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A encruzilhada de Lula entre inflação oficial, preços no mundo real e popularidade

Alta de grupos que pesam no orçamento familiar dos brasileiros faz com que, mesmo o índice de preços referência registrando desaceleração em janeiro, o governo ainda não consegue faturar politicamente

Lula e Fernando Haddad
Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Não dá nem para comemorar. A inflação oficial em janeiro, de 0,16%, foi a menor para o mês em 30 anos, mas está longe de representar um alívio para o Palácio do Planalto e para o presidente Lula, que vê sua popularidade derreter nas pesquisas de opinião pública.

O motivo é simples: apesar de, nas planilhas do IBGE, o índice ser menor também que o 0,52% de dezembro, no mundo real o sentimento é bem diferente. A alta de preços de alguns produtos relevantes no orçamento das famílias brasileiras foi bem maior do que o IPCA do mês e reforça o sentimento de que “as coisas estão pela hora da morte”, como no dito popular.

Vejamos: a comida em casa ficou 1,07% mais cara no mês passado. A carne continua em alta, a cenoura foi uma das vilãs nesse grupo (alta de 36,14%), junto do tomate (+20,27%), e o preço do cafezinho subiu mais de 8%. No geral, o grupo alimentos e bebidas teve alta de 0,96% no mês passado.

Quem come fora de casa também percebeu o encarecimento das refeições, de 0,67%,  bem acima do IPCA. Para os que usam transportes públicos, a alta nas passagens de ônibus foi 3,84% no período. A viagem de férias com a família no início do ano também pesou porque as passagens aéreas registraram aumento de 10,42%, puxando a inflação do grupo “transportes” para 1,30% no mês. Foi o maior impacto entre os nove grupos pesquisados pelo IBGE.

Os que não usam ônibus ou avião para se deslocar por ter o próprio meio de transporte sentiram a inflação dos combustíveis. Os preços do etanol subiram 1,82%,  os do diesel cresceram 0,97%, os da gasolina tiveram elevação de 0,61% e o gás veicular foi reajustado em 0,43%.

No sentido inverso,  o preço da energia elétrica residencial caiu 14,21%. A queda foi puxada pela incorporação de um bônus gerado pela energia excedente produzida na usina de Itaipu e creditado nas faturas do mês. Ou seja, algo bem pontual, e não exatamente uma sinalização de tendência de preços. Mas se a conta de energia em casa teve alívio, as tarifas de água e esgoto aumentaram 0,97% e as do gás encanado, 0,46%.

Ajudaram, a puxar para baixo o IPCA do mês passado, além de habitação (onde está incluída a energia elétrica), os grupos artigos de residência (-0,09%), vestuário (-0,14%) e comunicação (-0,17%). Com o resultado de janeiro, a inflação oficial acumulada em doze meses recuou dos 4,83% registrados em dezembro para 4,56%. Mas ainda está acima do teto da meta de 4,5%, que serve de referência para política de juros comandada pelo Banco Central.

E um ponto importante. Para os diretores do BC, não é apenas a inflação corrente que importa. Na última reunião do comitê que define a trajetória dos juros no país, o Copom, eles deixaram claro que o ciclo de alta nos juros em andamento vai levar em conta, além do comportamento dos preços, as expectativas em relação ao futuro, que estão em alta. Segundo o boletim Focus desta semana, que resume um levantamento feito pelo BC entre analistas e especialistas de mais de 100 instituições financeiras, a estimativa do IPCA para 2025 subiu pela 17ª semana, passando de de 5,51% para 5,58%.

Enquanto o BC tenta recuperar a credibilidade, reforçando o “firme compromisso de convergência da inflação à meta” com a política monetária, o ministro Fernando Haddad corre por outro lado e quer sinalizar comprometimento do governo com o equilíbrio das contas públicas e estabilidade do endividamento público. Nesta terça-feira, 11, o ministro teve uma reunião com o presidente do Senado, Davi Alcolumbre. Garantir o andamento da agenda econômica no Congresso é um ponto fundamental para o governo.

Além da aprovação da segunda parte da reforma tributária e de outros projetos já negociados e em tramitação, Haddad quer abrir caminho para novas propostas que ainda não foram encaminhadas. É o caso da isenção de Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil por mês. O governo quer o tema atrelado ao aumento da tributação para quem recebe mais de R$ 50 mil por mês, como forma de compensar a isenção para parte da classe média.

O governo precisa manter a casa arrumada, já que há outros fatores que influenciam o comportamento da inflação aqui no Brasil e ele não tem o menor controle. No front externo, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, monopoliza as atenções do mundo com a recente decisão de taxar em 25% todas as importações de aço e alumínio no país.

A medida, prevista para entrar em vigor em março, terá impacto nas exportações brasileiras se nada for alterado até lá. Além disso, da forma como foi proposta, a taxação deverá gerar pressão na inflação dos americanos, aumentando as chances de o Fed, o banco central de lá,  subir juros. Altas na taxa de juros americana provocam migração de dinheiro estrangeiro para os Estados Unidos, contribuindo para a desvalorização das moedas de países em desenvolvimento, como o Brasil. E dólar mais caro, para os brasileiros, significa mais inflação de alimentos aqui, como vimos no final de 2024.

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