NOVA YORK – Enquanto o Banco Central vê sinais de desaquecimento na economia, fruto da alta dos juros, a Fazenda poderá revisar para cima, nos próximos dias, a previsão de crescimento deste ano. Os dados da produção industrial divulgados na semana passada pelo IBGE foram considerados “muito positivos” pelo secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Dario Durigan (no centro da foto em destaque). Em conversa com o PlatôBR em Nova York nesta terça-feira, 13, ele disse que, a partir dos encontros com empresários recentemente, a previsão para 2025 pode ser revisada para “mais do que os 2,3%” atuais.

Nos próximos dias, a equipe econômica deverá divulgar a nova estimativa do PIB brasileiro, que serve de base para elaboração do relatório bimestral, com avaliação de receitas e despesas orçamentárias. A avaliação de Durigan é compartilhada por parte do empresariado, políticos e autoridades que cumprem agenda oficial em Nova York esta semana e se revezam em uma série de eventos para debater perspectivas para a economia brasileira.

Isso, apesar de o BC ter destacado, também nesta terça-feira, 13, na ata da última reunião do comitê que define o rumo dos juros no país (Copom), que a alta da taxa Selic, referência para a economia, já está produzindo efeito na desaceleração da economia. Durigan foi um dos convidados em evento promovido pela CNI (Confederação Nacional das Indústrias), em parceira com o Financial Times, para tratar da atração de investimentos para que o Brasil possa liderar a transição para uma economia verde, com baixa emissão de carbono.

Durante o evento, ele conversou com o PlatôBR e falou ainda dos desafios para o país atrair investimentos, fortalecer a indústria e agregar valor aos produtos brasileiros. Acrescentou que o governo aguarda nova janela de oportunidade para emitir títulos atrelados ao financiamento de projetos nessa área, e disse também que as críticas à política fiscal do governo combinam um pouco de ansiedade e falta de entendimento. O secretário-executivo defendeu ainda o ressarcimento dos aposentados e beneficiários do INSS lesados por fraudes.

Abaixo um resumo dos principais temas abordados na conversa:

Desafios para o Brasil atrair investimentos, fortalecer a indústria, agregar valor aos produtos e promover desenvolvimento
“Em primeiro lugar, temos que ter estabilidade institucional, em segundo, estabilidade macroeconômica. Sem isso não adianta a gente querer a avançar em outras frentes. A gente tem que ter segurança jurídica e inteligência nas políticas industriais. Temos feito uma série de políticas que dialogam com o cenário doméstico e abrimos o país, oferecendo instrumentos para que investidores externos participem no mercado brasileiro. Temos dialogado muito com as forças produtivas locais. Os juros são o grande ponto de reclamação dos industriais. As variações cambiais são um ponto de dificuldade que temos endereçado dentro do programa Ecoinvest. Alguns projetos que atendem os requisitos socioambientais são tratados como prioridade e podem receber uma linha que tem condição favorecida por parte do governo.”

Emissões de títulos do Tesouro vinculados a investimentos da chamada economia verde
“O Ecoinvest é uma linha que que olha para um problema histórico. O investidor quer trazer o dinheiro para o Brasil, mas fala: ‘Poxa, eu posso até ter uma boa rentabilidade, mas a variação cambial pode me tirar essa rentabilidade’. Então, a gente quer garantir que ele venha e que a rentabilidade não seja toda corroída pela variação cambial. Isso é diferente da emissão do título soberano. O governo emite um título soberano com o compromisso de usar o recurso para fazer políticas social-ambientais. Eletrificação de frota, proteção das nossas florestas, recuperação de pastagem e uma série de outros temas. Foi feita uma primeira emissão e a gente conseguiu um volume maior do que esperávamos (mais de US$ 2 bi). Foi um teste para ver como o mercado reagiria. Gostaríamos de ter feito outros. Mas o final do ano foi muito volátil. Estamos avaliando a melhor janela de oportunidade para fazer nova emissão.”

Ata do Copom e alta de juros
“Não gosto e não posso comentar muito as atas e as decisões do banco central. Só um comentário breve: é comum no Banco Central do Brasil, e em todos os outros, que a avaliação para o futuro fique dependente de informação. Porque é, inclusive, importante que se faça uma avaliação dos índices, para tomar a melhor decisão.”

Contingenciamento de gastos e situação fiscal
O contingenciamento ainda não está definido. Nosso compromisso com as contas públicas é desde sempre. Não há novidade do ponto vista da estratégia de fazer uma recomposição fiscal. A gente tem um bom padrão entre receitas e despesas, especialmente nos governos Lula. Essa curva se inverte em 2014. O que aconteceu de 2014 até 2022 foi uma manutenção do nível de despesa em relação ao PIB e instituiu-se um teto que foi furado. No fundo, não se conteve, de fato, a despesa e a receita caiu muito. No orçamento que a gente recebeu do governo Bolsonaro, tinha um gap de no mínimo 2% do PIB entre receita e despesa. Estamos, desde o começo, com muita dificuldade, equilibrando as contas. No fim do ano passado, conseguimos fechar esse gap. Isso está garantido? Claro que não. Precisa ser mantido. A gente precisa fazer um recorte de 2013 e 2014, até 2022 e aprender com essa década porque ela não foi boa para o Brasil. Houve instabilidade fiscal, baixíssimo crescimento econômico, sem geração de emprego. Sem falar na queda de produtividade. Em 2023, crescemos 3,2%, 2024, 3,4%. Este ano vamos crescer mais de 2%. A geração de emprego está na máxima histórica, a renda das famílias também. A desigualdade está no menor patamar. A gente precisa ter compromisso e gradualismo nesse processo. Não existe bala de prata, cavalo de pau. Temos que continuar nessa sequência, crescendo entre 2% e 3% todo ano, com estabilidade institucional.”

2025 não será um ano mais difícil
“Vai ser a mesma coisa, graças ao arcabouço fiscal, que permite atualizar o orçamento a 2,5%. Esse ano vamos crescer próximo de 3%, estamos arrecadando mais. Por isso, estamos fazendo a recomposição da receita. Sem asfixiar ninguém, sem asfixiar a emenda parlamentar, sem asfixiar investimento, sem asfixiar a política social. Isso é uma necessidade do país, são as forças políticas do país e a sociedade brasileira que têm exigido isso tudo.”

Críticas à política fiscal
“A política fiscal é criticada por um pouco de falta de entendimento, por um pouco de ansiedade. Se me perguntarem: ‘Você gostaria que o fiscal tivesse uma melhor?’ Eu gostaria. Sim, é natural. No ano passado, o governo teve que ir ao Supremo Tribunal Federal questionar um benefício fiscal concedido pelo Congresso que o presidente Lula vetou, o Congresso derrubou e não tinha lastro de receita. Então, não somos contrários ao Congresso, a gente precisa colocar as coisas de pé. Fizemos um ano de disputa no Supremo Tribunal Federal. E isso traz desgaste. Tivemos a PEC da transição, que aumentou o gasto do poder público para retomar algumas políticas sociais importantes, inclusive compromisso dos dois candidatos a presidente 2022. Eu gostaria de organizar o fiscal mais rápido. Mas estamos fazendo na medida em que o país consegue. Não dá para fazer mais rápido do que isso. O ano passado mandamos um projeto de revisão de gasto. Muita gente disse: ‘O Congresso vai apertar mais’. Não foi o que a gente viu. A gente aprovou o grosso do que propôs, mas o que teve de redução no Congresso veio de vários partidos políticos.”

Ressarcimento aos aposentados do INSS lesados por fraudes
“Primeiro, é grave a situação. Acho que tem que ser apurada com rigor. Dois, a responsabilidade primária é das entidades, porque do ponto de vista do Tesouro Nacional, o recurso foi disponibilizado para o pagamento do INSS. De toda forma, vou reconhecer. O aposentado, o beneficiário, não pode ser lesado. O que a gente precisa é saber exatamente quantos foram. A investigação tem um caráter amostral. Para propor ressarcimento, qualquer tipo de indenização, eu não posso fazer amostragem. Tenho que abrir o cadastro todo. E quanto isso representa? Eu não sei dizer. Esse é o trabalho que tá acontecendo agora pra gente ver quanto de recurso vai ser possível bloquear na conta dessas entidades, o quanto vai ser possível responsabilizá-las de maneira primária. O presidente Lula não vai admitir também que os aposentados fiquem lesados.”

A trégua da guerra comercial EUA-China e o impacto no PIB mundial e na inflação
“Foi um pouco de pé na realidade dos Estados Unidos e o que fica é que não deve haver um desacoplamento entre China e Estados Unidos. O que a gente está vendo é que tem se trabalhado para que as economias sigam, de certa forma, bem integradas. Eu acho que essa é uma boa notícia para o mundo. Quando você olha para a situação do Brasil, é exatamente o contrário. O Brasil compra mais bens e serviços dos Estados Unidos. A gente é deficitário e estamos sendo punidos por isso. Na própria lógica norte-americana, isso não faz sentido. Quando a gente diz isso, eles respondem: ‘Vocês têm um ponto, vamos conversar quando a gente abrir a mesa’. Acho que ainda não chegou o momento de falar em termos de negociação dura porque eles estão em negociações com China, Reino Unido, etc. Mas esse primeiro recuo em relação à China mostra um caminho menos turbulento.”

Revisão da projeção de crescimento de 2,3% para 2025
O dado que a gente teve semana passada da indústria, publicado pelo IBGE, foi um dado muito positivo. A gente tem falado em 2,3% de crescimento [para 2025], que é a previsão técnica. Mas eu acho que, ponderando, conversando com os empresários, olhando os números que a gente tem em seguida, acho que pode ser mais que 2,3%. É a Secretaria de Política Ecocômica quem faz a grade. Até onde eu sei, se tiver alguma variação pode ser para mais, não para menos.”