As mudanças que queremos, a política e a mobilização popular
Na noite de 1º de outubro de 2025, a Câmara dos Deputados aprovou por unanimidade (493 a 0) o texto-base do PL 1.087/2025, que isenta do Imposto de Renda (IR) quem recebe até R$ 5 mil por mês e concede desconto para rendas até R$ 7.350,00. O projeto, de autoria do Executivo, segue agora para análise do Senado e inclui compensação com um patamar mínimo de 10% de IR para contribuintes de altíssima renda. A votação ocorreu no mesmo dia em que movimentos sociais estiveram no Planalto para entregar mais de 1,5 milhão de assinaturas em apoio à medida.
Esse episódio deixa uma lição simples. Mobilização funciona quando tem objetivo, linguagem direta e constância. Petições, atos, campanhas nas redes e, principalmente, diálogo com representantes viabilizam a mudança. É relativamente comum ouvir que “nada muda” ou que “tudo já está decidido” ou que “política não serve pra nada”. Esse tipo de descrença facilita a vida de quem prefere que tudo fique como está. Mas afastar-se do jogo político não é assumir neutralidade. É abrir espaço para que poucos decidam por muitos (e na grande maioria dos casos, esses poucos decidirão em benefício próprio).
A política é o espaço de decisão com regras, controle público, possibilidade de ajustes. Justamente por envolver debate e voto, a política nos permite corrigir os rumos. A decisão da Câmara de ampliar a faixa de isenção do IR não surgiu do nada. Ela foi empurrada por associações, sindicatos, coletivos, influenciadores. Quando essas e outras vozes se organizam em torno de uma pauta clara e repetem a mensagem com persistência, o sistema político responde. Já avançamos na isenção do IR, amanhã podemos avançar no fim da escala 6×1, na taxação sobre heranças, na proteção de serviços essenciais.
Para quem sente que “a política cansa”, vale lembrar: sem política, sobra o autoritarismo. Com política, existe participação. A isenção ampliada traz um alívio a parte dos contribuintes e, ao mesmo tempo, mostra que a cidadania ativa pode interferir naquilo que parecia ser um universo distante, alheio à realidade da população brasileira. Mas se quisermos transformar essa conquista na primeira de muitas, precisamos manter o tema vivo nas conversas do trabalho e do bairro, monitorar o andamento das próximas etapas, registrar compromissos em público, reconhecer quem vota ao nosso favor ou contra nós, para que, nas eleições, possamos recompensar o compromisso e a coerência e punir o oportunismo e o corporativismo.
Fillipi Nascimento é cientista Social. Doutor em Sociologia pela Universidade Federal de Pernambuco. Pesquisador do Núcleo de Estudos Raciais do Insper
Os artigos publicados nesta seção não refletem, necessariamente, a opinião do PlatôBR.