O ministro do STF Edson Fachin quebrou o costumeiro silêncio para externar sua “apreensão” diante do cenário e dos riscos à democracia e ao Judiciário. A posse do presidente eleito do Supremo Tribunal Federal será no final de setembro, mesmo mês em que Jair Bolsonaro e outros 33 réus acusados de encabeçarem a trama golpista serão julgados. O mais reservado dos onze ministros da corte tem transparecido nas últimas semanas preocupação com a possibilidade de tumultos e atentados ao Judiciário.

“Vivemos tempos de apreensão, com tentativas de erosão democráticas e com ataques à independência judicial na América”, disse Fachin no início da semana. A fala curta e direta em evento do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) foi um recado para bolsonaristas e um alerta com a escalada de ataques ao Supremo. “Temos à nossa frente o dever de dar efetividade aos compromissos assumidos soberanamente pelo Brasil.”

Fachin foge das polêmicas que têm colocado seus colegas cada vez mais diante de microfones e câmeras fora do tribunal. Até o momento ele evitou engrossar o coro de colegas da corte em apoio a Alexandre de Moraes. O relator dos processos que encurralaram Bolsonaro será o vice-presidente do STF, fator visto como fonte de mais tensionamento sobre o mandato. A posse atual presidente, ministro Luís Roberto Barroso, passa a cadeira ao sucessor no dia 29 de setembro.

Fachin e Mores foram eleitos nesta quarta-feira, 13, para dois anos de mandato. Chamado de “garantista”, de “punitivista” e até de “petista”, o futuro comandante do STF já esteve no centro das pressões políticas. Em 2022 foi presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) e defendeu “as regras do jogo” duramente e criticou o “populismo autoritário”, “distorções factuais” e “teorias conspiratórias” como riscos à democracia. Foi também quando carimbou o bordão “máximo de eficiência e mínimo de ruído”, um dos poucos que ele arrisca e que e serve para definir a marca que quer imprimir para seu mandato.

É até comum que pessoas que o cercam o descrevam como alguém de perfil comedido, avesso a embates acalorados – o que não é mentira, mas também está longe de ser indicativo de fraqueza. O jeito de professor de cidade do interior, de poucas-palavras e avesso à badalações e viagens internacionais com colegas de toga, engana. Fachin foi alvo de ataques antes mesmo de sentar na cadeira de ministro.

Sabatina de 12 horas
Indicado para o Supremo em 2015 pela então presidente Dilma Rousseff (PT), ele enfrentou uma sabatina de 12 horas no Senado e não se furtou ao enfrentamento nem recolheu-se ao silêncio, quando foi chamado de “ex-petista que virou ídolo da direta” – vale registrar que a “direita” citada refere-se aos apoiadores da Operação Lava Jato, não a aliados de Bolsonaro, que era só um deputado militar desconhecido e de ideias radicais naquele fase. 

Gaúcho de nascimento e paranaense de coração, Fachin foi advogado antes de virar ministro, professor da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e um dos mais respeitados juristas do Direito Civil. Tanto Barroso como ele foram indicados ao STF no governo Dilma. Em 2022 ao assumir o TSE, no lugar do atual presidente do Supremo, a transição fluída e sem transtornos era para ser uma prévia da atual troca de comando no STF.

Do ponto de vista interno e administrativo, tudo vai bem. Equipes destacadas pelos dois trabalham desde o início do ano juntas na transição. À frente do STF, a expectativa é que o ministro enfatize a integração com cortes constitucionais da América Latina, busque destaque para temas relacionados aos direitos humanos e, principalmente, tire a corte dos holofotes e, quem sabe, deixar de ser alvo dos ataques políticos.