No final da década de 1970, a oposição à ditadura fez campanha por uma “anistia ampla, geral e irrestrita” para os presos e exilados políticos. O movimento foi vitorioso e, em 1979, o Congresso aprovou o perdão aos perseguidos pelo governo militar. Nesta semana, aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro elaboraram uma proposta que tem o mesmo sentido, mas para beneficiar os condenados pela tentativa de golpe de Estado.

Uma minuta de projeto de anistia que circula no Congresso pode beneficiar Bolsonaro, aliados e participantes dos atos do 8 de Janeiro, incluindo crimes investigados desde o início do inquérito das fake news, em março de 2019. O texto prevê o perdão de condenações, o arquivamento de processos e o fim de restrições como inelegibilidade e medidas cautelares, incluindo a tornozeleira eletrônica.

A proposta, ainda não protocolada oficialmente, está sendo discutida entre líderes da oposição e do Centrão na Câmara. O texto abrange manifestações verbais ou escritas em qualquer canal — redes sociais, órgãos públicos, meios de comunicação ou vias públicas — incluindo ofensas a instituições, descrédito ao processo eleitoral, polarização política e produção de desinformação. Também alcança crimes associados, como apoio logístico ou financeiro a protestos, dano ao patrimônio público, organização criminosa e milícia privada.

O texto determina ainda que todas as inelegibilidades já declaradas ou que venham a ser declaradas pela Justiça Eleitoral sejam anuladas, o que abriria caminho para que Bolsonaro e outros punidos voltassem a disputar eleições.

Além disso, qualquer condenação penal seria anulada, com arquivamento de inquéritos, investigações e processos em curso, e as medidas cautelares, multas e restrições de direitos seriam suspensas. Movimentos de rua, como acampamentos em frente a prédios militares e a depredação dos prédios dos três poderes em Brasília em 8 de janeiro de 2023, também estariam incluídos na abrangência da anistia.

O tema ganha atenção enquanto o Supremo Tribunal Federal julga o “núcleo crucial” da trama golpista, do qual faz parte Bolsonaro, réu por cinco crimes, cujas penas somadas podem chegar a 43 anos. Ministros da corte avaliam que uma anistia dessa natureza poderia ser considerada inconstitucional por tentar perdoar crimes contra a democracia.

Esta semana, o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), teve reuniões com o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), e com os presidentes do PP, senador Ciro Nogueira (PI), e do Republicanos, Marcos Pereira, para tratar do tema. Os três são favoráveis à anistia, Apesar das pressões do Centrão e dos bolsonaristas, Motta ainda não decidiu levar a proposta para votação no plenário.

Embora o texto ainda esteja em negociação e sem consenso, líderes da Câmara seguem ajustando a minuta, enquanto o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), estuda uma proposta alternativa, mais restritiva, que também não foi formalizada.