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À espera de interlocutor de Trump, Itamaraty tenta unificar discurso do Brasil

Enquanto o Congresso americano não formaliza o nome indicado pela Casa Branca, diplomatas brasileiros trabalham para evitar declarações que prejudiquem as tratativas sobre a taxação de aço e alumínio

Donald Trump
Foto: Isac Nóbrega/PR

Em compasso de espera, a diplomacia mundial ainda não tem oficialmente nem com quem negociar no governo americano. Apesar das medidas anunciadas pelo presidente Donald Trump, o advogado Jamieson Greer, indicado para ocupar a vaga de representante comercial dos Estados Unidos (USTR, na sigla em inglês), teve seu nome aprovado por um comitê do Senado nesta quarta-feira, 12, mas ainda precisa do aval do plenário para ser formalizado.

Não há previsão de nenhuma mudança de postura do governo americano. Ao contrário, o escolhido para o cargo é veterano na guerra comercial da primeira gestão Trump e já sinalizou, em fala a parlamentares americanos, que vai revisar acordos, por exemplo, com a China.

Greer defende aumento da produção interna e acesso a mercados externos nos quais os produtos americanos não podem competir até agora. Em declarações recentes, o advogado defendeu os Estados Unidos como “um país de produtor”, com a justificativa de que “somente com uma base de manufatura e uma economia de inovação robustas o país terá poder de fogo para impedir conflitos e proteger os americanos”.

O indicado foi chefe de gabinete do representante comercial no primeiro mandato de Donald Trump, Robert Lighthizer, e acompanhou de perto as taxações impostas na época.

Compasso de espera
“Não há interlocutor ainda”, diz um diplomata brasileiro. “Greer ainda vai ser aprovado, chegar no cargo e nomear equipe. Isso só reforça nossa visão de que não há motivo para ansiedade”, completa.

Com isso, o esforço dos diplomatas brasileiros nos últimos dias foi organizar a melhor forma de conduzir as negociações tão logo o representante comercial assuma efetivamente. Mais importante, trabalham para unificar o discurso do Brasil, especialmente com o presidente Lula.

Um ponto importante para o Itamaraty é retirar a discussão sobre a taxação das importações de aço e alumínio pelos Estados Unidos do tabuleiro político e evitar declarações que só alimentariam uma guerra explícita e pública, que não interessaria ao Brasil. Os negociadores preferem levar o debate para a diplomacia comercial, onde há espaço para tratativas que minimizem estragos.

Dentro do governo, prevalece a avaliação de que há um aprendizado sobre o modo de agir de Trump, em especial quanto ao setor de aço, que já foi alvo de taxações na primeira gestão do republicano na Casa Branca. Com isso, é possível se movimentar de forma mais estratégica.

Seguindo essa lógica, o Itamaraty defende que não há razão para ninguém no governo falar em “retaliação”, mas em “reciprocidade”. A postura de retaliar é vista como um chamamento para disputas públicas, enquanto “reciprocidade” é algo que faz parte do mundo comercial e das relações internacionais.

Como a medida vale para todo mundo, embora cada país tenha seus interesses, esperar a ação de outros parceiros comerciais dos Estados Unidos pode fortalecer o posicionamento brasileiro. “A medida tem efeitos sistêmicos. Afeta, também, a economia americana. O presidente Trump não vai jogar contra os interesses do seu país”, diz uma fonte do governo.

Nesse sentido, o presidente americano não tem como atender toda a cadeia industrial local afetada pela taxação dos produtos importados. “Ele propôs o jogo e, por enquanto, a mídia mundial comprou. Mas não é uma equação simples”, continua a fonte. Na verdade, aço e alumínio são instrumentos de barganha para abrir mercados para produtos americanos.

No caso do Brasil, os Estados Unidos têm interesse em abastecer o mercado nacional com etanol produzido em solo americano, especialmente em regiões onde o novo presidente tem importantes apoios. Iowa, reduto eleitoral de Trump nas últimas eleições, por exemplo, é grande produtor de etanol a partir do milho.

Polêmica política
O setor de tecnologia também é de interesse dos Estados Unidos. Essa é a área que mais preocupa internamente o governo brasileiro. Há receio de que a discussão sobre as big techs e a regulamentação do setor seja usada para criar fatos que serão explorados politicamente.

O Brasil tenta evitar novas polêmicas para não dar munição para a oposição usar nas eleições de 2026. No ano passado, o STF entrou em confronto direto com o bilionário Elon Musk, dono da plataforma X e agora chefe do Departamento de Eficiência Governamental de Trump.

No início do ano, a Meta anunciou o fim da checagem de notícias nas suas plataformas (Instagram e Facebook), numa guinada de Mark Zuckerberg, o dono da empresa, na direção de Donald Trump. À época, Zuckerberg chegou a dizer que iria pedir ajuda ao presidente dos Estados Unidos para acabar com que o que chamou de “censura” de outros países às plataformas americanas.

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