Há um mundo financeiro novo que avança numa velocidade maior do que a regulamentação do governo consegue alcançar. De olho nas brechas que se abrem com o avanço de serviços e produtos digitais, o Banco Central quer aumentar o seu poder de supervisão e regulação. O presidente da instituição, Gabriel Galípolo, vem plantando essa semente para, quem sabe, colher frutos no curto prazo.
O BC e o Ministério da Fazenda aprenderam que nem sempre é fácil atualizar normativos. Este ano, a Receita Federal criou uma grande polêmica envolvendo o Pix simplesmente por querer ajustar uma portaria sobre as informações que as instituições financeiras e as instituições de pagamentos devem enviar para o órgão. “Havia um vácuo. Quando a regra foi feita não havia instituições de pagamentos e era preciso atualizar a norma”, afirma uma fonte com conhecimento do tema.
Mais recentemente, a fiscalização do BC se deparou com uma situação inédita: um ataque hacker a uma instituição não bancária, mas que fornece a infraestrutura necessária para a oferta de serviços financeiros por terceiros, levou cerca de R$ 800 milhões da conta de reserva da empresa, no sistema de pagamentos instantâneo do Pix, junto ao Banco Central.
Para Galípolo, se no final o paciente vai bater na porta do pronto-socorro dele, é bom que o BC possa supervisionar e dar orientações para o bom funcionamento. Com isso, a autoridade monetária quer ampliar seu perímetro de atuação e avançar na supervisão, por exemplo, de empresas não bancárias que prestam alguns serviços bancários. O discurso do presidente do BC em interações com deputados tem reforçado essa necessidade.
A desconcentração da oferta de serviços financeiros, para o governo, é um caminho sem volta. Foi o que permitiu democratizar o atendimento e gerar competitividade. Os avanços pretendidos com o PIX também conversam com esse modelo. Depois do ataque hacker da última semana, o BC decidiu apertar o controle e até proibiu cerca de seis empresas de atuarem com Pix, mas essa é uma atuação pontual. O foco da autoridade monetária é aumentar o poder de fiscalização do órgão em vez de restringir participantes.
Em eventos com parlamentares nos últimos dias, Galípolo insistiu nesse caminho. Mudanças nessa área foram incluídas na lista de pequenas reformas necessárias para desobstruir o mercado e permitir maior sensibilidade da economia real à alteração na taxa de juros referência para economia, a Selic. Avançar com a infraestrutura financeira que permita à população acessar linhas de crédito mais adequadas às necessidades de cada brasileiro é uma delas. E, nesse caso, mesmo que algumas mudanças não precisem de aval do Congresso, será preciso, pelo menos, melhor entendimento dos parlamentares para evitar disputas nas redes sociais que inviabilizem as alterações que o BC quer, como aconteceu com PIX.