Para além da contabilidade dos prejuízos na compra e venda de mercadorias e serviços entre países, a guerra comercial deflagrada por Donald Trump pode fragilizar a atuação dos bancos centrais para desinflacionar as economias. As medidas adotadas pelo governo dos Estados Unidos e as reações do resto do mundo criam um ambiente que: i) amplia incertezas; ii) dificulta projeções; iii) desequilibra os preços dos ativos; e iv) afugenta investidores. Como nada mais parece ser certo, a taxa de juros, principal instrumento dos BCs para controlar os preços, perde a potência.
Não à toa, ao participar de uma conferência com economistas e investidores nesta sexta-feira, 4, Jerome Powell, presidente do Fed, o BC dos Estados Unidos, declarou que a política monetária navega por terrenos incertos e que é cedo para dizer qual é a postura monetária adequada numa das maiores potências mundiais. As bolsas de valores no mundo inteiro derreteram e o temor de a inflação escalar pelos quatro cantos e a atividade econômica desabar se espalhou pelo planeta.
Para a equipe econômica do governo brasileiro, o momento requer muita calma para avaliar o quanto da alta da inflação e da desaceleração esperada para os Estados Unidos irá se esparramar pelos continentes após as retaliações já anunciadas e as que podem vir.
A China anunciou tarifas no mesmo montante imposto pela gestão Trump e decidiu impor controles sobre a exportação para os Estados Unidos de terras raras - insumos difíceis de encontrar no mundo e que servem de base para produção de chips para celulares, computadores, cartões e outros produtos tecnológicos. O governo chinês também colocou onze empresas americanas numa lista de negócios não-confiáveis e que, portanto, ficarão proibidas de exportar, importar ou investir no país.
É claro para os técnicos que as reações das economias atingidas pelo tarifaço de Trump, sobretudo na Europa e na Ásia, poderão desencadear novas ações dos Estados Unidos e o saldo esperado desses movimentos poderá ser pobreza coletiva.
Técnicos argumentam que o mundo vive, agora, uma forte ruptura e, em momentos assim, os parâmetros mudam. Primeiro, consumidores e empresários perdem a confiança no futuro. E se não há confiança no futuro, medidas para estimular ou retrair economias têm menor eficácia.
A política monetária depende muito do comportamento do sistema bancário, que costuma ser mais cauteloso em períodos de grande incerteza, já que os setores da economia podem ser atingidos de maneiras diferentes numa crise como a que parece despontar no mundo pós-Trump.
Dependendo da gravidade dessa crise a partir da guerra comercial desencadeada nesta semana, choques externos podem desarrumar a dinâmica da economia, criando novas realidades que a política monetária não está preparada para tratar. Isso, claro, além de abalar a confiança nas instituições e, por vezes, exigir estímulos fiscais. Por enquanto, é cedo para dizer o caminho que o mundo tomará.