Presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) desde junho deste ano, a ministra Cármen Lúcia é a comandante-em-chefe das eleições deste ano, que têm ainda um capítulo a ser escrito com a realização do segundo turno em 51 cidades.
Tudo vem dando certo. Conhecida no meio jurídico por seu estilo tão discreto quanto minucioso, tão logo assumiu o posto Cármen suscitou temores em diferentes chefes partidários, que viam a possibilidade de ela, como “xerife” das eleições, ser ainda mais rigorosa que seu antecessor, o temido Alexandre de Moraes.
A preocupação, porém, se mostrou infundada – ao menos até agora. A ministra vem conduzindo o processo eleitoral de forma suave, sem tribulações. Muito disso se deve ao seu modo “mineiro” de trabalhar.
Cármen não costuma tomar decisões de afogadilho e gosta de ter controle de tudo o que depende do poder de sua caneta. Por exemplo, mantém consigo decisões que, normalmente, outros ministros delegam para assessores.
Essa lógica vale para tudo, das grandes decisões até as mais comezinhas. Na montagem da equipe que a auxilia no TSE, ela fez questão de dar a palavra final até mesmo na escolha de quem ocuparia cargos que não são tão estratégicos. Essa “concentração” muitas vezes gera críticas por levar a uma suposta lentidão no andamento da máquina.
Em eleições municipais como a deste ano, cabe ao TSE baixar as diretrizes gerais, decidir sobre controvérsias jurídicas que chegam à corte em grau de recurso, prover a infraestrutura física e tecnológica do processo, incluindo as urnas eletrônicas, e, ainda, e organizar nacionalmente os dados da apuração feita nos estados pelos tribunais regionais.
Teoricamente, o papel de um presidente do TSE é menos marcante nas disputas municipais do que nas eleições gerais, quando o país elege presidente, governadores, senadores e deputados.
Isso não significa, porém, que o pleito neste ano não tenha marcas pessoais de Cármen. Na sessão do último dia 17 de setembro, o plenário do TSE aprovou por unanimidade uma resolução de autoria dela que proibiu apostas, inclusive online, relacionadas à disputa eleitoral.
O objetivo da ministra foi barrar o oferecimento de “vantagens financeiras ou materiais de qualquer natureza às eleitoras e aos eleitores, com potencial para interferir no processo eleitoral, especialmente para propaganda ou aliciamento de eleitores”.
Apesar de a regulamentação da eleição ter sido aprovada na gestão de Alexandre de Moraes, Cármen foi a relatora do texto aprovado pelo plenário. A resolução já tinha inovações importantes, como a restrição ao uso de inteligência artificial de maneiras que possam induzir o eleitor a erro e o veto à transmissão ou retransmissão de lives de políticos por empresas.
Esta é a segunda vez que a ministra, que ocupa uma das onze cadeiras do Supremo Tribunal Federal desde 2006, preside o TSE. Na oportunidade anterior, em 2012, ela dirigiu a corte também numa época de disputa municipal. Seu mandato, de novo, será encerrado antes da eleição presidencial – o presidente da corte em 2026 deverá ser Kássio Nunes Marques.
Cármen destoa de Alexandre de Moraes em vários aspectos. A começar pela trajetória. Antes de chegar ao Supremo, Moraes foi promotor de Justiça e ocupou diversos cargos no Poder Executivo, na prefeitura de São Paulo e no governo do estado, e chegou a ser ministro da Justiça do então presidente Michel Temer (MDB), que o indicou para o STF em 2017.
A experiência como promotor e como ocupante de cargos políticos, especialmente na área de segurança pública, é presente na maneira como ele atua como juiz: ora tomando decisões que levam os adversários a compará-lo a um delegado de polícia, ora agindo politicamente nos bastidores para articular votos e construir consensos.
Cármen Lúcia, ex-procuradora do estado em Minas, sempre manteve um estilo mais reservado, pouco afeito a articulações políticas dentro dos tribunais, seja no STF ou no TSE.
Se por um lado essa diferença faz com que as decisões sejam menos barulhentas e midiáticas, por outro ela torna as posições da ministra bem menos previsíveis tanto para os advogados quanto para os políticos.
Além de Cármen Lúcia, fazem parte da atual composição do TSE o próprio Nunes Marques, atual vice-presidente, André Mendonça, Raul Araújo, Maria Isabel Galotti, Floriano de Azevedo Marques e André Ramos Tavares.
Nunes Marques e Mendonça, como se sabe, são colegas de Cármen no Supremo – os dois foram nomeados pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Araújo e Galotti integram o Superior Tribunal de Justiça. Já Marques e Tavares ocupam as cadeiras destinadas à advocacia.