Enquanto o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, não reage às negociações feitas por meio dos canais diplomáticos nem às pressões de empresários contra a prometida sobretaxa de 50% sobre as importações de produtos brasileiros, o chamado tarifaço virou motivo de uma acirrada disputa entre políticos de todas as vertentes partidárias. De olho em 2026, eles correm para anunciar providências destinadas a amenizar os possíveis efeitos da medida – ou, prometem alguns, até para revertê-la ou adiá-la.

Nesta quinta-feira, 24, o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), aproveitou o temor criado entre exportadores para anunciar a liberação de R$ 1 bilhão em créditos de ICMS e uma linha de crédito de R$ 200 milhões com juros subsidiados para empresas que podem ser afetadas pelo tarifaço. “Agimos rápido para proteger quem trabalha, quem produz e quem gera emprego em São Paulo. De olho nos possíveis desafios que estão por vir, anunciamos um conjunto de medidas para preservar a operação de cada empresa”, afirmou o governador, que logo após o anúncio feito por Trump chegou a defender publicamente os argumentos apresentados pelo presidente norte-americano como pano de fundo para a medida.

Além de Tarcísio, outros governadores entraram na arena das providências contra o tarifaço. Um dos nomes da direita cotados como possíveis candidatos ao Planalto, assim como o próprio colega de São Paulo, o goiano Ronaldo Caiado (União Brasil) aproveitou uma visita ao Japão para também anunciar a criação de uma linha de crédito com taxas abaixo de 10% ao ano, lastreada em recursos de ICMS, para os exportadores de seu estado. A medida exige, como contrapartida, que as empresas beneficiadas não demitam funcionários.

O governador do Paraná, Ratinho Júnior (PSD), outro que teve o nome cogitado como presidenciável, determinou que a Secretaria da Fazenda do Paraná comece a atender demandas de setores sensíveis às taxações de Trump em seu estado.

Em Brasília, o ministro Fernando Haddad (Fazenda) disse que o governo federal apresentará um plano de contingência para socorrer empresários caso as tarifas entrem mesmo em vigor a partir de 1º de agosto. Ele prometeu levar as propostas ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva na próxima semana. O ministro não deu detalhes, mas antecipou que o plano incluirá linhas de crédito para apoiar os setores mais afetados. “Tem medidas para todo gosto”, disse.

Lula, que tem recebido críticas por não ter buscado conversar com Donald Trump, afirmou nesta quinta que o presidente norte-americano é que não quer conversa. “Ele não quer conversa. Se quisesse conversar pegava o telefone e me ligava”, disse, para em seguida comparar a estratégia de silêncio de Trump a um jogo de baralho. “Eu não sou mineiro, mas sou bom de truco. Se ele estiver trucando, ele vai tomar um 6″, emendou, insinuando a possibilidade de o republicano estar blefando.

Encarregado de liderar as tentativas de negociação, o vice-presidente Geraldo Alckmin, também ministro da Indústria e Comércio, disse nesta quinta que há avanços. A jornalistas, garantiu que os governos do Brasil e dos Estados Unidos mantiveram “conversas reservadas” nos últimos dias e negociaram caminhos para evitar que o tarifaço entre em vigor em 1º de agosto, data anunciada por Trump.

Alckmin falou com o secretário de Comércio dos Estados Unidos, Howard Lutnick. A conversa ocorreu no sábado, 19, por meio de uma videoconferência. “Foi uma conversa longa, de aproximadamente 50 minutos. Destaquei que o presidente Lula tem orientado a negociação, sem contaminação política nem ideológica”, disse o vice.

Caravana de senadores rumo a Washington
Nesta sexta-feira, 25, os membros da Comissão de Relações Exteriores do Senado embarcarão para os Estados Unidos para tentar articular com parlamentares e empresários um diálogo com o governo de Donald Trump sobre o tarifaço. Há previsão de reuniões com deputados republicanos e democratas entre os dias 28 e 30 de julho.

O grupo de senadores é diverso. Tem integrantes de vários partidos. A missão terá os senadores Nelsinho Trad (PSD-MS), que vai coordenar o trabalho, Jaques Wagner (PT-BA), líder do governo no Senado, Tereza Cristina (PP-MS), ex-ministra da Agricultura no governo de Jair Bolsonaro, Marcos Pontes (PL-SP), ex-ministro de Ciência e Tecnologia de Bolsonaro, Rogério Carvalho (PT-SE), líder do PT no Senado, Esperidião Amin (PP-SC), Fernando Farias (MDB-AL) e Carlos Viana (Podemos-MG). Ao PlatôBR, Trad garantiu que a ideia é passar ao largo dos embates políticos sobre o tema e tentar resolver o problema. “Qualquer tentativa de desviar o foco para disputas políticas internas ou pautas que não dizem respeito ao comércio bilateral não terá espaço nessa agenda”, afirmou (leia aqui).

Ao menos publicamente, o grupo tem feito segredo com os detalhes da pré-agenda. O motivo: os senadores não querem alertar e possibilitar uma contraofensiva do deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) no sentido de minar os encontros com autoridades norte-americanas. Na agenda divulgada pela comissão, a parte de reunião com deputados diz apenas que na terça-feira, 29, “a agenda do dia envolve compromissos estratégicos com autoridades norte-americanas” e informa que “a cobertura será realizada exclusivamente pela assessoria de imprensa oficial da missão, com divulgação de fotos, vídeos e conteúdos informativos após a conclusão das atividades”.

A intenção do deputado Eduardo Bolsonaro de atrapalhar o resultado da viagem é real de acordo com um senador de direita ouvido sob reserva pelo PlatôBR. O próprio filho do ex-presidente, em vídeo divulgado nas redes sociais nesta quinta-feira, 24, disse que “ainda há senador que acha que vai vir aos Estados Unidos e vai resolver essa questão só tendo uma boa conversa”. “Nada mais ingênuo”, ironizou.