O general Walter Braga Netto, atualmente preso por suspeita de obstrução às investigações que o apontam como um dos articuladores da tentativa de golpe de Estado em 2022, foi o garoto-propaganda de um livro editado pelo Exército sobre a intervenção federal na segurança pública do Rio de Janeiro em 2018.
Encontrado pelo jornalista Jorge Antônio Barros, o livro "Intervenção Federal na Segurança Pública do Estado do Rio de Janeiro em Imagens", editado pela Biblioteca do Exército em 2019, retrata Braga Netto em poses que mais parecem uma campanha eleitoral, mas omite dados cruciais sobre o fracasso da operação que custou R$ 1,2 bilhão aos cofres públicos.
Segundo o Observatório da Intervenção, apontou Jorge Antônio Barros, o período em que Braga Netto comandou a segurança do Rio registrou um recorde de 36,1% de mortes provocadas por agentes do Estado. O ano de 2019 registrou o maior número de mortos por policiais desde 1998: 1.546 vítimas apenas até outubro.
Fotos: Biblioteca do Exército/Sd R.Menezes e Cb Francilaine
Além das estatísticas, foi durante sua gestão que ocorreu o assassinato da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes, a apenas três quilômetros do gabinete do interventor. O então chefe da Polícia Civil, Rivaldo Barbosa, que aparece em foto do livro ao lado de Braga Netto, foi preso este ano acusado de acobertar os mandantes do crime.
A publicação, com 80 páginas e 74 fotografias feitas por militares, ignora dados estatísticos sobre criminalidade e gastos públicos, funcionando como peça promocional. O relatório final do Observatório da Intervenção concluiu que a gestão militar não produziu mudanças significativas na segurança pública do Rio, mantendo um modelo de atuação baseado em confrontos e grandes operações, sem enfrentamento significativo às milícias ou à corrupção policial.
Analisou Jorge Antônio Barros:
“A história da intervenção federal na segurança pública do Rio foi patética. Em 2016, o Estado do Rio de Janeiro passava por uma crise econômica, que incluía até falta de verbas para o pagamento de salários dos servidores públicos. Essa carência de recursos também afetou os investimentos em segurança pública, obrigando o governo estadual a declarar estado de calamidade pública. Contudo, a condição do Rio de Janeiro continuou piorando, houve um aumento significativo do número de assassinatos e de outros crimes, chegando ao nível de policiais militares sofrerem com a violência urbana. Em 2017, o problema se agravou mais, tendo o ano acabado com 134 policiais militares mortos por conta da criminalidade, numa escalada que aparentava continuar em 2018, o ano em que nada menos que nove UPPs foram extintas”.