Expoente da bancada ruralista na Câmara, o deputado emedebista Alceu Moreira (RS) tem defendido uma estratégia mais pragmática na relação do Brasil com os Estados Unidos. Hoje, ele preside a Fundação Ulysses Guimarães, entidade que cuida de formulações teóricas para o MDB.
Em conversa com o PlatôBR, Moreira defendeu um tratamento menos ideológico para as pressões do presidente Donald Trump sobre o Brasil, inclusive nas crises que ainda estão por vir – como a promessa dos americanos de aplicar sanções a países que negociam com a Rússia.
A possibilidade de o Congresso americano aprovar uma lei para isolar Vladmir Putin do comércio internacional foi mencionada nas reuniões com os senadores brasileiros que estiveram em Washington nesta semana para tratar do tarifaço. Desde então, esse assunto é apontado por políticos brasileiros como a próxima crise entre Brasil e Estados Unidos.
Moreira minimiza o impacto de uma medida dessa natureza sobre os setores agrícola e de combustíveis, com os quais tem relações estreitas. O deputado reclama do que chama de “bravatas” do governo brasileiro na relação com Trump. “Não importa se as pessoas admiram ou não as atitudes do Trump. Eles têm um tamanho e um nível de relacionamento comercial político com o restante do mundo que pode transformar o Brasil num país absolutamente isolado. Esse é o grande risco”, ponderou.
A seguir, os principais trechos da entrevista.
Como o senhor vê a possibilidade de pressão por parte dos Estados Unidos para que países parem de se relacionar comercialmente com a Rússia? Senadores brasileiros que foram aos Estados Unidos tratar do tarifaço foram alertados sobre esse risco. Como isso afetaria a atividade industrial e o agronegócio no Brasil?
O impacto em relação à não importação de petróleo russo e ingredientes que usamos para o agro são relativamente pequenos porque eles são substituíveis. Existem outros lugares do mundo que podem fornecer os ingredientes, como o Canadá, por exemplo. Há outros lugares no mundo que podem fornecer o petróleo que nós precisamos. Além disso, nós temos condição de num período bastante curto de aumentar as misturas de combustível que nós temos hoje, tanto gás natural como etanol e biodiesel, e reduzir enormemente o impacto na economia brasileira, inclusive com estímulo ao consumo de biodiesel. Então, eu diria que, desse ponto de vista econômico, o impacto não é tão grande.
Qual é o grande temor, em sua opinião?
O maior problema é essa guerra que se declara, principalmente na questão geopolítica com os Estados Unidos. Nós não temos como vencer. Não importa se as pessoas admiram ou não as atitudes do Trump. Eles têm um tamanho e um nível de relacionamento comercial político com o restante do mundo que pode transformar o Brasil numa num país absolutamente isolado. Esse é o grande risco.
O que o senhor achou do comportamento do governo brasileiro e do presidente Lula nas tentativas de negociação?
Cada vez que se vê as declarações de autoridades brasileiras fazendo bravata em relação à questão do relacionamento com os Estados Unidos, falando muito mais para o eleitorado brasileiro, esse é um gesto de absoluta irresponsabilidade, que não poderia estar sendo feito. Tem que saber fazer com absoluto pragmatismo.
Quando Trump tocou na questão envolvendo o ex-presidente Jair Bolsonaro, ele trouxe a ideologia como motivador da decisão, não?
Na verdade, o que Trump está fazendo é se utilizar desse assunto para interesses da economia americana. Se a taxação tivesse acontecido só com o Brasil, nós poderíamos dizer. Mas ele está fazendo isso com todos os países do mundo. Ele negociou agora com 25 países que não têm o Bolsonaro. Trump está se utilizando de uma variável comercial de repatriamento do patrimônio industrial americano. Ele precisa acomodar essa forma de trazer de volta o parque industrial para os Estados Unidos com preços compatíveis de produção mundial. Do ponto de vista comercial, é isso.
Como lidar agora com as tarifas impostas?
Na publicação (do tarifaço) tem uma série de exceções. Todas interessam à sociedade americana. Isso amenizou o impacto sobre o Brasil. Se nós tivéssemos descontaminado a questão política, certamente teríamos condição de fazer uma negociação com os Estados Unidos. Se continuarmos esticando a corda, como estão querendo, como o governo brasileiro continua fazendo com bravatas na questão política, provavelmente teremos sanções muito mais graves. Aí pagaremos com um prejuízo gigantesco na economia brasileira apenas por um discurso ideológico ultrapassado, enviesado e sem pragmatismo.