O seminário do PT sobre segurança realizado no Rio de Janeiro nesta semana e o documento lançado pelo partido com as diretrizes para a área expõem um problema – ainda sem solução – para petistas e para os candidatos do partido nas eleições de 2026: o enfrentamento à criminalidade.

A legenda tem encontrado dificuldades para encontrar um ponto ideal no discurso sobre o tema, especialmente diante de um quadro demonstrado por pesquisas em que parte do eleitorado aprova ações policiais com grau de letalidade elevado. O desafio interno do PT é alcançar esse ponto sem colocar as bandeiras históricas do partido em xeque.

Reunidos por dois dias em um evento no hotel Windsor Guanabara, parlamentares, dirigentes do partido, gestores e especialistas debateram o problema da violência e as políticas públicas de enfrentamento ao crime organizado. O seminário “O PT e a Segurança Pública” foi promovido pela Fundação Perseu Abramo, ligada ao partido, e serviu para o lançamento oficial das primeiras diretrizes petistas para a área nas eleições 2026.

Bandido morto
O encontrou ganhou destaque por um bate-boca entre um dos vice-presidentes nacionais do PT, Washington Quaquá, e outros petistas. Na tarde desta terça-feira, 2, Quaquá defendeu a ação das polícias do Rio no complexo do Alemão, no final de outubro, que deixou 121 mortos. Ele classificou as vítimas de “bandidos”.

Prefeito do município fluminense de Maricá, o vice petista é defensor de uma atuação mais “linha-dura” no combate ao crime, ideia que incomoda a maioria dos dirigentes partidários. “É óbvio que a polícia do Rio, o Bope, só matou ali otário, vagabundo, bandido”, afirmou. O prefeito disse ter questionado o governo Castro. “Eu perguntei: ‘Tem trabalhador aí?’. Não. Tudo bandido”, completou.

“Mentira”, gritaram. “Era pedreiro e foi degolado, decapitado. Você está falando mentiras!”, protestou uma correligionária. Quaquá respondeu e a confusão estava formada. “Você vai ouvir eu falar ou vai ficar berrando? Então, era tudo bandido. Eu ouço bobagens à vontade. Espero que na democracia se ouça as bobagens dos outros. Eu ouço a de vocês, valeu? E depois querem dizer que são de esquerda e democráticos, mas só ouvem a própria opinião.”

Contradição
A exposição das divergências internas deixou evidente a dificuldade de se tratar do assunto. Ao mesmo tempo, mostrou que o partido tende a rejeitar o discurso do “bandido bom é bandido morto”, defendido por Quaquá e aceito por fatia importante do eleitorado. Tanto o documento lançado no evento com as diretrizes para o partido quanto o discurso do presidente nacional do PT, Edinho Silva, evidenciaram essa tendência.

O documento “Brasil Seguro, Família Protegida” foca no combate ao crime na “não violência”, com aposta no uso de inteligência policial para enfrentar a criminalidade – um discurso de aderência incerta no eleitorado, mas que encaixa no ideário petista. O material foi elaborado pelo partido de olho em 2026 e no movimento da direita de apostar no debate sobre segurança.

Ao discursar, Edinho enfatizou a necessidade de tratar do tema sem se render às teses que afrontam defesas históricas do petismo, como direitos humanos, garantia dos direitos das minorias e condenação da violência. “Nós queremos uma política de segurança pública, mas nós não podemos bater palma para 121 corpos negros estirados no chão”, afirmou o presidente do partido, em referência à ação no complexo do Alemão. O discurso de Quaquá, que veio depois, foi uma resposta às declarações de Edinho, a quem o prefeito de Maricá se opôs na disputa pelo comando nacional do partido, meses atrás.