A diplomacia brasileira tem evitado fazer qualquer tipo de previsão sobre os impactos que a escalada dos conflitos no Oriente Médio terá na reunião de Cúpula do Brics (grupo liderado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), marcada para acontecer no Rio de Janeiro nos dias 6 e 7 de julho. O principal motivo é que se trata de um cenário tão instável que qualquer previsão pode se tornar obsoleta em questão de horas. Duas semanas, então, significam uma eternidade.

Anfitrião do encontro, o Brasil preside o Brics desde janeiro deste ano. Para o governo, está claro que qualquer posicionamento em relação ao conflito terá repercussão no encontro. Cada passo, tanto de Lula quanto do governo, tem sido pensado considerando esse fator. O Irã faz parte do Brics desde 2024. Entrou no processo de expansão do grupo, junto com a Arábia Saudita, Egito, Emirados Árabes Unidos, Etiópia e Indonésia.

O atual presidente iraniano, Masoud Pezashkian, que anunciou o fim da guerra nesta terça-feira, 24, ainda não confirmou se participa do encontro de cúpula. Dos convidados, está certa a ausência do presidente russo, Vladimir Putin: contra ele, existe um mandado de prisão emitido pelo Tribunal Penal Internacional (TPI) por fatos relacionados à guerra contra a Ucrânia. O Itamaraty aguardará comunicados sobre participação de líderes dos países do Brics na reunião até a última hora.

Três dias de silêncio
Nos primeiros três dias seguintes aos ataques dos Estados Unidos ao Irã no último fim de semana, Lula não fez declarações sobre o assunto. O silêncio do presidente, sempre falante sobre política externa, facilitou o trabalho da diplomacia. Mas nunca se sabe quando ele resolve falar de improviso, o que pode atropelar qualquer planejamento dos organizadores da reunião.

O governo se manifestou em nota oficial divulgada no domingo, 22, pelo Itamaraty. Em termos expressos na Carta das Nações Unidas e nas normas da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), o comunicado condenou os ataques às instalações nucleares.

A nota lembrou a posição do Brasil em favor do uso exclusivo da energia nuclear para fins pacíficos e contra “qualquer forma” de proliferação nuclear. “Especialmente em regiões marcadas por instabilidade geopolítica, como o Oriente Médio”, disse o texto.

A tentativa de acordo
No primeiro mandato no Planalto, Lula e o presidente da Turquia, Recep Erdogan, mediaram um acordo com o Irã, na época presidido por Mahmoud Ahmadinejad. O entendimento previa o envio de urânio iraniano para ser enriquecido no exterior. Na época, a mediação do Brasil e da Turquia foi feita a pedido dos EUA. Quando o acordo se encaminhava para ser fechado, os Estados Unidos recuaram e não endossaram o acerto.

O desgaste interno de Lula se consolidou e é resgatado hoje pela oposição, que usa a foto do petista ao lado dos dois outros líderes do Oriente Médio, para disseminar a ideia de flerte com ditadores.

Um diplomata ouvido pelo PlatôBR disse, sob reserva, que o acordo não firmado com o Irã representava uma trava em relação ao desenvolvimento de armas nucleares pelo país. “Deixava claro que era para fins pacíficos”, disse. “Só que tem um problema. A mesma estrutura que se cria para o enriquecimento de urânio para fins pacíficos torna o país capaz de também fabricar a bomba”, ressalvou.

Nota do Brics
Na noite desta terça-feira, o Brics divulgou um comunicado sobre a guerra no Oriente Médio. O texto afirma que os ataques militares contra o Irã desde o dia 13 de junho de 2025 “constituem violação do direito internacional e da Carta das Nações Unidas”. A nota afirma, ainda, que o aumento das tensões torna “imprevisíveis” as consequências “para a paz e a segurança internacionais, bem como para a economia global.