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Em BH, eleição tem protagonistas que não estão nas urnas

Disputa entre Fuad Noman e Bruno Engler é marcada pelos movimentos de Nikolas Ferreira e Alexandre Kalil e pela discrição de Romeu Zema

Foto: Amira Hissa/PBH e Lucas Mendes / Divulgação
Foto: Amira Hissa/PBH e Lucas Mendes / Divulgação

Um senhor de bigode e suspensórios decide colocar a sua popularidade à prova pela primeira vez. Pouco antes, ele precisa enfrentar a deserção de um importante aliado e, ainda, uma doença. Esse personagem não está nos romances “O amargo e o doce” e “Cobiça”, escritos por Fuad Noman, mas na vida real. E o personagem é o próprio: o prefeito de Belo Horizonte, que tenta a reeleição pelo PSD.

Do outro lado da disputa do segundo turno na capital mineira está um candidato que parece ser a antítese de Noman: Bruno Engler, do PL, tem 27 anos, 50 a menos que o atual prefeito. Deputado estadual mais votado em 2022, ele conta com o apoio entusiasmado do correligionário Nikolas Ferreira, deputado federal conhecido por suas polêmicas nas redes sociais.

Fuad Noman é cabeça de chapa pela primeira vez. Sua única experiência anterior nas urnas se deu como coadjuvante: ele foi vice de Alexandre Kalil na campanha vitoriosa de 2020. Na ocasião, Kalil, ex-presidente do Atlético Mineiro, foi reeleito prefeito da capital mineira. Dois anos depois, deixou o cargo para disputar o governo de Minas, acabou derrotado por Romeu Zema (Novo) e Fuad Noman, então, ficou na cadeira de prefeito.

Apesar da inexperiência eleitoral, Noman não pode ser considerado um novato no ambiente político. Funcionário de carreira do Banco Central, foi secretário-executivo da Casa Civil no governo Fernando Henrique Cardoso e ocupou secretarias nas gestões de Aécio Neves e Antonio Anastasia (todos do PSDB) antes de passar a trabalhar com Kalil.

Nas eleições deste ano, Kalil deixou o antigo aliado. Preferiu apoiar a candidatura do deputado estadual Mauro Tramonte, do Republicanos, apoiado também por Zema.  Kalil e Noman romperam por discordâncias nas trocas no secretariado quando um assumiu a cadeira do outro.

Até o ano passado, Fuad Noman não tinha tinha decidido se disputaria a reeleição ou se contentaria com o papel de prefeito-tampão. Tudo indicava que ele não tinha grandes chances, até porque Kalil o havia abandonado. Até pouco antes do primeiro turno, Tramonte aparecia bem à frente dele nas pesquisas.

O enfraquecimento do prefeito e candidato à reeleição não era só político. Às vésperas da campanha, Fuad Noman descobriu um linfoma e teve de se dividir entre as tarefas de prefeito e o tratamento de saúde. Perdeu quilos e cabelos e diminuiu suas aparições públicas num momento em que um candidato à reeleição deveria estar nas ruas.

As sondagens indicavam que Tramonte travaria a disputa no segundo turno com Bruno Engler, o candidato de Nikolas e Bolsonaro. Foi exatamente a possibilidade de Engler se eleger que fez com que Fuad Noman conseguisse, de última hora, uma ascensão meteórica: ele atraiu o voto útil de eleitores de esquerda, que o viam como alguém com mais possibilidade de ser competitivo para chegar ao segundo turno do que Duda Salabert (PDT) e Rogério Corrêa (PT).

Sem Kalil, o prefeito conseguiu o apoio de personagens de expressão nacional de seu partido, como o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, e o ministro Alexandre Silveira, o que também pesou em seu favor.  Tramonte, antes favorito, ficou pelo caminho.

A história de Engler é típica dos personagens mais destacados do bolsonarismo. Ele entrou para a vida pública com um forte discurso contra a política tradicional e especial dedicação a ataques aos governos Lula e Dilma e críticas às minorias. A plataforma do candidato do PL se desenvolve a partir do movimento Endireita Minas, que apoiou Jair Bolsonaro.

Engler dividiu alegremente os holofotes de sua campanha com Nikolas Ferreira. Forte no meio evangélico, o deputado federal é visto como alguém capaz de atrair mais os eleitores no estado do que o próprio Bolsonaro.

Nikolas levou Engler a fazer uma campanha muito próxima das igrejas evangélicas, que já se alinhavam a seu discurso conservador. O resultado foi a primeira colocação no primeiro turno, com 34,38% de votos válidos, contra 26,54% de Fuad Noman. Se no primeiro turno foi o voto útil que catapultou o candidato do PSD, agora o cenário de polarização ficou escancarado: Noman foi, definitivamente, abraçado pela esquerda, muito embora procure se apresentar como um político mais ao centro.

As eleições em Belo Horizonte têm vários protagonistas cujos nomes não estão nas urnas. Para além de Nikolas Ferreira e Alexandre Kalil, há, ainda, o próprio governador Romeu Zema. Só que, no caso, dele, foi a discrição que falou mais alto.

Apesar de ter declarado apoio a Mauro Tramonte, Zema priorizou sua participação em campanhas no interior e até mesmo em cidades de outros estados, como Rio e São Paulo. “O silêncio do governador em relação à capital do estado foi uma das situações mais inusitadas da campanha deste ano”, diz o cientista político Manoel Leonardo Wanderley Duarte Santos, professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Nesta quinta, 17, Romeu Zema anunciou que apoiará Bruno Engler.

A esquerda, por sua vez, ficou pelo caminho porque, de novo, se dividiu. E também porque, no ciclo pré-eleitoral, decidiu embarcar na administração de Kalil, perdendo protagonismo na cena política local. “O PSB e o PT tinham força na cidade, mas acabaram aderindo ao projeto pessoal do Kalil, que lhes entregou secretarias, e perderam força política”, diz a professora de Ciência Política da UFMG Helcimara Telles. Antes da ascensão de Alexandre Kalil, os dois partidos haviam vencido as quatro eleições municipais.

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