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A contradição do projeto encabeçado pelo governo Lula para o mercado de capitais

Instituto Empresa, associação civil que defende os direitos de investidores no mercado financeiro, teme que mudança na lei dificulte indenizações no futuro

Divulgação
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Integrantes do governo Lula anunciaram o PL 2.925/23, que tramita na Câmara, como uma forma de mudar as regras do mercado de capitais para proteger acionistas minoritários contra prejuízos causados por controladores ou administradores de companhias abertas. Mas o projeto tem sido acusado por parte do mercado financeiro de ser praticamente o oposto.

A proposta é isentar as companhias de capital aberto de qualquer responsabilidade por atos praticados por seus administradores, como controladores, conselho de administração e conselho fiscal, exceto na hipótese de aquisição das ações no momento da abertura de capital da empresa.

Presidido por Eduardo Silva, o Instituto Empresa tem representado investidores minoritários lesados em casos de fraudes no mercado financeiro. As principais batalhas da entidade hoje envolvem irregularidades contábeis nos balanços da IRB e das Lojas Americanas.

A associação teme a aprovação do projeto piore o quadro atual, em que já é difícil que os responsáveis pelas fraudes sejam punidos. Silva usa o caso das Americanas como exemplo. Ele afirmou que, se o projeto de lei defendido pelo governo já estivesse em vigor, a empresa poderia transferir a culpa e a responsabilidade por indenizar os acionistas lesados aos ex-diretores suspeitos.

Na última semana, a varejista enviou um comunicado ao mercado para informar a abertura de um procedimento arbitral contra quatro de seus ex-diretores acusados de terem provocado fraudes contra a companhia: Miguel Gutierrez, Anna Saicali, Timótheo de Barros e Márcio Cruz.

“Esse projeto de lei vai fulminar qualquer possibilidade de os minoritários exercerem um pleito de indenização diante de fraudes confessas, gritantes e assumidas”, disse Silva à coluna.

Eduardo Silva, presidente do Instituto Empresa

Para ele, o projeto “blinda as empresas”. “Essa arbitragem contra os ex-diretores faz parte desta encenação de que nem a companhia nem os controladores sabiam de qualquer coisa e que, portanto, eles são vítimas da fraude”, disse. “Se existe culpa dos diretores, é uma culpa dispersa, que não exime a responsabilidade da empresa e de seus controladores.”

Por outro lado, o diretor-presidente do Instituto Empresa viu com bons olhos uma decisão inédita do STJ que, conforme mostrou a coluna, abre caminho para responsabilizar empresas de auditoria externa que aprovem balanços de empresas em apuros.

O STJ ordenou que a KPMG fosse responsabilizada por ter aprovado “sem ressalvas” as demonstrações financeiras do Banco BVA. O processo foi movido por uma holding familiar do agro que havia comprado R$ 3,5 milhões em títulos do BVA pouco antes que este sofresse uma intervenção do Banco Central.

“O investidor que compra ações não vai examinar os números da empresa. Ele tem que confiar no que é repassado nos relatórios avalizados pela auditoria externa, que deveria ser independente. Essa cadeia de confiança havia sido rompida com esses casos no mercado financeiro, mas, felizmente, parece que há um movimento de recuperação por meio da Justiça”, disse ele.

Silva, entretanto, se diz cético em relação a punições na esfera criminal no caso Americanas. “Temos um sistema penal extremamente leniente. Portanto, eu acho que ninguém criminalmente será condenado”, disse. “O investidor está constatando, da pior forma, que não existe um sistema de proteção no mercado, que o que nós temos não funciona.”

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