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A disputa entre bispos da Universal pelo controle do Republicanos

Comando da igreja tenta reverter o domínio do deputado federal Marcos Pereira, atual vice-presidente da Câmara, sobre o partido

Foto: Douglas Gomes / Lid Republicanos
Foto: Douglas Gomes / Lid Republicanos

Vice-presidente da Rede Record entre 2006 e 2011, o deputado federal Marcos Pereira (SP), bispo da Igreja Universal do Reino de Deus, ajudou a emissora a alcançar a vice-liderança no Ibope nesse período. Em 2012, assumiu a presidência do então PRB, o partido político ligado à igreja de Edir Macedo, quando a legenda tinha apenas oito deputados federais.

Hoje, o partido, que passou a se chamar Republicanos, tem 44 deputados na Câmara, quatro senadores, dois governadores (Tarcísio de Freitas, de São Paulo, e Wanderlei Barbosa, de Tocantins) e um prefeito de Capital (Lorenzo Pazolini, de Vitória). Na última eleição municipal, mais do que dobrou o seu número de prefeitos no país: de 216 para 433. O total de vereadores saltou de 2.589 para 4.372.

Em seu primeiro mandato, em 2018, Marcos Pereira virou vice-presidente da Câmara dos Deputados. Reeleito, cresceu e se fortaleceu politicamente. Passou a ter o controle total do partido. Adquiriu voo próprio e lançou-se, inclusive, na disputa pela presidência da Câmara. Recuou depois, mas é um dos principais padrinhos da candidatura do líder do Republicanos, Hugo Motta (PB), que caminha para ser um nome de consenso na disputa, unir o atual presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) e o Palácio do Planalto. Se Motta for o escolhido, Pereira sairá fortalecido.

Nos últimos meses, em círculos próximos à Universal ganharam força informações sobre movimentos que a cúpula da igreja tem feito para retirar Pereira do comando do partido. Edir Macedo, inclusive, teria pedido o cargo.

O distanciamento
O Republicanos, de fato, vem se afastando da igreja. Na última eleição municipal, pastores da Universal concorreram por outros partidos. Foi assim, por exemplo, no Rio de Janeiro. Lá, a Universal apoiou o prefeito reeleito Eduardo Paes (PSD), enquanto o Republicanos se aliou a Alexandre Ramagem (PL).

O pastor Deangeles Percy, coordenador no Rio do grupo Arimateia, criado pela Universal para cuidar da área de formação política da igreja, concorreu a vereador pelo PSD, o partido do prefeito, e não foi eleito. “Estamos caminhando para um lado, e o Republicanos, que hoje é autônomo, para outro”, justificou Percy, antes da eleição.

No Rio, partido não é mais controlado pela Universal. Está nas mãos de três figuras polêmicas. O prefeito de Belford Roxo, Wagner dos Santos Carneiro, o Waguinho, é o presidente estadual da legenda. Também estão lá o ex-deputado emedebista e ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha, ligado à Assembleia de Deus, e o deputado federal Chiquinho Brazão, que ocupou a Secretaria Especial de Ação Comunitária de Eduardo Paes entre outubro de 2023 e abril deste ano, antes de ser preso sob a acusação de ser um dos mandantes do assassinato da vereadora Marielle Franco e de seu motorista, Anderson Gomes.

A partir de 2016, o Republicanos começou, aos poucos, a abrigar candidatos não vinculados à Igreja. Foi uma decisão do partido para conseguir crescer e a estratégia teve o aval de Edir Macedo, segundo um religioso paulista conhecedor dos bastidores do partido.

Dono do partido
Atualmente, entre os seus 44 deputados federais, 17 são bispos, pastores, obreiros da igreja ou apresentadores da TV Record, que pertence a Macedo. Nesse último caso estão, por exemplo, os deputados Celso Russomanno (SP), Fred Linhares (DF) e Amaro Neto (ES).

Marcos Pereira saiu, de certa forma, da sombra de Macedo, o único a quem ainda dá satisfações na igreja sobre as ações do partido. Ele tornou-se, na prática, o “dono” do Republicanos.

Dentro da igreja, porém, o poder acumulado por Pereira passou a gerar ciúmes e inveja, de acordo com o religioso paulista. Pereira mantém boas relações com o bispo Renato Cardoso, casado com Cristiane Cardoso, filha de Edir Macedo, e o segundo nome hoje na hierarquia da Universal. Mas o genro de Macedo estaria incomodado com o seu fortalecimento e prestígio, considerando o seu poder excessivo.

Após se consolidar como o herdeiro de Edir Macedo, Cardoso começou a afastar de funções importantes os bispos mais antigos e influentes da igreja, substituindo-os por religiosos mais novos e de sua confiança. Pereira, que tem um posto cobiçado, seria um dos poucos ainda intocáveis e o herdeiro de Macedo não teria conseguido removê-lo.

De acordo com a mesma fonte, Cardoso gostaria de ver no comando do Republicanos o bispo Alessandro Paschoal, coordenador do grupo Arimateia, criado pela Universal para cuidar da área de formação política. Paschoal hoje é o coordenador político da igreja. Ele costuma aparecer sempre em cerimônia religiosas e em fotografias nas redes sociais ao lado de Cardoso.

Bispo Rodrigues reabilitado
Um ex-pastor da Universal falou ao PlatôBR com a condição de ter seu nome preservado por ter parentes na cúpula da igreja disse que Edir Macedo teve uma reunião no final do ano passado com o ex-bispo e ex-deputado Carlos Rodrigues, que durante anos foi o coordenador político da instituição, e o bispo João Batista Ramos da Silva, também ex-deputado e ex-presidente da Record, para ouvi-los sobre a situação atual do Republicanos.

Rodrigues estaria sendo reabilitado agora e voltando a dar palpites em decisões políticas na Universal, após ter sido afastado da igreja e renunciado ao seu mandato de deputado federal, por envolvimento em escândalos de corrupção. O ex-bispo e ex-deputado foi preso duas vezes por envolvimento nos casos do mensalão e da máfia de venda das ambulâncias, em 2005 e 2006, respectivamente.

Além da disputa interna na igreja, Marcos Pereira, ao tentar se cacifar para a presidência da Câmara, não teve o apoio da bancada evangélica na Casa. Quem detém a hegemonia na bancada é a Igreja Assembleia de Deus – a maior desse segmento no país, com 12,3 milhões de fiéis, contra 1,8 milhão da Universal, segundo o Censo de 2010. Os evangélicos se unem hoje na chamada pauta de costumes, como no combate ao aborto e na oposição à pauta de grupos LGTBQI+, mas costumam se dividir na discussão de outros temas, inclusive políticos.

Divergência de pautas
“O Republicanos (com Marcos Pereira) queimou a largada, se lançou cedo demais (na disputa à presidência da Câmara)”, criticou o ex-presidente da Frente Parlamentar Evangélica, Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), ligado à Assembleia de Deus Vitória em Cristo, do pastor Silas Malafaia.

Ao assumir temporariamente a presidência da Câmara, em setembro do ano passado – em substituição a Arthur Lira, que havia viajado a Nova York para acompanhar o presidente Lula na Assembleia Geral da ONU –, Marcos Pereira contrariou religiosos e políticos conservadores ao fazer acenos a parlamentares de esquerda.

Em campanha naquele momento para a sucessão, Pereira procurava agradar todas as bancadas da casa. Então, pautou no plenário a votação de requerimentos de urgência vindos dos mais diversos partidos, entre eles partidos considerados progressistas, como PT, PSOL e PDT.

Em abril deste ano, ele manifestou apoio à aprovação do PL das redes sociais e ao combate às fake news, durante um evento, em Nova York, do Lide (Grupo de Líderes Empresariais), criado pelo ex-governador paulista João Dória. Foi criticado, então, por parlamentares bolsonaristas, como Gilvan Da Federal (PL-ES), Gustavo Gayer (PL-GO) e Júlia Zanatta (PL-SC). Procurado pelo PlatôBR, Marcos Pereira não se manifestou.

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