O Brasil tem observado com atenção e cautela os movimentos dos grandes atores internacionais diante do tarifaço de Donald Trump. A aposta principal é a de que o comércio mundial sofrerá profundas transformações até chegar o momento em que os os Estados Unidos se sentarão à mesa com os demais países para negociar e conversar. Para o Itamaraty, é um processo que deve ser conduzido a fogo lento.

Enquanto espera movimentos a médio prazo, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva fala em levar a discussão para a OMC (Organização Mundial do Comércio), mas a diplomacia tem plena consciência de que o órgão está enfraquecido para dar respostas a um desafio dessa magnitude. O recurso será mais um gesto político do que propriamente uma tentativa de reverter, de fato, qualquer decisão de Trump, dizem membros do próprio governo.

O Brasil, que teve o aço e o alumínio sobretaxado em 10% pelos Estados Unidos, se baseará no chamado princípio da "Nação Mais Favorecida", que resguarda a isonomia nas vantagens oferecidas pelos países no comércio internacional - na prática, o dispositivo prevê igualdade de tratamento entre os membros da organização e proíbe medidas discriminatórias. Assim, teoricamente, a OMC poderia anular as sobretaxas aplicadas pelos Estados Unidos.

Na prática, porém, é algo com poucas chances de acontecer. O esvaziamento da OMC, especialmente pelo próprio governo americano, vem de longe. Ainda no governo de Barack Obama, a organização já era alvo de críticas. Foi, porém, no primeiro mandato de Trump que houve uma ação mais sistemática para inviabilizá-la. O republicano simplesmente parou de indicar juízes para a instância da organização que tem por atribuição julgar apelações de países que discordam de decisões tomadas em disputas comerciais. Sob o democrata Joe Biden, a política de neutralização da OMC como um organismo com força para arbitrar controvérsias entre país se manteve.

O colegiado encarregado de julgar as apelações é composto por sete juízes, nomeados a partir de um consenso entre os países membros. Para funcionar, ele precisa de ao menos três integrantes, mas desde 2019 esse número mínimo não é atingido.

Outras instâncias
No governo brasileiro, as possíveis medidas para reagir ao tarifaço de Trump vêm sendo discutidas principalmente pelo Itamaraty e pelo vice-presidente e ministro de Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Geraldo Alckmin, que por sua vez tem falado regularmente com os ministros da Fazenda, Fernando Haddad, e da Casa Civil, Rui Costa. O presidente Lula acompanha. Nas últimas semanas, coube a ele dizer que o Brasil irá recorrer à OMC. Lula também disse que, se for preciso, falará pessoalmente com Trump.

Em paralelo, o governo brasileiro pretende discutir o tema com outros países e com organismos multilaterais. Nesta semana, em Honduras, na cúpula da Comunidade de Estados Latino-americanos e Caribenhos (Celac), Lula fará um discurso defendendo a necessidade unir líderes da América Latina diante da posição ameaçadora de Trump sobre a região, tanto no que diz respeito ao tarifaço quanto em relação às deportações de imigrantes, segundo membros do governo. Outro encontro no qual o governo prevê que o tarifaço será assunto central é a reunião do G20, na África do Sul, em novembro.