A defesa pública de Jair Bolsonaro feita pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, provocou forte reação do governo brasileiro nesta segunda-feira, 7. Em postagem na rede Truth Social, Trump disse que o Brasil está fazendo uma “coisa terrível” com o ex-presidente brasileiro, classificou os processos judiciais contra ele como “caça às bruxas” e escreveu: “Deixem Bolsonaro em paz!”.
O presidente americano também afirmou que Bolsonaro é “um homem forte, muito popular e respeitado”, e que não é culpado de nada, “exceto de lutar pelo povo do Brasil e amar seu país”. Ele comparou a situação de Bolsonaro à sua própria, dizendo que ambos são vítimas de perseguição por adversários políticos.
A fala de Trump reforça a estratégia de Bolsonaro de se apresentar como alvo de perseguição institucional. O gesto foi rapidamente celebrado por bolsonaristas e interpretado como um sinal de apoio internacional. Para o Planalto, no entanto, o recado tem implicações mais profundas — tanto diplomáticas quanto políticas.
Consequências diplomáticas
Para o cientista político Sérgio Praça, a interferência direta do presidente americano em um processo judicial brasileiro é considerada incomum e sensível do ponto de vista diplomático. “A declaração de Trump em defesa de Bolsonaro é uma interferência incomum no debate político brasileiro. Esse gesto reforça a narrativa bolsonarista de perseguição e permite a internacionalização de uma crise política que é doméstica”, afirma. “Entrar nesse debate é ruim para o governo”, acrescenta o estudioso.
Praça também avalia que Trump se utiliza de Bolsonaro dentro de sua estratégia global de alinhamento com líderes populistas de direita: “Ele reforça sua imagem de vítima do establishment e defensor dos ‘verdadeiros cidadãos’, que estariam espalhados pelo mundo, e não apenas nos Estados Unidos.”
Na opinião de Praça, portanto, a iniciativa do presidente americano não é apenas uma demonstração de afeto político, mas parte de uma engrenagem internacional de cooperação entre figuras da nova direita global, o que coloca o governo Lula diante de um impasse: se reage de forma dura, pode ser acusado de alimentar a polêmica; se silencia, corre o risco de ver o gesto sendo normalizado como ingerência aceitável.
Para o cientista político Daniel de Mendonça, professor da UFPel (Universidade Federal de Pelotas), a declaração de Trump segue o padrão de um governo que se estrutura a partir de posicionamentos públicos nas redes sociais. Segundo ele, o americano “faz uma defesa do populismo de extrema-direita e de lideranças vinculadas a esta corrente ideológica” e desrespeita “um princípio básico” de qualquer democracia liberal: a separação e a independência entre os poderes.
“Quando Trump afirma que Bolsonaro não cometeu nenhum crime e deve ser julgado exclusivamente pelas urnas, ele ignora o fato de que o ex-presidente está sendo julgado com garantia de contraditório e ampla defesa. Trump sabe disso, mas pouco importa”, disse o professor. Para Mendonça, o gesto do norte-americano serve menos a uma relação bilateral e mais à manutenção de um estilo de governo baseado na criação permanente de antagonismos.
Repercussão
A declaração gerou uma onda de reações entre autoridades brasileiras. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva usou as redes sociais para reforçar a posição institucional do Brasil. Sem citar Trump diretamente, publicou:
“A defesa da democracia no Brasil é um tema que compete aos brasileiros. Somos um país soberano. Não aceitamos interferência ou tutela de quem quer que seja. Possuímos instituições sólidas e independentes. Ninguém está acima da lei. Sobretudo, os que atentam contra a liberdade e o estado de direito.”
Mais cedo, a ministra de Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, já havia respondido de forma mais direta: “Donald Trump está muito equivocado se pensa que pode interferir no processo judicial brasileiro”, escreveu. Ela disse ainda que “o tempo em que o Brasil foi subserviente aos EUA foi o tempo de Bolsonaro” e que o presidente americano deveria “cuidar de seus próprios problemas”.
O deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), licenciado do mandato e atualmente nos Estados Unidos, compartilhou a postagem de Trump e escreveu: “O mundo sabe o que está acontecendo no Brasil”. Eduardo tem participado de eventos da direita internacional e reativado laços com lideranças do Partido Republicano, reforçando a estratégia de aproximação com a Casa Branca e o uso da imagem de Trump como avalista político do bolsonarismo.