Quem navega em canais, blogs e perfis de redes sociais da internet dos aliados de Jair Bolsonaro, apoiadores e grupos de direita deve ter visto nos últimos dias um alerta com tom de notícia-bomba sobre um “dossiê” com promessa de revelações comprometedoras sobre Alexandre de Moraes. O ministro é o relator dos processos no Supremo Tribunal Federal que podem condenar o ex-presidente por tentativa de golpe de Estado.
O tal “dossiê-bomba” passou a ser replicado aos milhões via internet, após o ex-presidente ir para o banco dos réus em março, mesmo período em que começou a contra-ofensiva política bolsonarista, focada em buscar retaguarda em Donald Trump, nos Estados Unidos.
O material – ou a promessa – passou a engrossar a artilharia anti-Moraes, em busca de uma inédita anistia geral que livraria Bolsonaro e seus aliados dos julgamentos e das sentenças sobre a trama golpista. Na prática, seria como fazer desaparecer integralmente todas as ações penais e inquéritos, com seus acervos de provas.
Mas, afinal, o que é o dossiê e de onde vem? As acusações foram prometidas pelo ex-funcionário do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) Eduardo Tagliaferro. Perito profissional, ele trabalhava em um grupo criado para combate à proliferação de notícias falsas nas eleições de 2022. O órgão foi batizado de Assessoria Especial de Enfrentamento à Desinformação.
Tagliaferro foi alvo de investigação da Polícia Federal aberta por determinação de Moraes, em 2023. O ministro determinou a abertura de um inquérito para apurar a origem de reportagem publicada pelo jornal Folha de S. Paulo, que revelou pedidos de dados e produção de documentos ao órgão de investigação do TSE para abastecer inquéritos sob relatoria de Moraes contra bolsonaristas.
No mesmo ano, o perito foi preso acusado de violência doméstica e demitido do TSE imediatamente. Em abril deste ano a PF concluiu o inquérito e indiciou Tagliaferro por “vazamento” de informação sigilosa com objetivo de alimentar a rede digital bolsonarista com falsas suspeitas sobre o sistema eleitoral.
Nos últimos meses, o perito bombou ainda mais nas redes sociais, impulsionado por postagens, por exemplo, do deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG), que tem 18 milhões de seguidores no Instagram. O parlamentar tentou levar Tagliaferro à Câmara em abril para “esclarecimentos” à Comissão de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara.
Entrevista
Sobre a origem, um dos pontos evidentes é uma entrevista que Tagliaferro concedeu a um blog da rede bolsonarista. A conversa ocorreu, coincidentemente ou não, na mesma semana em que o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, anunciou as sanções econômicas a Moraes. O deputado Nikolas sugeriu a relação entre os dois fatos, a ordem do STF contra Bolsonaro e a divulgação de pedaços do dossiê.
Os dados têm sido espalhados aos poucos. O mais recente foi publicado pela Civilization Works, organização americana que defende ideais liberais. As acusações atribuem a Moraes, entre outras irregularidades, violação da Lei Geral de Proteção de Dados em fatos relacionados aos inquéritos do 8 de Janeiro – o que não é comprovado nem investigado.
Também na segunda-feira, 4, o Banco Central informou ao STF o bloqueio de contas bancárias e cartões de Tagliaferro por ordem de Moraes, em pedido sigiloso. A defesa do ex-assessor pediu ao Supremo acesso à investigação e considera a medida como possível retaliação.