A reclamação é generalizada entre parlamentares dos partidos que fazem parte do Centrão no Congresso: o presidente Luiz Inácio Lula da Silva está demorando demais para fazer a reforma ministerial. Desde o ano passado, o petista fala da intenção de ampliar a presença na Esplanada de partidos como o PSD de Gilberto Kassab e o PP de Arthur Lira (AL). Esse movimento também incluiria reacomodações que contemplem o MDB, o União Brasil e o Republicanos. A primeira mudança da reforma só ocorreu na terça-feira, 25, com o desastrado anúncio da saída da ministra da Saúde, Nísia Trindade, que amargou o desgaste de, de manhã, entregar uma importante iniciativa de parceria para a produção de vacinas 100% nacionais e, à tarde, ser comunicada da demissão.
Enquanto Lula não decide sobre as demais mexidas, as bancadas começam a fazer planos alternativos para 2025, mas sem tirar os olhos dos cargos negociados na reforma. Na terça, em um jantar na casa do secretário executivo do MDB, Reinaldo Takarabe, a bancada da sigla discutiu o destino de seu líder, Isnaldo Bulhões (AL). A ideia dos emedebistas é costurar com o União Brasil um acordo sobre a CMO (Comissão Mista do Orçamento), cobiçada por definir a destinação de emendas parlamentares. A legenda quer o apoio do presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), e do presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), para que Bulhões seja relator ou presidente da CMO neste ano e em 2026, troque de posição com o União Brasil.
Isnaldo tem a simpatia de Motta para se tornar, na reforma, o ministro da articulação de Lula, substituindo Alexandre Padilha na Secretaria de Relações Institucionais (SRI). Essa composição poderá ocorrer se Lula levar à frente a ideia de ter uma político do Centrão na "cozinha" do Planalto. Mas essa hipótese também é uma incógnita para os parlamentares, pois há a possibilidade de Lula manter a SRI com o PT. Nesse caso, o nome mais cotado é o do atual líder do governo na Câmara, José Guimarães (CE). Se a solução fora essa, o Centrão ficaria com o lugar de Guimarães na liderança, o que é bem menos interessante. "Só se o Isnaldo for louco", disse um emedebista.
Lula também tem demorado a chamar o PSD para conversar. Nesta quarta-feira, 26, o líder do partido na Câmara, Antonio Brito (BA), simpatizante do governo, disse que até agora não houve nenhuma sinalização do presidente de que contemplará a bancada de deputados da legenda. Os deputados do PSD reclamam que a bancada está sub-representada na Esplanada. Há duas semanas, estava programada uma reunião para definir o que reivindicar no governo. O encontro, no entanto, foi cancelado diante da reclamação dos deputados de que não havia o que discutir na ausência de qualquer convite.
O PSD tem três ministros no governo: Carlos Fávaro, na Agricultura, Alexandre Silveira, na pasta de Minas e Energia, e André de Paula, na Pesca. André de Paula é deputado, mas a bancada considera a Pesca uma pasta muito pequena e quer um cargo mais robusto. Lula espera passar o Carnaval para decidir um possível lugar para Rodrigo Pacheco (PSD-MG), ex-presidente do Senado, no governo. Enquanto isso, as conversas não estão ocorrendo com outros interlocutores do partido.
O clima ruim das últimas semanas foi agravado pelos ataques feitos pelo presidente da legenda, Gilberto Kassab (SP), ao governo e ao ministro Fernando Haddad (Fazenda). Kassab é articulador político do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), e mantém encontros com o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), que apesar de inelegível por decisão da Justiça Eleitoral trabalha por uma candidatura de oposição a Lula em 2026. Em outro episódio desgastante, o ministro Fávaro se irritou com boatos de que o governo poderia taxar as exportações do agro e ameaçou deixar a pasta.
Solidão de Lula
No Planalto, auxiliares do presidente reconhecem que a demora é grande, mas dizem que o presidente está solitário nas decisões sobre o assunto. Em princípio, Lula chegou a dar a Alexandre Padilha, que estava na SRI, a função de deslanchar as conversas com as legendas do Centrão, mas depois acabou assumindo essa função pessoalmente. Ministros palacianos dizem que a reforma está somente na cabeça do presidente.
Um antigo auxiliar de Lula tem uma possível explicação para a demora no processo de decisão. Sob reserva, ele diz que, nos dois primeiros mandatos, o presidente costumava se aconselhar com petistas históricos, como Gilberto Carvalho e José Dirceu, que sabiam avaliar as consequências políticas das escolhas. Outros amigos que dividiam impressões nesses momentos eram os juristas Márcio Thomaz Bastos, que foi ministro da Justiça entre 2003 e 2007 e morreu em novembro de 2014, e Sigmaringa Seixas, morto em dezembro de 20218. Hoje, diz essa fonte, Lula estaria mais solitário, sem ter com quem conversar sobre decisões difíceis. Daí a lentidão.