O ministro Luís Roberto Barroso encerrou seu mandato como presidente do STF com um balanço positivo e a mensagem de que a paz e as divergências de ideologias podem e devem andar juntas. “Pacificação não significa as pessoas abrirem mão das suas convicções, dos seus pontos de vista, da sua ideologia”, afirmou Barroso, no seu último discurso no comando do Supremo Tribunal Federal. Emocionado, ele defendeu o papel da corte no momento mais atribulado da atual democracia. Saiu aplaudido de pé pelos presentes no final da sessão.
“Tem a ver com capacidade de respeitar o outro na sua diferença e compreender que quem pensa diferente de mim não é meu inimigo, é meu parceiro na construção de uma sociedade aberta e plural”, opinou.
Barroso falou sobre o “debate recorrente e relevante” com que conviveu no mandato sobre o “chamado protagonismo do Supremo”. Segundo ele, a corte ganhou essa dimensão, “em alguma medida”, devido às “causas bem claras e conhecidas”.
Os três primeiros pontos da origem do “protagonismo”, segundo o presidente do STF, são: a “Constituição abrangente”, com matérias que em outros países estão fora das competências da Corte Suprema, a facilidade de acesso ao tribunal, e o número elevado de atores que podem apresentar pedidos judiciais.
A esses tópicos se somam outros fatores, de acordo com Barroso, como a competência criminal ampla, a judicialização de temas pela política e a incapacidade do Congresso de legislar sobre “determinadas matérias” em um “mundo polarizado”, o que provoca uma enxurrada de casos ao Supremo. “E nós precisamos julgá-los”, afirmou.
No balanço do Judiciário no período de sua presidência, Barroso destacou uma redução de 3,5 milhões de processos no país – total de 80 milhões de ações, nas justiças estadual, federal, do trabalho, militar, eleitoral e nos tribunais superiores.
“O Brasil vive uma epidemia de judicialização difícil de conter”, disse Barroso. Segundo o ministro, 39 milhões de processos entraram nas esferas do Judiciário em 2024, maior número da série histórica. Só nos tribunais superiores foram 889 mil novos processos.
Condenação
O presidente do STF recebeu homenagens dos colegas. O mandato de Barroso foi classificado por seu sucessor, o ministro Edson Fachin, como “o biênio que entra para a história do Judiciário e do Supremo”, uma referência aos processos relacionados à tentativa de golpe de Estado.
Gilmar Mendes o decano da corte, elogiou a gestão e destacou a condenação de Jair Bolsonaro como fato histórico do biênio. O mandato de Barroso foi uma “prova de fogo”, resultado do “maior assalto sofrido pelo STF” na sua história, nas palavras do decano. “Trata-se de um evento raríssimo também em termo mundiais, dado o abalo que o julgamento de tal porte provoca nas instituições”, afirmou Gilmar.
O decano se emocionou ainda ao elogiar o “papel singular” do ministro Alexandre de Moraes, relator dos processos da trama golpista, um “verdadeiro herói”. Também presente, o advogado-geral da União, Jorge Messias, chamou o presidente do STF de um “verdadeiro patriota”.
Na segunda-feira, 29, Barroso “passa o bastão” para Fachin, que assume a presidência do Supremo em meio aos julgamentos dos três núcleos de comando da trama golpista e em fase de recursos do processo principal, que condenou Bolsonaro a 27 anos e 3 meses de prisão.