É o retorno do líder autoritário?
O estilo de liderança se vê numa encruzilhada. Nos últimos anos, o discurso dos gestores girou em torno de valores como empatia, respeito e colaboração. Inspirados em teóricos como Peter Drucker e em pesquisadoras como Brené Brown, líderes passaram a se expor, a acolher o outro, a valorizar a construção coletiva e a comunicação autêntica.
No entanto, observamos emergir, com Donald Trump e Elon Musk, uma espécie de “contracorrente” na forma de liderar, pautada em comando e controle, decisões unilaterais e pouca ênfase à construção de um diálogo empático. Qual modelo de liderança vai impulsionar o futuro?
Até então, esse modelo se espelhava numa figura corajosa, aberta ao diálogo, disposta a co-construir soluções e a compartilhar vulnerabilidades. Agora essas ideias se chocam com o comportamento daqueles que optam por centralizar decisões e exercer um poder quase absoluto sobre a equipe e sobre as estratégias do negócio.
Essa dicotomia se evidenciou ainda mais desde que Trump assumiu a presidência dos Estados Unidos. De um lado, tínhamos a voz forte da academia e de gurus da gestão apontando para a necessidade de líderes empáticos, facilitadores, incentivadores de processos criativos e colaborativos.
De outro lado, na vida real, os holofotes recaíram sobre um estilo “top-down”, que rompe com o paradigma anterior ao enfatizar “eu decido, vocês cumprem”.
A trajetória de Elon Musk em empresas como Tesla, SpaceX e, mais recentemente, X (ex-Twitter) reforça essa percepção: Musk frequentemente age de forma unilateral, conduzindo mudanças abruptas, muitas vezes com pouca transparência ou sem acolhimento de opiniões.
Especialistas apontam que, em mercados altamente competitivos e velozes, a tomada de decisões centralizadas pode agilizar processos. Por outro lado, ressaltam que inovações de ruptura também podem — e talvez devam — envolver coletividade e colaboração, pois são processos que exigem diversidade criativa para uma melhor qualidade na definição de estratégias.
Ou seja, a cultura de comando-controle pode, no curto prazo, acelerar resoluções e manter a empresa coesa em direção a um objetivo específico definido pelo líder. No longo prazo, entretanto, pode inibir a inovação e a co-criação, pois os colaboradores tendem a se sentir desmotivados a propor soluções ou contestar as diretrizes do gestor.
O fato é que a autenticidade é uma das grandes demandantes para este século de revoluções tecnológicas e sociais. Comunicar-se de forma autêntica não significa apenas falar “sem filtros”, mas também buscar uma congruência entre discurso e ação, demonstrando transparência, coerência e abertura ao diálogo.
No estilo de liderança de Trump e Musk, a comunicação se caracteriza mais pela assertividade e pelo tom diretivo, o que pode trazer resultados pontuais, mas raramente consolida relacionamentos duradouros pautados pela confiança mútua.
Sabemos que o mundo do trabalho exige cada vez mais adaptabilidade e resiliência, condições que se tornam mais factíveis quando há espaço para múltiplas vozes e construção conjunta. Modelos como o do design thinking partem do pressuposto de que, para desenhar soluções efetivas, é preciso unir pessoas com diferentes pontos de vista em torno de desafios complexos.
A liderança não empática, unilateral, ignora o potencial que surge de uma equipe diversa e pode perder insights valiosos para a inovação contínua.
A volta de um perfil de liderança mais top-down, reforçada pela figura de Donald Trump e ecoada por Elon Musk, gera debates intensos na comunidade corporativa e acadêmica. Afinal, tudo o que vínhamos aprendendo — abertura ao diálogo e colaboração — entraria em choque com esse “revival” do comando e controle?
O cenário que se desenha indica que o futuro da liderança não elimina, mas sim integra: velocidade de decisão e colaboração; autoridade e empatia; exposição de vulnerabilidades e firmeza de propósitos.
O mundo hiperconectado em que vivemos exige, mais do que nunca, líderes dispostos a agir com consistência, a inspirar confiança e a fomentar a inovação coletiva. Entre extremos, há um vasto campo de possibilidades para aqueles que souberem, de maneira genuína, encarnar a coragem de assumir riscos, sem deixar de ouvir e construir em conjunto com suas equipes. É nesse espaço de equilíbrio, mesmo que dinâmico e imperfeito, que a real evolução da liderança — e das organizações — deve florescer.
Patrícia Marins é gestora de crises de alto risco reputacional , sócia-fundadora da Oficina Consultoria e do WOB - Women on Board, Conselheira do MeToo Brasil e coautora do livro “Muito além do Media training – O porta- voz na era da hiperconexão”
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