O voo do presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), para São Paulo nesta segunda-feira, 9, precisou ser esvaziado de assessores. Estava pesado demais com os convidados que o acompanhariam na agenda na capital paulista, horas depois da reunião de mais de seis horas com o ministro Fernando Haddad (Fazenda) para tentar fechar um acordo alternativo ao aumento do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras).

Tiveram prioridade no embarque os parlamentares, e Motta aproveitou as horas no avião para fazer com eles um meio de campo. A bordo havia líderes governistas, do centrão e da oposição. Um grupo diverso, semelhante ao leque de partidos que o elegeu presidente da Câmara.

Motta tomou para si o mérito de ter obrigado o governo a negociar com as forças do Parlamento o difícil tema do aumento do imposto. “É importante reconhecer que um debate novo foi inaugurado”, disse o deputado no evento, promovido pelos jornais O Globo e Valor Econômico.

“Se não tivéssemos reagido, eu e o presidente Davi (Alcolumbre, do Senado), representando todo o setor produtivo do país, esse debate não teria sido inaugurado. Tomava-se a decisão do IOF, que estaria valendo, e a gente estaria tratando de outros assuntos, meio sem querer enfrentar aquilo que, na minha opinião, precisa ser imediatamente enfrentado”, disse Motta, que também expôs a falta de norte do Planalto para resolver as contas públicas. “Temos um ano pré-eleitoral que dificulta ainda mais”, apontou.

Comitiva diversa
Entre os convidados de Hugo Motta estavam os deputados Pedro Paulo (PSD-RJ), relator da reforma administrativa, os líderes do MDB, Isnaldo Bulhões (AL), do União Brasil, Pedro Lucas (MA), do PSB, Pedro Campos (PE), do PSDB, Adolfo Viana (BA), além do líder da oposição na Câmara, deputado Luciano Zucco (PL-RS), que esteve de fora das negociações com os congressistas. O deputado Danilo Forte (União Brasil-CE) se juntou ao grupo em São Paulo.

Diante dos colegas, Motta fez questão de se apresentar como mediador do debate, apontando que não há obrigação de se aprovar a proposta do governo. Mas, sutilmente, fez o alerta em relação a possíveis retenções de verbas orçamentárias, ponto que causa temor em deputados e senadores que querem levar recursos para suas bases eleitorais. “Não há (por parte) do Congresso o compromisso de aprovar essas medidas que vêm na medida provisória. A MP será enviada apenas para que, do ponto de vista contábil, não se tenha que aumentar o contingenciamento”, disse.

“O que eu posso aqui garantir é que aquilo que estiver ao nosso alcance para que possamos fazer a reforma mais abrangente possível, do ponto de vista de eficiência, da diminuição do tamanho do Estado e da máquina pública, nós queremos fazer, nós queremos analisar, mas vamos verificar a conjuntura política para aprovar (as medidas)”, disse o deputado.

Sem clima
Para Danilo Forte, não há clima na Câmara para aprovação do pacote do governo neste momento. Ele também aponta um total descompasso entre governo e congressistas, apesar das declarações públicas de Haddad em busca de acordo.

“O Parlamento não foi ouvido”, reclamou Forte. “Houve a reunião na casa do presidente e várias medidas devem ser indicadas ao longo da semana”, disse. “Eu não vejo clima para aumento de imposto. Não há condição. As empresas já estão muito sacrificadas, enfrentando muita dificuldade para pagar suas contas, há um aumento da inadimplência e as taxas de juros estão exorbitantes. Encarecer o crédito em um momento em que se precisa de investimento e fazer emprego é uma complicação muito grande. Em vez de resolver o problema, o governo está aumentando o problema”, disse ao PlatôBR.

O líder do União Brasil no Senado, Efraim Filho (PB), participou da reunião com Haddad na noite de domingo e também aponta dificuldades políticas do governo para enfrentar temas que indiquem cortes de despesas, como o freio nas despesas do Fundeb (o fundo financiador da educação básica no país) e cortes em benefícios sociais.

“O clima da reunião foi de muito diálogo, mas não foi tenso. Creio que o ponto que mais tem consenso será um corte linear nos benefícios tributários, excluindo o que está constitucionalizado, como o Simples, a Zona Franca e a cesta básica, além de novas alíquotas para bets”, disse o senador ao PlatôBR.

Agro
Em outra frente, representantes do agronegócio se reuniram nesta segunda-feira, 9, e torpedearam o novo plano de Haddads. O deputado Pedro Lupion (PP-PR), presidente da FPA (Frente Parlamentar da Agropecuária), disse que o governo está criando mais um problema ao propor o fim da isenção de Imposto de Renda para as LCAs (Letras de Crédito do Agronegócio). “Eles (governo) sabem que não têm como aceitar isso, sabem o tamanho do prejuízo para o setor que carrega nossa economia. Nós não vamos nos calar”, disse o parlamentar.

A senadora Tereza Cristina (PP-MS) argumentou que as propostas da equipe econômica indicam que a prioridade não está na redução de gastos, mas sim no crescimento da arrecadação. Atualmente, as LCAs são isentas de IR, mas passarão a ser tributadas em 5% se a MP a ser editada pelo governo for adiante. 

Oposição
O mesmo argumento foi usado pelo líder do PL na Câmara, Sóstenes Cavalcante (RJ). Em nota, ele classificou a sinalização de Haddad em relação à taxação das LCAs como “moralmente injusta e economicamente destrutiva”. “O governo troca imposto por imposto”, criticou.

Para esta terça-feira, 10, o deputado Zucco, líder da oposição, chamou uma reunião emergencial com o objetivo de preparar a reação no Congresso e condenou a falta de “clareza do que vai ser feito”. “Dizem que vão ter alguns recuos relacionados ainda à pauta do IOF, mas estamos vendo essa alternativa como, mais uma vez, querer receita e não querer corte, querer recurso mas não querer sanar os problemas que o Brasil tem”, disse.

“Eu não tenho dúvida de que, se não tivermos uma medida provisória que realmente tenha um mínimo de entendimento para arrecadar com cortes de gastos, nós vamos votar contra e vamos trabalhar para que o governo realmente traga alguma pauta positiva para o Congresso”, anunciou.