.

No meio da crise com o governo, Alcolumbre cancelou na terça-feira a realização da sabatina de Messias na Comissão de Constituição e Justiça. O motivo foi o fato de o Planalto não ter enviado a mensagem formal com a indicação do advogado-geral da União para o STF. O presidente da CCJ, Otto Alencar (PSD-BA), governista, disse que a sabatina deve ser feita apenas em 2026.