O físico e engenheiro Ricardo Galvão (Rede-SP) vai assumir a cadeira na Câmara do deputado Guilherme Boulos (PSOL-SP), anunciado como futuro ministro da Secretaria-Geral da Presidência da República. Reconhecido pela trajetória em defesa da ciência brasileira, ele deixa a presidência do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico) para assumir o primeiro mandato na Câmara.
Suplente da federação Rede-PSOL, Galvão ficará poucos meses no cargo, apenas até o retorno ao Congresso das ministras Marina Silva (Meio Ambiente) e Sônia Guajajara (Povos Indígenas), em abril, quando deixam os cargos para disputar as eleições do ano que vem. Em 2019, ele ganhou destaque no noticiário e foi demitido da presidência do INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) por ter confrontado Jair Bolsonaro, que o acusou de divulgar dados “mentirosos” sobre o aumento do desmatamento no Brasil.
Em entrevista ao PlatôBR, o novo deputado adiantou que pretende concentrar sua atuação em duas frentes principais: a proteção das políticas ambientais e o fortalecimento da área de ciência e tecnologia. “Ainda existem projetos na Câmara que podem ser muito prejudiciais ao meio ambiente. Vou atuar com cuidado nessas pautas e trabalhar também pela recuperação do orçamento de ciência e tecnologia”, afirmou. Segue a entrevista:
Quais projetos e pautas do mandato original [de Boulos] o senhor pretende dar continuidade?
Primeiramente, é importante destacar que o período em que vou assumir a Câmara é só por cinco meses, porque em abril retornam a ministra Marina Silva e a própria Sônia Guajajara. Então é um período curto. Eu conversei com o ministro Boulos para ver algumas ações que estão pendentes, ele ainda vai me pautar sobre isso, mas as nossas prioridades são duas principais: a questão do meio ambiente, porque ainda existem projetos na Câmara que podem ser muito prejudiciais ao meio ambiente no Brasil, e a área de ciência e tecnologia. Vou levantar esses pontos com mais cuidado, junto com o secretário-executivo do Ministério do Meio Ambiente, João Capobianco, e atuar fortemente nessas frentes.
Como físico e engenheiro, de que forma essa experiência científica pode influenciar nas suas decisões e nas prioridades como parlamentar?
Em tudo. Eu já comecei a trabalhar fazendo um levantamento principalmente na questão orçamentária de ciência e tecnologia, que recuperamos muito no governo Lula, mas ainda há várias deficiências, especialmente em algumas unidades de pesquisa do próprio MCTI (Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação). Estarei atuando junto à Junta Orçamentária para tentar recuperar um pouco do orçamento da área. Isso vai depender de como eu possa ser inserido em algumas comissões. Também estamos elaborando, em um grupo de trabalho do qual faço parte, a nova Estratégia Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação. Poderei atuar na Câmara para a consolidação dessa estratégia.
Quais medidas o senhor considera prioritárias para a agenda ambiental e de mudança climática no Congresso?
A principal não é criar novas medidas, mas preservar algumas que já existem. A grande preocupação que tivemos recentemente foi com os vetos do presidente Lula em relação ao que foi aprovado na chamada “PEC da destruição”, que permitia várias ações praticamente anulando o nosso programa nacional de meio ambiente. Vamos atuar nesse sentido. Já estou articulando com deputados para trabalharmos na defesa dessas políticas e para que não sejam aprovadas medidas que afetem a política ambiental brasileira. Essa é a prioridade.
Como o senhor pensa em conectar pesquisa e políticas públicas?
Nós já estamos fazendo isso no governo Lula, inclusive com os recursos do Fundo Nacional de Ciência e Tecnologia. Nesse fundo, colocamos inicialmente dez eixos estratégicos, agora são doze, e um deles é chamado política com ciência. Convidamos todos os ministérios a apresentarem propostas de projetos que necessitassem de base científica para a tomada de decisões ou criação de novas medidas. Isso já está em andamento e vamos aprofundar ainda mais. O processo é gradual, mas as decisões governamentais baseadas em evidências científicas já estão sendo implementadas, inclusive com recursos.
Como o senhor pretende equilibrar as pressões políticas e os interesses científicos ao tomar decisões legislativas?
Nas decisões legislativas é preciso articular com o grupo de apoio correto. Vou procurar colegas — já tenho em mente vários nomes que conheço dos três anos em que estive no CNPq — para trabalhar em medidas que preservem o desenvolvimento científico e tecnológico do Brasil. Precisamos avançar para o que chamo de inovação acionada pela ciência. Não podemos mais manter o modelo antigo de importar tecnologia e adaptá-la aqui. Estamos trabalhando para que as empresas brasileiras, com mais doutores em seus quadros, desenvolvam tecnologia própria a partir da produção científica nacional.
Qual vai ser o seu perfil político? Suas parcerias? Como o brasileiro vai poder enxergá-lo no Congresso?
A minha atuação política tem sido muito pequena, começou de fato a partir de 2022. Mas eu me coloco como uma pessoa de centro-esquerda, bem moderada.
