Mais do que dividir a responsabilidade do Executivo com o Legislativo, o governo quis transferir a culpa pelas mazelas orçamentárias para o Congresso. Essa leitura de deputados sobre as declarações do ministro Fernando Haddad (Fazenda) no final de semana, de que “Jair Bolsonaro terceirizou o governo para o Congresso” e que, hoje, há “um quase parlamentarismo” onde “quem dá a última palavra” sobre questões fiscais “é o Congresso”, movimentou o domingo do presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB).

Depois de vários telefonemas de colegas da oposição e da base de apoio de governo, ele resolveu jogar para sua plateia e se posicionar. Na segunda-feira, 26, Motta afirmou, por meio das redes sociais, que o governo “não pode gastar sem freios e depois passar o volante para o Congresso segurar” e que “o Brasil não precisa de mais imposto”.

O climão entre os dois, no entanto, parece ser algo mais fácil de administrar do que o desgaste para o governo com mais esse imbróglio em torno das medidas da equipe econômica. Com uma relação absolutamente amistosa com Haddad, Motta, ao responder às declarações do ministro da Fazenda, segundo apurou o PlatôBR, não pensava em derrubar o decreto que eleva o IOF sobre várias operações, entre elas, o crédito para empresas e a aplicação de recursos de fundos de investimento no exterior. Essa última foi revogada após a equipe econômica avaliar o potencial do estrago no mercado de câmbio. Mas as demais mudanças seguem valendo.

A oposição, porém, pegou a deixa e se movimenta para tentar derrubar toda a mudança no imposto no Congresso. Mas o governo acredita ter uma carta na manga: avançar sobre o valor destinado para emendas parlamentares. Mesmo assim, fontes do governo argumentam que essa era uma pendenga “dispensável”.

Nas contas preliminares de Haddad no final da semana passada, o recuo no aumento do IOF para aplicações de fundos no exterior teria um impacto “residual” de cerca de R$ 2 bilhões, dos R$ 20,5 bilhões que o governo estima que arrecadará a mais em 2025 com as mudanças anunciadas no imposto. Sem essa arrecadação adicional, a equipe econômica precisará elevar, no mesmo montante, o contingenciamento divulgado de R$ 31,3 bilhões.

Com esse volume atual de corte de gastos para 2025, o secretário de Orçamento, Clayton Montes, estimou um bloqueio proporcional de algo em torno de R$ 7,8 bilhões nas emendas parlamentares, cerca de 25%, conforme prevê a lei orçamentária. Se o governo tiver que elevar o contingenciamento para quase R$ 52 bilhões, o corte nas emendas, seguindo a lógica do secretário, poderá subir para alto perto de R$ 13 bilhões.

O problema é que, mesmo que escape de uma derrota no Congresso, o governo ainda ficará na defensiva nas redes sociais, onde a figura do ministro Haddad é associada a uma “fúria arrecadatória”  e rende memes desde o início do ano passado. E alta de impostos é sempre algo que ajuda a derrubar a popularidade do governo.