Uma economia em expansão com taxa de desemprego estabilizada e muita incerteza se esse cenário será revertido a partir da nova política tarifária do presidente dos Estados Unidos. Resultado: apesar da pressão por redução dos juros, o Fed, o banco central americano, manteve inalterada a taxa de juros, na faixa de 4,25% e 4,5% ao ano. As incertezas econômicas aumentaram ainda mais desde a última reunião, justificou o presidente Jerome Powell (Fed).
Por aqui, apesar do choque de juros, a atividade econômica continua forte, com alta generalizada de preços, expectativas desancoradas, desemprego na mínima histórica e a mesma incerteza do Fed. A lógica que pesou nas análises de Powell e sua equipe também se aplicou para Gabriel Galípolo e os demais diretores do Banco Central que integram o Copom, o comitê que define a trajetória dos juros no Brasil, com uma diferença de horas. Com isso, a taxa Selic subiu 0,5 ponto percentual no Brasil, alcançando 14,75% ao ano, o mesmo patamar de quase 20 anos atrás, em julho de 2006.
A semelhança entre o comportamento dos dois BCs vai além. O medo de se comprometer em um cenário de difícil projeção deixou em aberto, nas duas instituições, qualquer sinalização para a próxima reunião. No Brasil, ela acontecerá nos dias 17 e 18 de junho, antes, portanto, do fim da trégua de 90 dias dada pelo presidente Donald Trump na guerra tarifária com a maior parte do mundo. Esse prazo só encerra no início de julho.
Nesse meio tempo, negociações entre os Estados Unidos e a China e, também com a Europa, podem mudar todo o cenário econômico mundial, para o bem ou para o mal. Um agravamento da tensão comercial entre as maiores economias do mundo poderá levar a uma recessão global. Essa expectativa ganhou força nas avaliações de especialistas nas últimas semanas e alimentou a pressão por cortes nos juros nos Estados Unidos e por uma desaceleração no ciclo de alta no Brasil. Por outro lado, uma solução para o conflito desencadeado pela política protecionista americana poderá retomar, pelo menos parcialmente, a normalidade.
"Inflações elevadas"
O recado que veio dos dois BCs foi que os dados ainda não mostram o caminho que o mundo deve seguir. Ao contrário, a dúvida sobre o impacto final da política tarifária dos Estados Unidos só cresceu. Galípolo e sua equipe ao justificar mais uma alta de juros enfatizaram que “o cenário segue sendo marcado por expectativas desancoradas, projeções de inflação elevadas, resiliência na atividade econômica e pressões no mercado de trabalho”. E afirmam que isso requer “uma política monetária em patamar significativamente contracionista por período prolongado para assegurar a convergência da inflação à meta.”
Ao olhar para a frente, porém, eles apontam riscos presentes no ambiente econômico que podem fazer a inflação no Brasil subir ou cair, e destacam que, além das dúvidas sobre desdobramentos da conjuntura externa, há ainda detalhes domésticos que pesam, como a política e gastos do governo. Por exemplo: se as expectativas em relação à inflação futura seguirem em alta como está atualmente, os preços dos serviços seguirem sendo reajustados e o real se desvalorizar em relação ao dólar, o quadro inflacionário no Brasil vai piorar, exigindo atuação do BC para frear a economia e segurar os reajustes de preços.
Por outro lado, se o ritmo de crescimento desacelerar no Brasil e no resto do mundo, a política fiscal do governo contribuir para a valorização do real e para melhorar as expectativas do mercado financeiro em relação ao futuro, e o preço de produtos importantes negociados internacionalmente (as chamadas commodities) caírem, tudo isso pode ajudar no processo de desinflacionar a economia.
“Os riscos para a inflação, tanto de alta quanto de baixa, estão mais elevados do que o usual”, alertam os diretores do BC. E, com isso, eles se mantêm em cima do muro: “Para a próxima reunião, o cenário de elevada incerteza, aliado ao estágio avançado do ciclo de ajuste e seus impactos acumulados ainda por serem observados, demanda cautela adicional na atuação da política monetária e flexibilidade para incorporar os dados que impactem a dinâmica de inflação.”