CIDADE DO VATICANO - O período de nove dias de luto pela morte do papa Francisco ainda não terminou, mas o clima de conclave já toma conta do Vaticano e de Roma. Todos os 135 cardeais que participarão da escolha do novo papa têm se encontrado diariamente nas chamadas congregações gerais, encontros durante os quais foram definidos os detalhes do funeral do pontífice morto e que, agora, servem para preparar o processo de sucessão.

Todos os dias, às 9 horas da manhã, os cardeais se reúnem na Sala Paulo VI, um grande auditório com capacidade para 6 mil pessoas situado do lado esquerdo da Basílica de São Pedro. Se até o dia do sepultamento de Francisco não se falava abertamente da eleição do novo papa, após o enterro o assunto passou a ser esse.

Nesta segunda-feira, 28, o Vaticano finalmente anunciou que o conclave terá início no próximo dia 7 de maio. O anúncio foi feito em uma entrevista coletiva. Apesar de ainda faltar mais de uma semana, muitos cardeais já começaram a se guardar e têm evitado falar com jornalistas, individualmente. Os sete brasileiros seguem essa linha e têm procurado se comunicar preferencialmente entre si e com outros religiosos.

As congregações servem para definir questões práticas, como a data de início do conclave e o sorteio dos aposentos na Casa Santa Marta, onde os cardeais deverão ficar hospedados durante o processo de escolha do sucessor de Francisco. Mas não é só. São uma oportunidade, também, para discussões mais abrangentes, que devem até definir a escolha do novo papa, como a postura que a Igreja Católica deve adotar diante das transformações do mundo moderno.

"É também um momento em que os cardeais vão se conhecendo. Trata-se de uma eleição sem candidatos, onde todos que podem votar também podem ser votados", diz o padre Carlos Augusto Azevedo da Silva, da Arquidiocese do Rio de Janeiro, doutorando em Direito Canônico na Pontifícia Universidade Gregoriana, em Roma.

Neste domingo, 27, os cardeais-eleitores chegaram em fila, todos vestidos de vermelho, para uma missa na Basílica de Santa Maria Maggiore, na região central da Roma, onde Francisco foi sepultado. Entraram e saíram sem dar entrevistas. Embora, em tese, todo homem católico possa ser eleito papa, é desse grupo de 135 que sairá o novo pontífice.

Por enquanto, não há isolamento, mas a partir do início do conclave os cardeais ficam proibidos de ter contato com o mundo exterior. Uma vez sorteados os quartos, cada um fica em seu aposento na Casa Santa Marta, que se assemelha a uma pousada, com quartos e refeitório - foi lá, aliás, que Jorge Mario Bergoglio viveu desde que se tornou papa, renunciando os luxuosos aposentos do Palácio Apostólico. Iniciado o processo de eleição, os cardeais deixam de ter acesso até mesmo a telefones celulares ou jornais.

As votações se dão na Capela Sistina, sob o imenso afresco do Juízo Final, de Michelangelo. São repetidas o quanto for preciso até que um dos cardeais tenha dois terços dos votos mais um. "A votação é um ritual. Os cardeais vão para a Capela Sistina cantando a Ladainha de Todos os Santos, também conhecida como Prece Litânia, e depositam seus votos", lembra o padre.

A ladainha é uma oração de invocação à Santíssima Trindade, pedindo a intercessão da Virgem Maria, dos anjos e dos santos para a escolha. Ao final do ritual, se a maioria necessária não tiver sido alcançada, os votos são queimados e a chaminé localizada acima da capela expele a tradicional fumaça negra - que, se no passado era produzida com o uso de betume, nos dias atuais fica negra graças a um corante especial. Se a fumaça da chaminé sai na cor branca, é o sinal máximo de que finalmente há um novo papa.

A Capela Sistina, um dos principais destinos dos turistas que viajam a Roma e vão conhecer o Vaticano, já está fechada para o público e só será reaberta após o conclave.

Rotina simples
Apesar da suntuosidade do Vaticano, a Casa Santa Marta não guarda o mesmo luxo. A casa era, tradicionalmente, um lugar para hospedar padres e bispos que trabalham em Roma ou que moram em outros lugares e vêm à cidade a trabalho. Ganhou fama, porém, depois que Francisco a escolheu como sua residência. Por lá, ele costumava até fazer refeições no mesmo bandejão - "tavola calda", em italiano - disponível para os hóspedes em geral.

Refeições especiais, só em casos excepcionalíssimos. "Só se a cozinheira estiver inspirada", brinca o padre Carlos Augusto, ao ser lembrado das cenas do filme Conclave, um dos finalistas da edição deste ano do Oscar. "É comida rotineira mesmo, uma massa, carne, verdura", diz. O café da manhã não vai muito além da consagrado dupla "cornetto e cappuccino".