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Menos crescimento com inflação: mais problemas para o governo à vista?

Risco de recessão técnica entra no radar do mercado e pode aumentar a percepção negativa em relação a Lula. Para presidente do PT, mesmo crescendo menos, ainda há feitos a mostrar, mas é preciso "parar de falar em cortes"

Lula e Fernando Haddad
Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Nas contas de parte dos analistas de mercado, o choque de juros promovido pelo Banco Central para tentar derrubar a inflação do patamar atual de quase 5% para cerca de 3% ao ano deverá promover uma desaceleração forte do nível de atividade, com chances de o país registrar dois trimestres seguidos de contração econômica em 2025. No jargão financeiro, esse movimento chamado de recessão técnica consiste na redução da produção de bens e serviços, queda no consumo e aumento do desemprego. Na linguagem política, isso significa mais problemas para o governo e para popularidade do presidente Lula.

Relatório da consultoria MB Associados aponta que “a probabilidade de duas quedas consecutivas no PIB trimestral no segundo semestre, hoje, está acima de 50%”. E, segundo o economista Sérgio Vale, analistas e investidores seguem apreensivos em relação a 2026. As indefinições sobre as candidaturas para sucessão presidencial e o que o novo presidente fará em 2027 para segurar o crescimento da dívida pública são as maiores dúvidas.

Junte-se a isso o choque de juros (a taxa referência para economia deverá subir mais de três pontos percentuais em seis meses)  e está dado um cenário com chances de recessão técnica ainda em 2025. “A dúvida é se essa desaceleração na economia será suficiente para jogar a inflação para meta”, pondera Vale. “Não estamos num momento de inflação represada, mas caminhamos, provavelmente, para um cenário de estagflação leve, com recessão e crescimento baixo em 2026 e com a inflação se mantendo no tento da meta.”

Para a presidente do PT, Gleisi Hoffmann, o país teve dois anos de forte crescimento (2023 e 2024) e, mesmo com a desaceleração esperada para 2025, o nível de atividade ainda deverá se manter forte. Estimativas coletadas pelo BC apontam crescimento econômico em torno de 2% para este ano e, também, para 2026. Além disso, ela destaca que o governo Lula tem bons indicadores econômicos que o “país não vivia há anos”. O foco neste momento, enfatiza ela, deve ser em mostrar isso para a população, que tem melhorado de vida. Por isso, Gleisi é taxativa: “É preciso falar menos de cortes (no Orçamento) e mostrar mais o que foi feito até aqui”.

Gleisi argumenta que a inflação vai ceder com ajuda da queda na cotação do dólar e, também, do recuo dos preços dos alimentos. O governo vem sustentando que o aumento na produção agrícola, em especial com a safra recorde esperada para 2025, reverterá a alta recente de produtos importantes na mesa dos brasileiros como café, óleo de soja, carne e até ovo. A inflação dos alimentos tem pesado na avaliação negativa do governo e na popularidade do presidente Lula, que atingiu o pior nível nas últimas pesquisas de opinião, gerando um clima de que a vida está piorando.

A economista Zeina Latif, da Consultoria Gibraltar, pondera que “aumento de juros sozinho não produz recessão”. Segundo ela, os momentos de retração econômica na história recente aconteceram com a combinação de aperto monetário com outros fatores como crise mundial, crise de confiança e crise política. Zeina destaca ainda que, como alguns setores são protegidos (seja por políticas públicas que subsidiam linhas de crédito, tarifas controladas ou com demanda que não muda mesmo com alta de preços), isso minimiza parte do impacto esperado da política monetária. É o caso, por exemplo, das áreas agrícola, de energia e saúde.  No entanto, a economista alerta que, se os juros reais (descontada a inflação) permanecerem num patamar elevado o ano todo, a situação fica preocupante e pode levar a dois trimestres seguidos de recuo na atividade econômica.

Marcus Pestana, diretor-executivo da Instituição Fiscal Independente, ligada ao Senado Federal, acredita que ainda é cedo para falar falar em recessão técnica e que há um problema nos sistemas de projeções que erraram nas estimativas para o PIB em 2024. No início do ano passado, o mercado projetava algo próximo de 1,6% e a prévia do Banco Central aponta que houve um crescimento de 3,8% em 2024. Porém, Pestana lembra que a queda da inflação oficial neste início de 2025 foi pontual. “Os dados do BC mostram que os núcleos da inflação subiram, apesar da queda no índice geral”, argumenta. Isso significa que inflação está fora da meta e, portanto, deve exigir mais aperto dos juros pelo BC para frear a economia.

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